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O desafio das empresas brasileiras com o uso de IA

Empresas que trata a IA como vitrine agora precisam usá-la com propósito: Não para automatizar, mas para pensar melhor. O futuro da gestão jurídica é inteligente, estratégico e profundamente humano.

sexta-feira, 28 de novembro de 2025

Atualizado às 15:00

Por muito tempo, a inovação tecnológica foi tratada como um troféu corporativo. Bastava anunciar a adoção de uma "ferramenta de inteligência artificial" para que empresas, inclusive escritórios de advocacia, se colocassem na vitrine da modernidade. Mas o tempo dos discursos vazios acabou.

Dessa forma, é necessário que gestores deixem de enxergar a tecnologia como um adorno e passem a vê-la como uma extensão da inteligência organizacional. Porém, a mudança de mentalidade é profunda. Não se trata de automatizar por automatizar, mas de compreender como os dados, as previsões e as decisões mediadas por algoritmos podem melhorar a experiência de clientes, reduzir custos e gerar previsibilidade. Em um país como o Brasil, onde a gestão empresarial ainda convive com improviso, processos manuais e resistência cultural à inovação, isso é revolucionário.

E no campo jurídico o desafio é ainda maior. 

Escritórios e departamentos jurídicos historicamente associaram a tecnologia à mecanização de tarefas, sem perceber que a verdadeira potência da IA está na capacidade de ampliar o raciocínio humano.

Nesse sentido, a transformação iniciada pelas IAs jurídicas, marca um ponto de virada. As plataformas passaram da automação operacional para a inteligência estratégica e com isso oferecem um vislumbre do futuro da gestão jurídica brasileira.

O fim da automação cega e o nascimento da inteligência aplicada

Durante a década passada, a automação foi o grande fetiche corporativo. Ferramentas de workflow, planilhas conectadas e chatbots eram apresentados como soluções milagrosas para a produtividade.

Porém, sem integração de dados e sem inteligência analítica, essas ferramentas apenas digitalizaram a desorganização existente. Em vez de resolverem gargalos, criaram novos: dados fragmentados, retrabalho e equipes sobrecarregadas pela gestão das próprias automações.

A verdadeira virada ocorre quando a automação deixa de ser um fim e se torna meio para gerar inteligência. É exatamente o que a nova geração de soluções propõe: sistemas que não apenas executam tarefas, mas aprendem com o próprio uso e devolvem informações estratégicas aos gestores. A automação agora é retroalimentada por IA generativa e preditiva, o que significa que ela observa, compreende e antecipa comportamentos operacionais.

Em linguagem simples, o que antes era um painel de controle virou um cérebro organizacional.

Da inovação estética à inovação funcional

Os dados de mercado mostram que o Brasil vive um momento decisivo. A IDC estima que os investimentos em inteligência artificial na América Latina atinjam US$8,4 bilhões até 2025. 

Já segundo pesquisa do Google Cloud, 48% das empresas brasileiras pretendem expandir o uso de IA ainda este ano. O setor jurídico segue essa tendência, mas com uma peculiaridade: 72% dos escritórios já utilizam algum tipo de automação, porém, de acordo com a AB2L - Associação Brasileira de Lawtechs e Legaltechs, apenas 19% mensuram seus resultados.

Isso revela um abismo entre o uso e o entendimento. Há tecnologia, mas falta propósito. A chamada "inovação estética", ou seja, a que impressiona visualmente, mas não transforma a operação, ainda predomina. É o equivalente digital do velho hábito de trocar o mobiliário do escritório para parecer moderno, sem mudar a cultura de gestão.

A inovação funcional, ao contrário, nasce da clareza de objetivos. A IA deve responder a uma pergunta simples: qual problema concreto ela resolve? Quando aplicada a um processo bem definido, a tecnologia se torna um multiplicador de inteligência.

A IA não veio para substituir o raciocínio jurídico, mas para potencializá-lo. O resultado é mensurável: empresas que aplicam IA de forma estratégica têm três vezes mais ganhos de produtividade, de acordo com estudo da McKinsey publicado em 2025.

A IA como pilar da previsibilidade e eficiência jurídica

A previsibilidade sempre foi o "Santo Graal" da gestão jurídica. Saber quanto tempo um processo levará, quanto custará e qual a probabilidade de sucesso é o sonho de qualquer escritório. Até pouco tempo essas respostas dependiam de experiência e intuição. Hoje podem ser calculadas com base em dados reais.

