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Decisão

Atormentada por perturbação sonora de igreja será indenizada

Laudo emitido por policiais civis atestou a emissão de sons e ruídos acima do limite tolerável.

Da Redação

quarta-feira, 11 de abril de 2012

Atualizado às 09:35

A 5ª câmara de Direito Civil do TJ/SC condenou uma igreja evangélica de Herval d'Oeste a indenizar em R$ 5 mil a família de uma vizinha, por perturbação da paz.

A vizinha, já falecida, reclamava que a igreja, localizada na frente de sua residência, emitia sons e ruídos excessivos, provocados pelos cultos realizados no local.

O então presidente da igreja também deverá arcar com os danos morais. "Na época dos fatos, o pastor era o representante da instituição religiosa, fato incontroverso nos autos, sendo igualmente responsável pelos danos ocasionados à falecida", expôs o desembargador Jairo Fernandes Gonçalves, relator.

Com a morte da vizinha, cujo delicado estado de saúde teria se agravado com a pertubação sonora, sua família assumiu a ação e será beneficiária da indenização.

Veja a íntegra da decisão.

_____________

Apelação Cível n. 2010.016093-6, de Herval D'oeste

Relator: Des. Jairo Fernandes Gonçalves

APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. PRELIMINAR. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO REPRESENTANTE LEGAL DA INSTITUIÇÃO RELIGIOSA. DESCABIMENTO. ENTE JURÍDICO QUE EXPRESSA SUA VONTADE, ATRAVÉS DE SEUS PREPOSTOS. PREFACIAL AFASTADA.

Não há como responsabilizar unicamente a instituição religiosa pela perturbação do sossego alheio, em decorrência da emissão de ruídos acima dos limites toleráveis, porquanto a pessoa jurídica expressa sua vontade por meio de seus representantes legais.

CULTOS REALIZADOS EM PERÍODO NOTURNO. PERTURBAÇÃO DE SOSSEGO CARACTERIZADA. LAUDO DA COORDENADORIA REGIONAL DO MEIO AMBIENTE E DA POLÍCIA CÍVIL QUE ATESTAM A EMISSÃO DE SONS E RUÍDOS ACIMA DO PERMITIDO. AGRAVAMENTO DA SAÚDE DA VÍTIMA DEVIDAMENTE COMPROVADA. OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR EXISTENTE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Uma vez configurada a ilicitude perpetrada pela instituição religiosa, o dano e o nexo de causalidade entre a conduta e o agravamento da saúde da vítima, é de ser mantida a condenação ao ressarcimento do prejuízo indevidamente suportado por ela, nos moldes determinados pela sentença recorrida.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2010.016093-6, da comarca de Herval D'oeste (Vara Única), em que são apelantes Igreja Evangélica em Cristo Nova Vida e Angelino Ribeiro dos Santos, e é apelado Espólio de N.T.Z.:

A Quinta Câmara de Direito Civil decidiu, por unanimidade, conhecer do presente recurso, para afastar a preliminar e, no mérito, desprovê-lo. Custas legais.

O julgamento, realizado no dia 9 de fevereiro de 2012, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Monteiro Rocha, com voto, e dele participou o Excelentíssimo Senhor Desembargador Henry Petry Júnior.

Florianópolis, 24 de fevereiro de 2012.

Jairo Fernandes Gonçalves

RELATOR

RELATÓRIO

Igreja Evangélica em Cristo Nova Vida e Angelino Ribeiro dos Santos interpuseram recurso de Apelação Cível contra a sentença do MM. Juiz da Vara Única da comarca de Herval D'Oeste, proferida na Ação de Indenização por Danos Morais n. 037.03.004161-5 ajuizada por N.T.Z., posteriormente substituída pelo Espólio de N.T.Z. (fls. 143-144), contra eles, que julgou procedente o pedido para condenar os réus ao pagamento de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de danos morais pela perturbação de sossego causado à autora (fls. 152-162).

Suscitaram, preliminarmente, a ilegitimidade passiva de Angelino Ribeiro dos Santos, pois ele era o presidente da Igreja Evangélica em Cristo Nova Vida na época dos fatos, o que o isenta de responder pelos danos causados pela instituição religiosa.

