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A proposta da ANATEL de novas regras no setor de Telecomunicações

Esther Donio B. Nunes

Esta foi uma das manchetes que se viu na mídia não especializada, na semana passada. A afirmativa não é correta como se verá adiante, já que a Anatel não tem competência neste momento para aprovar ou desaprovar a operação.

quarta-feira, 16 de julho de 2008

Atualizado em 15 de julho de 2008 11:19


A proposta da ANATEL de novas regras no setor de telecomunicações

Esther Donio B. Nunes*

"Anatel aprova fusão entre a Oi & BrT" (!?)

Esta foi uma das manchetes que se viu na mídia não especializada, na semana passada. A afirmativa não é correta como se verá adiante, já que a Anatel não tem competência neste momento para aprovar ou desaprovar a operação. Além disso, é uma maneira muito estreita de se descrever todo o trabalho que foi feito e acaba de ser divulgado pela Agência.

De início, é importante relembrar que a proibição para que haja fusão ou compra de controle de uma concessionária de STFC - Serviço Telefônico Fixo Comutado, atuando numa determinada Região por outra concessionária de outra Região, está contida no Plano Geral de Outorgas - PGO, que é um Decreto Presidencial1 que, portanto, não pode ser alterado pela Anatel, mas sim por outro Decreto Presidencial. O que a Anatel acaba de fazer é colocar em consulta pública minuta de proposta de novo texto do PGO para, ao final, depois de recebidas as contribuições da sociedade, encaminhar como sugestão ao Poder Executivo.

Mas, o que realmente se vê é muito mais do que simplesmente a proposta de alteração do PGO que poderá eventualmente viabilizar a operação supracitada. Trata-se de uma proposta muito abrangente e ambiciosa, que pretende rever e ajustar o marco regulatório uma década depois da grande mudança que se viu no mundo, com a onda de privatizações no setor de telecomunicações nos anos 90.

Na prática, em atendimento a determinação do Ministério das Comunicações, que em abril deste ano publicou Portaria contendo diretrizes para um novo marco regulatório2, a Anatel apresenta para comentários públicos um plano de ações de curto, médio e longo prazo que norteará a sua atuação nos próximos anos.

A proposta é de mudanças na regulamentação dos vários serviços e dos próprios procedimentos da Agência, tendo como objetivo final atender mais e melhor o usuário e a sociedade e como principal norteador a competição. As linhas gerais traçadas para atingir esse fim, conforme declara a Agência, são o fortalecimento de grupos econômicos já existentes e o incentivo à criação de novos, inclusive de pequeno e médio porte. Toma como princípios para nortear esta ação: acelerar o desenvolvimento econômico e social e a redução das desigualdades regionais; a ampla oferta e o uso de serviços das redes, com forte ênfase à disseminação e popularização da banda larga; o incentivo à criação e manutenção de negócios sustentáveis; o desenvolvimento industrial e tecnológico e o fortalecimento do papel do órgão regulador .

É neste contexto que são publicadas três Consultas Públicas - CP para comentários até dia 17.7.2008. Interessante notar que a própria forma de apresentação das CPs é excepcional. Como veremos adiante, as alterações propostas ao PGO são apenas uma pequena parte do que já se batizou como PGR - Plano Geral de Atualização da Regulamentação das Telecomunicações no Brasil.

O PGR, objeto da CP nº. 223 não é propriamente um regulamento, mas sim um conjunto de planos, projetos, que a Agência tem, todos eles implicando mudanças na regulamentação infra legal existente ou criação de novas normas e, portanto, todos sujeitos à preparação, pela Anatel, de minutas de regras que deverão ser apresentadas a comentários públicos, para somente depois se tornarem normas aplicáveis. Temos um longo caminho a seguir, portanto.

Vale a leitura na íntegra do Anexo à CP nº. 22, uma longa exposição de motivos de toda a postura que a Agência adota ao publicar as propostas. Contém detalhadamente explicações dos princípios regulatórios norteadores e dos objetivos e propósitos que culminaram com a edição da CP, além de alguns dados econômicos e de mercado. A seguir, as mais relevantes ações que a Agência propõe.

