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Presidente do TRF da 3ª Região recebe da AASP memorial sobre nota técnica do CJF

Memorial sobre nota técnica do CJF

Da Redação

sexta-feira, 16 de setembro de 2005

Atualizado em 15 de setembro de 2005 16:42

 

Presidente do TRF da 3ª Região recebe da AASP memorial sobre nota técnica do CJF

 

O presidente da AASP, José Diogo Bastos Neto, e o segundo secretário da Entidade, Marcio Kayatt, foram recebidos na quarta-feira, 14/9, pela Desembargadora Federal Diva Malerbi, presidente do Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Na oportunidade, os representantes da AASP entregaram-lhe cópia do memorial que defende a revogação da orientação constante de nota técnica elaborada pelo Grupo de Precatórios, cujo objetivo é uniformizar os procedimentos atinentes ao cumprimento do artigo 19 da Lei 11.033, de 21 de dezembro de 2004. O documento será encaminhado a todos os membros do Conselho da Justiça Federal, tendo em vista que o Ministro José Arnaldo da Fonseca, Coordenador-Geral da Justiça Federal, determinou a inclusão do pedido da AASP, de revogação da nota técnica, na pauta da próxima reunião do CJF, dia 26/9.

 

Para a AASP, o artigo 19, incluído na Lei 11.033, de 21 de dezembro de 2004, que alterou a tributação do mercado financeiro e de capitais e instituiu o Regime Tributário para Incentivo à Modernização e à Ampliação da Estrutura Portuária (Reporto), é de manifesta inconstitucionalidade, na medida em que contraria as regras enunciadas pelo artigo 100 da Constituição Federal, além de representar indevida coação aos credores da administração pública.

 

A Associação considera ainda que a edição da referida orientação a todos os Juízes Federais, constante da nota técnica elaborada pelo Grupo de Precatórios do CJF, ao tratar de matéria de cunho eminentemente jurisdicional, extrapola a competência do CJF, limitada pelo artigo 1º de seu Regimento Interno à supervisão orçamentária e administrativa da Justiça Federal de Primeiro e Segundo Graus.

 

Para o presidente da AASP, José Diogo Bastos Neto, o memorial visa "proporcionar democrático debate sobre esta questão de extrema relevância para a comunidade jurídica e especialmente para a advocacia".

 

Veja a íntegra do memorial:

 

Memorial da Requerente

 

Através de Ofício endereçado a todos os Juízes Federais, em 1º de março do corrente, o então Coordenador-Geral da Justiça Federal, Ministro Ari Pargendler, encaminhou Nota Técnica elaborada pelo Grupo de Precatórios, com orientações relativas ao cumprimento do artigo 19 da Lei 11.033, de 22 de dezembro de 2.004, que estabeleceu a obrigatoriedade de apresentação de certidões negativas como requisito para o levantamento de valores decorrentes de precatórios judiciais de natureza comum.

Tal recomendação, face à nova competência atribuída pela Emenda Constitucional nº 45 ao Egrégio Conselho da Justiça Federal, passou a ser observada pelos MM. Juízes Federais de todo o País, em evidente violação às normas constitucionais que regem a matéria.

 

De fato, a regra introduzida em nosso ordenamento pelo artigo 19 da Lei 11.033/04 é de manifesta inconstitucionalidade, razão porque não tem como ser exigida da forma como preconizado pela Nota Técnica aqui combatida.

 

Como bem demonstrado pelo Ilustre Professor Kiyoshi Harada, em brilhante parecer elaborado a pedido da Comissão de Precatórios da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção de São Paulo (doc. 01), "o dispositivo sob comento afronta, não só, o art. 100 e parágrafos da CF ao inovar os requisitos para satisfação do precatório judicial, como também, violenta o art. 2º da CF ao interferir na prestação jurisdicional em sua fase final, que é a da efetivação da jurisdição, impingindo ao Judiciário um desprestígio maior como se já não bastasse o estigma da morosidade que, por si só, compromete a credibilidade de sua atuação".

 

Mas, não é só. Ao estabelecer a exigência de apresentação de certidões negativas de débitos para com os fiscos federal, estadual e municipal, o artigo 19 da Lei 11.033/04 acabou por criar verdadeira restrição de índole punitiva ao contribuinte, motivada por mera inadimplência e que se revela absolutamente contrária ao regime das liberdades públicas.

 

Por ocasião de recentíssimo julgamento do RE 413.782-8, o Em. Min. Celso de Mello, do Colendo Supremo Tribunal Federal, teve a oportunidade de assim se pronunciar:

"O Supremo Tribunal Federal, tendo presentes os postulados constitucionais que asseguram a livre prática de atividades econômicas lícitas (CF, art. 170, parágrafo único), de um lado, e a liberdade de exercício profissional (CF, art. 5º, XIII), de outro - e considerando, ainda, que o Poder Público dispõe de meios legítimos que lhe permitem tornar efetivos os créditos tributários -, firmou orientação jurisprudencial, hoje consubstanciada em enunciados sumulares (Súmulas 70, 323 e 547), no sentido de que a imposição, pela autoridade fiscal, de restrições de índole punitiva, quando motivada tal limitação pela mera inadimplência do contribuinte, revela-se contrária às liberdades públicas ora referidas (RTJ 125/395, Rel. Min. OCTAVIO GALLOTTI)".