No mérito, alegaram que a decisão do Juiz singular restou fundamentada em laudo emitido por policial civil, sendo prova frágil para embasar a sentença, por não ter sido utilizado aparelhos de aferição pelo Inmetro.

Ressaltaram que foi efetuado acordo com a falecida apelada, o qual teria sido cumprido com as modificações realizadas na sede da igreja, não tendo ela comprovado o agravamento ou o ocasionamento de doença em virtude da suposta

produção de ruído excessivo.

Aduziram, ainda, que os pequenos registros de excesso de barulho configura mero dissabor, não tendo o condão de trazer demasiado abalo que justifique as suas condenações em danos morais.

Ao final, reforçaram que, no caso de ser mantida a sentença de primeiro grau, há necessidade de reduzir o quantum indenizatório arbitrado a título de danos morais (R$ 5.000,00), porquanto a instituição religiosa é ente desprovido de recursos financeiros (fls. 167-175).

O recurso foi recebido em ambos os efeitos (fl. 178).

Nas contrarrazões apresentadas (fls.181-183), sustentou o espólio da apelada o acerto do Magistrado a quo em sua decisão, pois restou devidamente comprovado que os apelantes causavam as perturbações que deram ensejo ao pedido de reparação de danos.

Logo após, os autos ascenderam a esta Corte.

Este é o relatório.

VOTO

O recurso preenche os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, razão pela qual merece ser conhecido.

Os apelantes se insurgiram contra a sentença de primeiro grau, suscitando, preliminarmente, a ilegitimidade passiva ad causam do pastor Angelino Ribeiro dos Santos, que não pode ser responsabilizado por eventual dano ocasionado pela instituição religiosa.

A prefacial não merece prosperar.

O Magistrado a quo, Dr. Fernando Cordioli Garcia, enfrentou a matéria em sentença, consignando:

[...] Os argumentos dos réus carecem de viabilidade jurídica. Isso porque, as pessoas jurídicas, como bem se sabe, expressam sua vontades por meio de seus representantes legais ou prepostos, pessoas físicas que devem proceder nos limites dos atos constitutivos dos entes sociais, em observância aos poderes que lhe foram conferidos em seus respectivos mandatos (fl. 155).

Na época dos fatos, o segundo apelante era o representante da instituição religiosa, fato incontroverso nos autos, sendo igualmente responsável pelos danos ocasionados à falecida apelada pela emissão de sons e ruídos excessivos provocados pelos cultos realizados naquele local.

Refere-se que as atividades da igreja tidas abusivas, em decorrência de os ruídos provocados pelo culto estarem acima do limite tolerável, como comunicado pela vítima à fl. 14, estavam sob o comando do Pastor "Angelim", segundo réu.

É de entendimento deste Tribunal:

PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA AFASTADA. REPRESENTANTE LEGAL DA COLIGAÇÃO QUE PODE SER RESPONSABILIDADE (sic) SOLIDARIAMENTE NAS HIPÓTESES DE RESPONSABILIDADE CIVIL POR EVENTO DANOSO QUE VENHA A SER PRATICADO (Apelação Cível n. 2007.009790-1, rel. Des. Subst. Carlos Adilson Silva, julgada em 7-10-2010).

Dessa forma, afasta-se a prefacial arguida.

Os apelantes inconformados, no mérito do reclamo, alegaram que o laudo emitido por policiais civis (fls. 101-102), que fundamentou a sentença de primeiro grau, não é prova segura para atestar a emissão de sons e ruídos acima do limite tolerável, por não ter empregado aparelho de aferição pelo Inmetro.

Nos presentes autos, a avaliação dos efeitos sonoros dos cultos da instituição religiosa foi realizada por servidores da Coordenadoria Regional do Meio Ambiente do Vale do Rio do Peixe - CER/PE/Fatma (fls. 99-100), e também por autoridade policial (fls. 101-102).

No laudo emitido pelo policial civil (fls. 99-100) há clara descrição da forma como foi realizada a medição e do aparelho utilizado, não se presumindo nenhuma irregularidade, motivo pelo qual a impugnação genérica não se presta para o fim de o invalidar.

