Os riscos da revogação da lei de alienação parental
A inexistência de uma legislação específica também favorece comportamentos abusivos de um dos responsáveis.
segunda-feira, 15 de dezembro de 2025
Atualizado às 09:29
A revogação da lei de alienação parental representa um grave retrocesso na proteção de crianças e adolescentes. A lei é, na prática, uma norma de garantia da convivência familiar, que organizou em um único dispositivo as ferramentas e procedimentos que o Judiciário pode usar para lidar com conflitos afetivos e episódios de manipulação emocional. Sua ausência fragmenta essa proteção, deixando profissionais e magistrados diante de legislações dispersas e menos específicas.
Um dos pontos de maior preocupação é a dificuldade em distinguir denúncias legítimas de falsas acusações usadas como arma em disputas familiares. Esse desafio sempre existiu e continuará existindo com ou sem lei, mas a lei de alienação parental tem um papel importante porque reconhece e nomeia a possibilidade de ocorrência de falsas denúncias, algo que outras normas não fazem de forma direta. Sem esse respaldo, decisões podem se tornar ainda mais subjetivas, abrindo espaço para narrativas manipuladoras.
A revogação dessa legislação específica também favorece comportamentos abusivos de um dos responsáveis, de pai ou mãe, que podem se sentir mais autorizados a manipular a criança sem temor de enquadramento legal. O Estatuto da Criança e do Adolescente segue vigente, assim como outras normas de proteção, mas elas tratam do tema de forma difusa, menos explícita e menos operacional. A lei de alienação parental organiza conceitos, critérios e instrumentos, facilitando sua utilização pelo Judiciário e tornando mais claras as condutas reprováveis.
Caso aconteça a revogação, o trabalho de psicólogos, assistentes sociais e demais técnicos do sistema de Justiça também tende a ser prejudicado. Sem a lei, esses profissionais terão que recorrer a outras legislações e construir argumentações indiretas para nomear fenômenos amplamente reconhecidos pela prática. Isso pode gerar relatórios menos objetivos, maior insegurança jurídica e mais disputas narrativas no âmbito processual.
A consequência mais dramática recai sobre as crianças, que podem ficar mais expostas a rupturas bruscas de vínculo com um dos genitores. A ausência de uma legislação clara tende a empoderar quem já usa o filho como instrumento de disputa, legitimando práticas que deveriam ser coibidas. Embora existam marcos normativos como o ECA, o fato de tudo estar disperso enfraquece a capacidade de resposta do sistema. Movimentos e discursos que negam a existência da alienação parental podem ganhar força, criando um ambiente no qual manipulações são naturalizadas.
Revogar a lei de alienação parental não resolve problemas de aplicação ou abusos interpretativos, ao contrário, amplia a vulnerabilidade de crianças e gera insegurança no sistema de Justiça. Se há falhas, o caminho deveria ser aperfeiçoar a lei, fortalecer equipes técnicas e qualificar psicólogos, assistentes sociais, juízes e promotores, e não eliminar o único dispositivo que nomeia e organiza esse tipo de violência emocional. Sem ele, quem perderá não serão só os adultos em litígio, mas os filhos que se tornam silenciosas vítimas da disputa.