As automações inteligentes das IAs jurídicas introduzem uma camada preditiva à gestão. Por meio da análise de histórico de produtividade, cruzamento de prazos e acompanhamento de fluxos, as plataformas conseguem antecipar riscos operacionais. Isso não apenas aumenta a eficiência, mas também muda a forma como o gestor toma decisões. A intuição jurídica, longe de ser descartada, é agora acompanhada de um painel de evidências.

Essa sinergia entre o humano e o artificial é o cerne da chamada "inteligência estratégica". A IA não pensa no lugar do advogado, mas amplia seu alcance. Permite que a IA identifique anomalias em tempo real, que o financeiro projete resultados com base em métricas confiáveis e que o atendimento ao cliente se torne mais empático e rápido, sem perder precisão.

O impacto da regulação e o papel da ética empresarial

A consolidação da lei brasileira de inteligência artificial (PL 2.338/23), com aprovação prevista ainda para 2025, é outro fator que exige maturidade das empresas. A legislação propõe diretrizes éticas e de transparência para o uso de IA em todos os setores, incluindo o jurídico. Isso significa que a adoção de IA não é apenas uma questão de eficiência, mas também de responsabilidade.

Modelos de IA generativa, como GPT-4o, Gemini 1.5 e Mistral, que impulsionam muitas das soluções atuais, operam com base em grandes volumes de dados e aprendizado contínuo. O desafio está em garantir que esses sistemas atuem dentro de parâmetros éticos, respeitando privacidade, segurança e imparcialidade. 

Mais do que conformidade, trata-se de construir confiança. A ética, quando incorporada à arquitetura tecnológica, transforma-se em diferencial competitivo. Escritórios e departamentos jurídicos que souberem comunicar aos clientes a transparência e a segurança de seus sistemas de IA terão vantagem no mercado.

O futuro da gestão jurídica: De ferramenta a parceiro cognitivo

O que estamos vendo não é apenas uma mudança de tecnologia, mas uma mudança de paradigma. A automação tradicional era como um braço mecânico, capaz de executar ordens. 

A nova IA é mais próxima de um parceiro cognitivo: interpreta contextos, sugere caminhos e aprende com o próprio uso.

Na prática, isso significa que o gestor jurídico do futuro será um estrategista de dados. Seu papel não será apenas comandar equipes, mas dialogar com sistemas inteligentes para tomar decisões mais assertivas.

Os softwares jurídicos, ao integrar IA generativa ao fluxo de trabalho jurídico, antecipa essa realidade. O advogado que antes gastava horas revisando tarefas repetitivas agora pode dedicar tempo ao raciocínio, à negociação e à inovação jurídica.

Essa transição não elimina a importância do humano, mas a reforça. A IA se encarrega da previsibilidade, enquanto o advogado permanece responsável pelo julgamento ético, pela argumentação e pela criatividade. Em outras palavras, a tecnologia devolve tempo, o recurso mais escasso do profissional contemporâneo.

O Brasil vive um momento em que a inteligência artificial deixou de ser um luxo e se tornou uma necessidade estratégica. Mas o valor da IA não está em seus algoritmos, e sim na clareza de propósito com que é aplicada.

Ao aplicar IA generativa e preditiva de forma integrada à gestão jurídica, a empresa provou que a inovação pragmática é mais poderosa do que o marketing digital. A análise de produtividade em tempo real é apenas o começo de uma revolução silenciosa, revolução que não promete substituir pessoas, mas libertá-las do excesso de tarefas e da falta de visão.

A próxima fronteira não é técnica, mas cultural. As organizações que entenderem que inteligência artificial é, antes de tudo, inteligência organizacional, estarão prontas para o futuro. E esse futuro, ao contrário do que muitos temem, não será dominado por máquinas, mas por humanos que aprenderam a pensar com elas.

Eduardo Koetz

VIP Eduardo Koetz

Eduardo Koetz é advogado, sócio-fundador da Koetz Advocacia e CEO do software jurídico ADVBOX . Especialista em tecnologia e gestão, ele também se destaca como palestrante em eventos jurídicos.

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