Ademais, a alegação dos apelantes de que haviam firmado acordo com a falecida apelada e que fora devidamente cumprido não tem como prosperar, pois não restou comprovada a existência de acordo ou o seu cumprimento. Ao contrário, as provas anexadas aos autos dão conta de que os ruídos continuaram a perturbar, restando comprovado que as modificações indicadas às fls. 123-129 não foram capazes de evitar o dano reclamado, como se observa pelos Boletins de Ocorrência de fls. 132-136.

Se houve modificação/diminuição de ruídos, esse fato não altera as perturbações constatadas. Ora, ainda que as alterações comunicadas em sede de defesa e indicadas às fls. 123-129 tivessem o condão de diminuir os ruídos propagados pela instituição religiosa, esta modificação por si só não teria o condão de eximi-los da responsabilidade de indenizar, pois o razoável seria a realização dos cultos em dias e horários de forma a não prejudicar o sossego da falecida recorrida.

Quanto ao argumento de que a falecida apelada não comprovou efetivamente o prejuízo, devendo considerar os ruídos como um mero dissabor, o que não caracteriza dano moral, de igual forma, não merece prosperar. Há fortes indícios da existência do incômodo causado pela instituição religiosa por emitir sons e ruídos acima do limite tolerável, consoante se observa nas assinaturas dos vizinhos dela de fls. 17-21 e dos laudos médicos que comprovam o agravamento da situação de saúde

da falecida apelada (fls. 22-49).

Sobre o tema, extrai-se da sentença recorrida:

[...] Na tentativa de comprovar suas alegações, a parte autora trouxe aos autos boletins de ocorrência lavrados na Delegacia de Polícia de Herval d'Oeste, em 29/08/2001 e 28/11/2002, em que cominou a perturbação do seu sossego [...].

Acostou, também, cópia de abaixo assinado dos moradores vizinhos à primeira ré, no sentido que se mantivesse os equipamentos de som em um volume que não os perturbasse (fls. 17/21), atestado médico datado de 16/12/2002, dando conta da necessidade de tranquilidade psíquica, além de tratamento medicamentoso (fl. 22), e demais documentos (fls. 23/49), dos quais denota-se que a autora estava em tratamento de saúde desde meados de julho de 2001. Além disso, pugnou pela juntada de cópia da denúncia ofertada pelo Ministério Público contra o réu Angelino Ribeiro dos Santos (autos de n. 037.00.005215-5), tendo como vítima Silo Zambiazzi, na qual imputou-lhe a conduta descrita no art. 42, II e III, do Decreto-Lei n. 3.688/41, e das avaliações de sons e ruídos da Igreja Nova Vida (fls. 99/102), realizadas em 17-06/2001 (pela FATMA) e 23/02/2003 (pela Polícia Civil), respectivamente. Desta forma, a produção probatória aponta que a autora padecia de algumas doenças, que estava realizando tratamento médico, fazendo de uso [sic] de medicação e necessitava de tranquilidade psíquica. Das avaliações de sons e ruídos acostados às fls. 99/102 nota-se que os cultos realizados pela primeira ré excediam os limites previstos pela Legislação Ambiental em vigor, fato que não foi negado pelos réus. Ao contrário, foi reconhecido expressamente por eles, notadamente pelas modificações feitas nas instalações da primeira requerida, e comprovadas pelas fotografias de fls. 123/129, datadas de 11/11/2006. Certo é que, os réus tinham o direito de realizar seus cultos religiosos nos dias e horários de costume, desde que não interferissem no sossego alheio - no caso, dos vizinhos que residiam nas imediações da Igreja -, o que, pela prova produzida, acredita-se que ocorria com frequência, em função da perturbação advinda do som alto produzido durante as celebrações. Não se pode olvidar que a dita fragilidade na saúde da autora pode ter decorrido, além das doenças que a acometiam, de situações como as relatadas nos autos (incômodo, perturbação do sossego), que tem o condão de deliberar ainda mais a integridade física e psíquica daqueles que convivem com isso. [...] Sem qualquer esforço, constata-se na hipótese dos autos o fato lesivo perpetrado (conduta dos réus, que perturbava o sossego dos moradores), o dano produzido (incômodo, perturbação do sossego), e o nexo de causalidade entre o fato danoso e o prejuízo invocado (fls. 157-159).

