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PL 818/25 e a necessária correção de rumo na logística reversa paulistana

Artigo critica o PL 818/25 por impor obrigações inviáveis ao varejo, defendendo diálogo, responsabilidade compartilhada e respeito às competências legais para uma logística reversa eficaz.

terça-feira, 16 de dezembro de 2025

Atualizado às 10:42

A tramitação do PL 818/25, conhecido como PL Recicla, na Câmara Municipal de São Paulo, tem provocado debates importantes entre especialistas e profissionais ligados à política de resíduos sólidos. A proposta, que pretende ampliar responsabilidades no sistema de logística reversa, apresenta pontos que exigem reflexão cuidadosa, especialmente no que diz respeito a juridicidade, viabilidade prática e coerência com o marco regulatório vigente.

Ao impor novas exigências aos comerciantes, particularmente nos §§ 2º e 3º do art. 2º, o PL cria obrigações duplicadas, desproporcionais e, em muitos casos, impraticáveis. Não se trata de oposição ao avanço ambiental, mas da necessidade de que políticas públicas respeitem competências legais já estabelecidas e considerem a capacidade real de cumprimento, sobretudo por pequenos e médios estabelecimentos.

A legislação municipal já atribui, de forma precisa, a responsabilidade de fabricantes e importadores pela recuperação de embalagens, conforme previsto no decreto 12.688/25. Transferir esse encargo ao varejo contraria princípios como razoabilidade, eficiência administrativa e segurança jurídica.

Outro ponto crítico diz respeito à inexistência de ferramentas públicas para o reporte das informações que o PL pretende exigir. Criar obrigações sem suporte técnico e operacional adequado equivale, na prática, a estabelecer deveres inexequíveis.

Também é preciso considerar aspectos técnicos da política municipal de resíduos. Produtos vendidos a granel ou fracionados frequentemente utilizam materiais de baixa reciclabilidade, como filmes plásticos e isopor. Atribuir ao comércio a responsabilidade pelo destino desses resíduos, cuja própria composição limita as possibilidades de reciclagem, distorce o foco da política pública, que deveria incidir sobre a origem desses materiais.

Além disso, o engajamento do consumidor é elemento indispensável em qualquer sistema de logística reversa. A lei 17.471/20 destaca a importância de ações de educação e conscientização ambiental, reconhecendo que cabe ao cidadão definir o destino dos produtos pós-consumo. Sem participação ativa da população, metas de reciclagem não serão atingidas. A regulamentação vigente prevê que o comércio apoie a divulgação dessas iniciativas, não a operação de sistemas complexos que extrapolam seu papel econômico e social.

A experiência acumulada nos debates sobre resíduos sólidos demonstra que políticas públicas eficazes dependem de equilíbrio e viabilidade técnica, e não da ampliação indiscriminada de obrigações. A tramitação do PL exige diálogo aprofundado entre setor produtivo, especialistas e Poder Público, para evitar distorções regulatórias e garantir que a legislação alcance seus objetivos ambientais sem impor encargos inviáveis a milhares de estabelecimentos que já enfrentam desafios significativos.

A construção de uma política ambiental sólida requer cooperação, técnica, legalidade e responsabilidade. Somente por meio de debates técnicos e ajustes criteriosos será possível desenvolver um sistema de logística reversa que seja ambientalmente eficaz, socialmente justo e juridicamente coerente - fortalecendo, em vez de fragilizar, a gestão de resíduos na cidade de São Paulo. 

Alvaro Luiz Bruzadin Furtado

VIP Alvaro Luiz Bruzadin Furtado

Advogado, ex-procurador do Município e presidente do Sincovaga-SP (Sindicato do Comércio Varejista de Gêneros Alimentícios do Estado de São Paulo).

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