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Phishing 2.0, deepfakes e a era da responsabilização bancária

Fraudes digitais em 2025 ficaram mais sofisticadas. Deepfakes, phishing 2.0 e falhas bancárias exigem nova postura jurídica e reforçam o papel estratégico do advogado na proteção do consumidor.

terça-feira, 30 de dezembro de 2025

Atualizado às 09:15

O ano de 2025 consagra uma transformação profunda no panorama das fraudes eletrônicas, escancarando que os crimes digitais deixaram de ser apenas atos isolados e genéricos para se tornarem operações sofisticadas, personalizadas e altamente eficazes. Entre as táticas emergentes, destacam-se o phishing 2.0 e o uso de deepfakes, que ultrapassam a mera manipulação de mensagens de texto e abraçam a simulação perfeita de vozes, imagens e contextos institucionais. Os criminosos modernizaram-se à sombra do desenvolvimento tecnológico, valendo-se de dados vazados para compor narrativas convincentes, ganhar a confiança da vítima e driblar mecanismos de segurança.

Para o operador do direito, essas mudanças não representam apenas um novo repertório fático - representam a necessidade premente de revisitar conceitos de responsabilidade civil, diligência bancária, monitoramento de transações e proteção do consumidor. Ao mesmo tempo em que o sistema financeiro anuncia avanços tecnológicos, a omissão no bloqueio de transações atípicas ou a fragilidade nos mecanismos de devolução expõem instituições à responsabilização judicial, consolidando uma nova linha de jurisprudência que reforça a tutela dos usuários. O presente artigo analisa as principais modalidades de fraude em voga, as dores mais latentes dos consumidores e os reflexos para a atuação jurídica em 2025.

1. Phishing 2.0 e golpes estruturados: A evolução da fraude digital

O golpe conhecido como phishing 2.0 representa uma evolução dos antigos ataques por e-mail ou mensagens de texto. Neste novo cenário, o criminoso não mais se contenta com uma abordagem genérica; ele utiliza bases de dados vazadas, informações pessoais e algoritmos de inteligência artificial para personalizar ataques de forma quase indistinguível da comunicação legítima.

Um exemplo paradigmático é a falsa Central de Banco, em que o fraudador não só imita o número oficial da instituição (por meio de técnicas de spoofing), mas também utiliza inteligências artificiais capazes de reproduzir a voz de atendentes reais, com ruídos de fundo que simulam ambientes de call center. Essa precisão tecnológica legitima a interlocução e confunde até os usuários mais vigilantes.

Esse novo perfil de fraude cresceu em 2025 não por acaso: a democratização de ferramentas de IA e o crescente volume de dados disponíveis em fóruns e mercados clandestinos permitem a composição de perfis cada vez mais sofisticados e verossímeis. O advogado, portanto, não atua apenas na reparação do dano - torna-se essencial na interpretação jurídica desses novos modos de fraude e na construção de teses que responsabilizem aqueles que deixaram brechas exploráveis.

2. Deepfakes e a simulação de autoridade: Um problema que exige resposta jurídica eficaz

Os golpes baseados em deepfakes representam um dos capítulos mais desafiadores desta nova era. Por meio da clonagem de imagem e voz - seja de familiares ou de dirigentes de empresas -, os fraudadores requisitam transferências urgentes sob pretextos verossímeis. Esse recurso tecnológico torna o golpe não apenas mais eficaz, mas também psicologicamente convincente, dificultando o discernimento da vítima no momento crítico.

A operacionalização de deepfakes é particularmente perigosa quando direcionada a decisões financeiras imediatas, como ordens de transferência por Pix ou TED. O uso de recursos audiovisuais falsificados responde por um aumento exponencial nos prejuízos e - no plano jurídico - impõe desafios inéditos quanto à prova, ao nexo causal e à responsabilidade das instituições financeiras.