Mais adiante, afirma o culto Ministro:

"O fato irrecusável, nesta matéria, como já evidenciado pela própria jurisprudência desta Suprema Corte, é que o Estado não pode valer-se de meios indiretos de coerção, convertendo-os em instrumentos de acertamento da relação tributária, para, em função deles - e mediante interdição ou grave restrição ao exercício da atividade empresarial, econômica ou profissional - constranger o contribuinte a adimplir obrigações fiscais eventualmente em atraso".

Pois bem. No caso em exame, mais do que restringir o exercício de atividade empresarial, econômica ou mesmo profissional, o artigo 19 da Lei 11.033/04 implica em restrição ao devido processo legal, expressamente assegurado pelo artigo 5º, LIV, da Carta Maior, eis que priva a parte de livremente receber e usufruir bem que lhe foi conferido por força de decisão judicial (depósito oriundo de precatório), sem o devido processo legal.

 

Ora, não parece haver grande dificuldade em se concluir que o único e exclusivo objetivo da norma impugnada - exigir a apresentação de certidões negativas como condição para o levantamento de valores oriundos de condenação judicial - é o de constranger o cidadão, enquanto detentor de crédito oriundo de título judicial, a pagar hipotéticos débitos que tenha para com o Estado.

 

Ocorre que, havendo no ordenamento pátrio procedimento próprio para o recebimento pelo Poder Público de seus supostos créditos (execução fiscal), onde é concedido ao contribuinte a possibilidade de se defender (embargos à execução), o dispositivo impugnado implica em flagrante violação à garantia da ampla defesa e do contraditório, expressamente assegurada no artigo 5º, LV, da Constituição Federal.

 

Em outras palavras, se ao contribuinte é constitucionalmente conferido o direito de se defender de eventuais cobranças que lhe são dirigidas pelo Fisco, com os meios e recursos a ele inerentes, não pode este impedir o recebimento de valores originários de condenação judicial como mero instrumento de coerção.

 

Na verdade, admitir a constitucionalidade do artigo 19 da Lei 11.033 será o mesmo que, de forma absolutamente ingênua, aceitar a inversão do sentido constitucional imposto aos direitos e garantias fundamentais, para acobertar a presunção de que todos são devedores do Fisco até que façam prova do contrário.

 

Como bem sentenciou o Em. Juiz de Direito de São Paulo, Fernando Figueiredo Bartoletti, em r. decisão proferida nos autos do processo 053.93.409242-9, "cria-se assim verdadeiro seqüestro indireto, onde, coram populo, o contribuinte é obrigado a colocar seus bens à disposição, e provar que as Fazendas diversas não poderiam tomar medidas assecuratórias, que a própria lei criou, de forma genérica em verdadeiro amplo e irrestrito sequestro, sem porém, que respeitar-se o due process of law, daí porque inconstitucional".

 

De ressaltar, por oportuno, que instado a emitir parecer nos autos da ação direta de inconstitucionalidade nº 3.453-7, em trâmite perante o Colendo Supremo Tribunal Federal, o então Procurador Geral da República, Dr. Cláudio Fonteles, concluiu pela inconstitucionalidade do famigerado artigo 19 da Lei 11.033/04 (doc. 02).

 

Vale destacar a seguinte passagem do aludido parecer:

"O dispositivo legal questionado é, de fato, inconstitucional. E para chegar-se a essa conclusão bastaria analisar o art. 100 e seus parágrafos da Constituição da República. Esse artigo da Carta Magna disciplina pormenorizadamente o regime dos precatórios judiciais. O que o constituinte quis regular a respeito dos precatórios o fez, e aquilo que entendeu necessário transferir à disciplina pelo legislador ordinário também o fez, e expressamente. A Constituição, no tocante ao tema, somente transferiu ao regramento infraconstitucional a definição de obrigações de pequeno valor, que não obedecerão à ordem cronológica de apresentação dos precatórios, cujos pagamentos o erário deva fazem em virtude de sentença judicial transita (art. 100, § 3º, CF), e a fixação de valores distintos para elas, segundo as diferentes capacidades das entidades de direito público (art. 100, § 5º, CF)".

Por tais razões, a Associação dos Advogados de São Paulo aguarda que este Colendo Conselho da Justiça Federal revogue a orientação constante da Nota Técnica emitida pelo Grupo de Precatórios sobre a aplicação do artigo 19 da Lei 11.033/04, reconhecendo-se, incidentalmente, a sua inconstitucionalidade.

 

São Paulo, 12 de setembro de 2.005.

 

José Diogo Bastos Neto

Presidente