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Por que trabalham nossos juízes?

Fábio Ulhoa

O "Migalhas", jornal eletrônico que circula entre profissionais do direito, divulgou recentemente uma interessante matéria sobre o trabalho dos juízes. Acompanhou dois dias do cotidiano de um desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, Dr. Ruy Coppola. A conclusão da reportagem reforça o que todos da área sabemos: a maioria dos magistrados trabalha muito.

segunda-feira, 10 de março de 2008

Atualizado em 7 de março de 2008 12:35


Por que trabalham nossos juízes?

Fábio Ulhoa Coelho*

O "Migalhas", jornal eletrônico que circula entre profissionais do direito, divulgou recentemente uma interessante matéria sobre o trabalho dos juízes (Migalhas 1.845 - 26/2/08 - "48 horas com o desembargador" - clique aqui). Acompanhou dois dias do cotidiano de um desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, Dr. Ruy Coppola. A conclusão da reportagem reforça o que todos da área sabemos: a maioria dos magistrados trabalha muito.

A questão mais importante para a sociedade que a matéria suscita, contudo, talvez seja outra: o estafante trabalho dos nossos juízes tem sido eficiente?

Os magistrados são os agentes públicos incumbidos da mais relevante função do Estado: fazer justiça. Além disso, embora até caiba discutir se recebem remuneração compatível com sua responsabilidade, encontram-se entre os mais bem remunerados agentes públicos. Interessa, por isso, a toda a sociedade que o trabalho deles seja aproveitado do modo mais eficiente possível. Muito trabalho não é sinônimo de eficiência em nenhuma atividade; pelo contrário, a estafa costuma corroê-la.

Cercada, ainda, por rituais e formalidades secularmente cultivados, a prestação jurisdicional não tem sido eficiente, principalmente em razão da demora. Os processos judiciais se eternizam, para desespero e prejuízo dos litigantes, frustração e desgosto dos profissionais. E o culpado é fácil de apontar: a legislação processual, incompatível com a complexidade e dinâmica das relações sociais contemporâneas. E pior, quando se pensa reformá-la com vistas ao aumento da celeridade do processo, acabam produzindo o resultado inverso: mais delongas.

Exemplifico com uma medida introduzida na lei em 1994, destinada especificamente a abreviar o processo judicial: a antecipação de tutela. De um modo simples, ela permite ao juiz decidir a causa logo de início. Pode ser dada quando os elementos levados pelo advogado são tão convincentes que possibilitam ao juiz confirmar, de imediato, que o autor da ação tem o direito que pleiteia. Trata-se de uma decisão inicial de caráter provisório, que o juiz pode alterar se chegar a convicção diversa depois do processo inteiramente concluído.

Ao ser introduzida, a antecipação de tutela cercou-se de grande expectativa. Partia-se da premissa de que o processo se arrastava porque o devedor tinha interesse em protelar a condenação. Com a antecipação, o retardo do processo judicial não mais o beneficiaria. Essa premissa revelou-se equivocada por desconsiderar o dever funcional dos advogados de esgotarem todos os instrumentos e recursos legais em favor do cliente. Desse modo, em praticamente todos os processos, mesmo quando os elementos apresentados não provam tão veementemente a existência do direito, os advogados devem solicitar a antecipação.

O resultado é o oposto do pretendido quando se criou a medida. Depois da previsão legal da antecipação de tutela, os processos não demoram só para acabar; eles, agora, demoram também para começar. Começam, em sua maioria, com pelo menos dois recursos ao Tribunal, para discutir seja a concessão, seja a negação da antecipação de tutela pelo juiz.

Outro exemplo está na limitação das hipóteses de cabimento de recursos ao invés de sua supressão. Isso não diminui; a rigor, aumenta o volume de trabalho dos nossos juízes. Como o advogado tem o dever profissional de empregar todos os meios legais de defesa do cliente, vai sempre sustentar que a hipótese legal de admissibilidade está presente. Aumenta o trabalho do magistrado porque ele tem, antes, que decidir se o recurso é ou não admissível. Se o objetivo é acelerar o processo, a lei deve simplesmente suprimir alguns recursos e não apenas limitar os casos em que podem ser oferecidos.

A antecipação de tutela e limitação dos recursos são experiências más. Entravam a eficiência da prestação jurisdicional e devem ser repensadas.

Além da ampla reforma da legislação processual, outras providências são igualmente necessárias e urgentes para simplificar e abreviar o processo judicial, como, por exemplo, a completa digitalização dos autos, descartando de vez o papel como suporte. Afinal, pelo que trabalham nossos juízes? Certamente não para cumprirem anacrônicas formalidades processuais, e sim para entregarem justiça com rapidez e segurança.


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*Jurista e Professor da PUC/SP





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