O advogado, neste contexto, assume papel duplo: além de pleitear indenização por danos materiais e morais decorrentes da fraude, deve dialogar com o direito probatório e as normas de tecnologia da informação, de modo a construir estratégias que demonstrem a artificialidade da prova apresentada e a ausência de culpa da vítima.

3. As reclamações latentes contra as instituições financeiras

Com a intensificação dos golpes sofisticados, surgem também as dores reclamadas pelos consumidores em 2025 - e que têm encontrado eco no Judiciário. Três queixas dominam o cenário atual:

3.1. Falha no monitoramento preventivo

A reclamação mais recorrente diz respeito à ausência de mecanismos que antecipem, bloqueiem ou sinalizem transações atípicas. A pergunta que ecoa entre os consumidores lesados é: "Como o banco permitiu dezenas de transferências fora do meu padrão comportamental, realizadas em horários incomuns?"

Essa dor não é meramente retórica. Tribunais brasileiros, em especial o STJ, têm consolidado entendimento no sentido de que as instituições financeiras devem possuir sistemas de monitoramento capazes de identificar e interromper transações que claramente fogem ao perfil do cliente, sob pena de indenização por falha na prestação do serviço.

3.2. Dificuldade com o MED - Mecanismo Especial de Devolução

MED - Mecanismo Especial de Devolução deveria funcionar como um instrumento célere de reversão de valores após fraude, mas, na prática, chuva de relatos demonstra que, muitas vezes, os recursos já foram dispersos em contas de difícil rastreamento quando o usuário tenta acioná-lo. A pulverização em milésimos de segundo dos valores torna a recuperação judicialmente mais complexa e menos eficaz.

Essa realidade coloca em xeque a efetividade do MED e fortalece a necessidade de estratégias jurídicas que combinem a ação contra fraudadores com a responsabilização das instituições que não criam mecanismos eficazes de estancamento e recuperação.

3.3. Atendimento humanizado inexistente

Quando a fraude se concretiza, o desespero da vítima exige atendimento humano rápido, eficaz e diferenciado. O que se observa, contudo, é um serviço frequentemente automatizado e incapaz de responder às nuances de um golpe sofisticado. A falta de uma linha direta de bloqueio ou de atendimento prioritário figura entre as principais queixas no Banco Central e em plataformas como Reclame Aqui.

Do ponto de vista jurídico, essa deficiência operacional não é irrelevante: ela pode e deve ser integrada às teses de falha na prestação de serviço, reforçando a necessidade de indenização e a responsabilização pela insuficiência de estrutura para proteção do usuário.

4. A importância do serviço jurídico especializado

No atual cenário, onde golpes tecnológicos se entrelaçam a falhas institucionais e à resistência operacional dos bancos, a atuação jurídica especializada deixa de ser um diferencial e torna-se uma necessidade estratégica.

A prevenção jurídica, nesse contexto, torna-se tão valiosa quanto a reparação. Orientar clientes sobre comportamentos seguros, sobre os limites da responsabilização bancária e sobre a melhor forma de documentar tentativas de bloqueio ou reversão de valores pode significar a diferença entre uma ação exitosa e uma demanda infrutífera.

Conclusão

O ano de 2025 inaugurou uma nova era de fraudes cibernéticas, com implicações que transbordam o mero incidente financeiro e adentram a esfera da responsabilidade civil, do dever de diligência bancária e da proteção do consumidor. Golpes como phishing 2.0, deepfakes e a insuficiência dos mecanismos de defesa institucional exigem uma resposta jurídica proativa, especializada e estratégica.

No centro dessa transformação está a atuação do advogado - não apenas na reparação dos danos sofridos, mas na moldagem de uma cultura de proteção mais eficaz, que responsabilize de forma justa as instituições que falham em proteger seus usuários. 

Gutemberg do Monte Amorim

VIP Gutemberg do Monte Amorim

Advogado especialista em Previdenciário, Consumidor, Saúde, Trabalhista e Fraudes Bancárias. Fundador do Gutemberg Amorim Sociedade Individual de Advocacia. Formado pela PUC-GO, com LL.M pela FGV.

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