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Taxonomia sustentável brasileira: Novos rumos para o combate ao desmatamento?

A TSB orienta investimentos e políticas públicas, combate o greenwashing e fortalece a integração entre economia e preservação ambiental.

segunda-feira, 3 de novembro de 2025

Atualizado em 4 de novembro de 2025 12:26

Grande desafio para o desenvolvimento sustentável está em aliar atividades econômicas a um menor impacto ambiental. Pensando nisso, países têm buscado desenvolver as chamadas taxonomias sustentáveis, sistemas de classificação que buscam trazer definições e critérios quanto ao que são atividades econômicas sustentáveis. Além de orientar investimentos e políticas públicas para o alcance de objetivos ambientais, ditos instrumentos contribuem para o combate ao "greenwashing", prática que visa mascarar atividades poluentes como limpas.

A UE - União Europeia, por exemplo, tem apostado no desenvolvimento de sua taxonomia. Em vigor desde 2020, o sistema permite que instituições com ou sem fins lucrativos partilhem de definições comuns de atividades econômicas que podem ser consideradas ambientalmente sustentáveis. Para tanto, são delimitados seis objetivos: mitigação de mudanças climáticas; adaptação a mudanças climáticas; uso e proteção da água e dos recursos marinhos; transição para uma economia circular; controle e prevenção de poluição; e proteção e restauração de biodiversidade e ecossistemas.

Por sua vez, o Brasil tem se mobilizado desde 2023 para criar sua própria taxonomia. Com aprovação em 2025, a TSB - Taxonomia Sustentável Brasileira traz uma perspectiva voluntária sob objetivos ambientais similares aos da UE. No entanto, a iniciativa brasileira também explicita objetivos econômicos-sociais, sendo eles geração de trabalho decente e elevação da renda; redução de desigualdade socioeconômica, considerando aspectos raciais e de gênero; redução de desigualdades regionais e territoriais do país; e promoção da qualidade de vida.

Em particular, disposição interessante da TSB é a exclusão de qualquer atividade que envolva desmatamento de vegetação nativa, mesmo que legal, do escopo sustentável. A previsão é notória ao se observar uma série de episódios considerados como de afrouxamento da legislação ambiental no Brasil. Por exemplo, a reforma do licenciamento ambiental trouxe simplificações controversas, incluindo hipóteses em que atividades vinculadas ao agronegócio não se sujeitam a ditos procedimentos.

Outro caso relevante foi investigação instaurada pelo Cade - Conselho Administrativo de Defesa Econômica quanto a possível formação de cartel relacionado à Moratória da Soja, acordo privado firmado entre grandes exportadoras que impede a comercialização de soja produzida em área desmatada da Amazônia Legal. Para o Cade, a Moratória da Soja constitui um instrumento anticompetitivo entre concorrentes que prejudica as exportações.

Casos como esses têm reascendido o debate quanto à eficiência de instrumentos nacionais para o combate ao desmatamento, bem como sua capacidade de implementação. Não obstante a importância na agenda brasileira, proteção de florestas também tem recebido destaque no cenário internacional. Exemplo notório é o advento da lei antidesmatamento da UE (EUDR).

A EUDR é uma norma que busca reduzir emissões de gases poluentes e perda de biodiversidade por meio de regras relativas à comercialização de sete commodities no mercado da UE: gado, cacau, café, óleo de palma, borracha, soja e madeira. Embora a EUDR não se aplique diretamente a países de fora da UE, possíveis efeitos extraterritoriais exigem que essas nações cumpram com a norma para que possam introduzir seus produtos no mercado da UE. Por conta disso, alguns países produtores temem sofrer impactos econômicos advindos da aplicação da EUDR.

O Brasil, como grande exportador de commodities relacionadas à expansão do desmatamento como soja e gado, potencialmente será afetado pelas disposições da EUDR. Ademais, a dependência ao escoamento de produtos para o exterior, em particular para o mercado da UE, tem alavancado preocupações entre produtores, exportadores e entidades governamentais. Assim, instrumentos que contribuam para a redução do desmatamento poderão contribuir para uma conformidade perante a norma.

A TSB pode colaborar nesse sentido, atingindo tanto demandas brasileiras como internacionais, tais como a EUDR. Ao fortalecer o arcabouço nacional, o país pode ganhar competitividade num mercado global que enseja maior integração entre atividades econômicas e sustentabilidade. Próximos passos, no entanto, requerem um planejamento adequado que faça a TSB dialogar com outros mecanismos brasileiros, incorpore instituições-alvo e garanta sua aplicação por autoridades públicas de forma, assim, a viabilizar sua implementação.

Paula Wojcikiewicz Almeida

Paula Wojcikiewicz Almeida

Professora e coordenadora do Centro de Pesquisa em Direito Global (CPDG) da FGV Direito Rio.

Gabriel Ralile

Gabriel Ralile

Doutorando em Direito da Regulação na FGV Direito Rio e pesquisador do Centro de Pesquisa em Direito Global (CPDG) da instituição.

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