Dessa forma, as provas produzidas nos autos e que embasaram a sentença são robustas, não merecendo prosperar a alegação dos apelantes.

É entendimento desta Corte de Justiça:

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. [...] EVENTOS REALIZADOS NO IMÓVEL VIZINHO. PERTURBAÇÃO DOS MORADORES. BARULHO EM DEMASIA. PROVA ROBUSTA. ILÍCITO CONFIGURADO. - DANO MORAL. EXCESSO. PREJUÍZO DA TRANQUILIDADE E SOSSEGO DOS MORADORES. DEVER DE INDENIZAR. - QUANTUM INDENIZATÓRIO. NORTE: PROPORCIONALIDADE. - SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. EQUIVALÊNCIA DE DERROTAS. PARTIÇÃO IGUALITÁRIA. - SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO (Apelação Cível n. 2010.039853-5, rel. Des. Henry Petry Junior, julgada em 4-5-2011).

E ainda:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. VIZINHANÇA. ESTABELECIMENTO COMERCIAL LOCALIZADO NA PARTE TÉRREA DE IMÓVEL RESIDENCIAL. UTILIZAÇÃO DE MAQUINÁRIO NO PERÍODO NOTURNO. PERTURBAÇÃO DA ORDEM. ABALO PSÍQUICO. ATO ILÍCITO CARACTERIZADO. DANO MORAL PRESUMIDO. DEVER DE COMPENSAR. QUANTUM INDENIZATÓRIO. ORIENTAÇÃO PELOS CRITÉRIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. Lesados o sossego e a qualidade de vida pelo ruído e vibração contínuos produzidos pelo equipamento instalado, exsurge o dano moral pelo comprometimento da integridade física e psíquica do vizinho [...] (Apelação Cível n. 2009.050523-9, rel. Des. Fernando Carioni, julgada em 21-1-2010).

Pelos motivos expostos, restou configurado o dever de indenizar dos apelantes pelos excessos cometidos que ocasionaram perturbação da tranquilidade da falecida recorrida.

Postularam os apelantes, por fim, caso fosse mantida a sentença de primeiro grau, que o quantum indenizatório arbitrado fosse minorado, por se tratar de instituição religiosa que não visa lucro em suas atividades.

O Magistrado a quo condenou os apelantes ao pagamento de indenização no montante de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a ser paga em parcela única, a qual merece ser mantida.

É que ao mensurar os danos morais, o Togado de primeiro grau levou em consideração o caso concreto, as condições sociais e econômicas das partes, a extensão do dano e o grau de culpa do ofensor, tendo por objetivo confortar a parte lesada pelo contrangimento sofrido, bem como inibir a reiteração do ato ofensivo.

Acerca do montante arbitrado, retira-se do julgado desta Câmara:

[...] O quantum compensatório deve ser arbitrado de acordo com as circunstâncias do caso concreto, as condições sociais e econômicas da parte ofensora, o grau da culpa e a extensão da ofensa moral, de modo que possa significar uma reprimenda ao agressor, para que se abstenha de praticar fatos idênticos no futuro, mas não ocasione um enriquecimento injustificado para o lesado.(Apelação Cível n. 2010.057468-7, rel. Des. Carlos Adilson Silva, julgada em. 29-3-2011).

Desse modo não merece reforma a sentença no que tange à minoração dos danos morais, por ser o quantum nela arbitrado razoável para atingir o seu objetivo, qual seja, a compensação do abalo sofrido pela falecida apelada, com caráter pedagógico e inibidor, sem importar enriquecimento, e, simultaneamente, sanção civil ao causador do ilícito, sem ocasionar-lhe o empobrecimento.

Ex positis, vota-se no sentido de conhecer do recurso, para afastar a preliminar e, no mérito, negar provimento a ele.

Jairo Fernandes Gonçalves

RELATOR

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