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Cobertura deve pagar o dobro por taxas condominiais?

Mesmo usando os mesmos serviços que as demais unidades, moradores de coberturas continuam pagando mais. A cobrança é legal? É justa?

terça-feira, 16 de dezembro de 2025

Atualizado às 10:52

A mesma portaria. O mesmo elevador. A mesma limpeza.

Em muitos condomínios, a rotina é conhecida: portaria 24h, faxina diária, manutenção de elevadores, câmeras, zeladoria. Serviços comuns, compartilhados entre todos os moradores.

Mas o valor pago por cada um... nem sempre é o mesmo.

Coberturas e unidades com maior fração ideal frequentemente pagam até o dobro nas taxas condominiais - mesmo quando usufruem exatamente os mesmos serviços que os demais.

O critério? A chamada fração ideal. Prevista em lei, geralmente definida na convenção. Mas será que, aplicada a todas as despesas, ela continua sendo justa?

A lei fala em fração ideal - Mas com limites

O art. 1.336, I, do CC determina que as despesas condominiais sejam rateadas na proporção da fração ideal, salvo disposição em contrário na convenção.

Aparentemente simples. Mas esse critério tem sido judicialmente questionado quando gera distorções.

Serviços de uso coletivo, como limpeza e segurança, podem ser usados igualmente por todos, independentemente do tamanho do imóvel. Ainda assim, alguns condôminos arcam com valores muito superiores. O critério técnico deixa de ser apenas legal: passa a ser debatido sob a ótica da proporcionalidade, do equilíbrio e da boa-fé objetiva (art. 422 do CC).

A justiça tem decidido de formas diferentes

A controvérsia não é apenas teórica. Já está nos tribunais.

Em Belo Horizonte, a 5ª vara cível decidiu, no processo 5004979-73.2021.8.13.0024, que a aplicação da fração ideal para despesas ordinárias de uso igualitário - como portaria, limpeza, segurança e manutenção de áreas comuns - viola os princípios da boa-fé e da vedação ao enriquecimento sem causa (art. 884 do CC).

Na decisão, determinou-se que essas despesas fossem divididas igualmente entre todas as unidades, independentemente da área privativa. Já os custos ligados à estrutura, consumo e seguro continuaram vinculados à fração ideal.

Por outro lado, o STJ, no REsp 1.778.522/SP, reafirmou que, se houver previsão na convenção, a cobrança proporcional à fração ideal é válida e legal, inclusive para despesas ordinárias.

Duas leituras diferentes da mesma situação. E o mesmo questionamento segue no ar: o que deve prevalecer - a regra da convenção ou a lógica da equidade?

O tema ainda está em aberto

Não há jurisprudência consolidada no STJ que obrigue todos os condomínios a adotar um critério único. Cada caso vem sendo analisado conforme suas particularidades. Há decisões que mantêm o critério da fração ideal, e outras que o afastam para despesas ordinárias.

Ou seja, a discussão segue viva. E sem solução definitiva.

E quando o morador se sente prejudicado?

Diante desse cenário, surgem algumas perguntas inevitáveis:

  • Moradores de coberturas devem continuar pagando mais, mesmo usando os mesmos serviços?
  • A convenção do condomínio tem limite?
  • Existe espaço para contestar judicialmente o critério aplicado?

O que se vê é que a aplicação automática da fração ideal, sem considerar a natureza das despesas, pode gerar conflitos e questionamentos legítimos. Em alguns casos, a Justiça tem reconhecido abusos. Em outros, tem mantido o que foi definido na convenção.

Conclusão

A cobrança de taxas condominiais com base na fração ideal está prevista em lei. Mas sua aplicação indiscriminada - especialmente para serviços de uso igualitário - vem sendo debatida judicialmente.

Enquanto o tema não for pacificado, a recomendação é que condôminos que se sentirem prejudicados busquem orientação jurídica e, se necessário, acionem o Judiciário para revisar os critérios de rateio. O tema segue em aberto. E, diante da diversidade de decisões, uma pergunta permanece: fração ideal deve ser sinônimo de cobrança justa?

Werner Damásio

VIP Werner Damásio

Advogado pós-graduado em Direito Privado, especialista em Direito Civil, Empresarial e Imobiliário. Sócio do Lettieri Damásio Advogados, com 18 anos de atuação nacional.

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