I. Curto prazo

1. Atualização do Plano Geral de Outorgas, objeto da CP 23, que comentaremos abaixo;

2. Várias alterações no STFC, como:

(a) Revisão dos contratos de concessão, implicando mudança do PGMU, com inclusão de metas para expansão das redes do STFC para suporte à banda larga, incorporação de facilidades e obrigação de atendimento nas áreas rurais;

(b) Avaliação da adequação do regulamento do STFC;

(c) Elaboração de um Plano Geral de Metas de Competição;

3. Regulamentação do Plano Geral de Autorização (PGA) para o SMP;

4. Regulamentação da revenda nos vários Serviços: STFC, do SMP (finalmente os MVNOs!) SCM e a revenda de provimento de capacidade satelital;

5. Regulamentação do uso de radiofreqüência e especialmente a massificação da banda larga;

6. Regulamentação do umbundling (tão esperada!)

II Médio prazo

1. Revisão da regulamentação do SMP;

2. Adequação das obrigações para os serviços de telecomunicações para possibilitar a oferta de planos de serviços de banda larga, inclusive para a população de baixa renda;

3. Regulamentação do SCM, com elaboração do regulamento de remuneração das redes;

4. Regulamentação do uso de radiofreqüências com foco na análise da mobilidade restrita;

5. Regulamentação para o fomento da pesquisa e desenvolvimento para produção de tecnologia nacional;

6. Revisão dos procedimentos administrativos e organizacionais da Anatel;

III Longo prazo

1. Regulamentação do modelo convergente de outorga para a exploração de redes e serviços de telecomunicações;

2. Revisão da regulamentação de TV por assinatura;

3. Revisão da regulamentação do Fust.

Inúmeros poderão vir a ser os comentários ao PGR, desde a ordem de prioridade que a Agência estabeleceu para cada ação, como a ação propriamente dita. E estes virão na medida em que o público se aprofundar na análise das propostas e tiver a oportunidade de ouvir a Agência nas audiências públicas que começam esta semana. De início, no entanto, entendemos que vale registrar a satisfação e esperança que as medidas propiciam, ao pelo menos trazer à discussão tantos temas importantes, que há muito se verificavam como necessários a esta realidade. Agrada ver a ênfase que se dá não somente a obrigações das operadoras e direitos dos usuários, como também o reconhecimento de que é necessário viabilizar e incentivar a atividade empresarial, para que por fim se beneficie a população.

Mas, e o PGO afinal? Anexo à CP 234 está um novo texto de PGO que mantém o país dividido nas mesmas Regiões. Inova, no entanto, em aspectos extremamente relevantes para o mercado, para os futuros investidores e para o país na comunidade internacional, ao permitir a atuação de um mesmo grupo econômico em duas Regiões, mas não três, impondo ao grupo certas condições e limitações.

Assim, exige o artigo 8º, parágrafo único que a concessionária, ou sua controladora direta mantenha seu registro como companhia de capital aberto. Já no artigo 10 estabelece que haverá limite ao capital estrangeiro, na forma do art. 18, parágrafo único da LGT, que por sua vez, só autoriza o Poder Executivo a impor limites à participação estrangeira, sem no entanto fixá-lo. De novo, traz-se à baila o assunto que tanta polêmica causou especialmente no âmbito da OMC.

O ponto que parecia de maior atrito interno no Conselho Diretor da Anatel e causava grande expectativa, não foi tratado de forma expressa, já que o artigo 9 apenas indica que a concessionária deve explorar exclusivamente o STFC e dá a Anatel 180 dias de prazo para expedir regulamentação específica a este respeito. O que se esperava era, em primeiro lugar, uma definição da Anatel quanto ao destino das licenças de SCM que as concessionárias detém, a possibilidade de mantê-las na mesma empresa, com eventual obrigação de segregação de contabilidade, ou a necessidade de passar a outra sociedade não concessionária.

Nas várias passagens da documentação publicada se vê o forte anseio da Anatel de se manter como um órgão regulador forte e dinâmico. Se as medidas ora anunciadas forem efetivamente levadas adiante, se houver agilidade da Anatel e da sociedade como um todo em implementar um novo conjunto de regras mais condizentes com as atuais circunstâncias, regras claras e isonômicas, podemos ter uma nova década de muito sucesso, crescimento e muitos investimentos na área de telecomunicações. Resta-nos agora analisar e comentar detalhadamente cada uma das propostas e oferecer a contribuição a este empreendimento.

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1 Decreto 2534 de 2 de abril de 1998, expedido em cumprimento ao art. 18, inciso II, da Lei Geral de Telecomunicações (LGT).

2 Portaria MC n°. 178 de 22 de abril de 2008, publicada no DOU de 24 de abril de 2008.

3 Consulta Pública nº. 22 de 16.6.2008, publicada no DOU de 17.6.2008.

4 Consulta Pública nº. 23 de 16 de junho de 2008, publicada no DOU de 17 de junho de 2008.

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*Atua em Tecnologia da Informação e Telecomunicações, é sócia da Área Empresarial do escritório Pinheiro Neto Advogados

* Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.

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