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Imunidade

ALERJ não terá que retirar discurso de deputada do site

Cidinha Campos teria acusado Maurício Teles Barbosa de prevaricação e formação de quadrilha.

Da Redação

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Atualizado às 14:46

A 1ª câmara Cível do TJ/RJ negou provimento a ação do atual secretário de segurança pública da BA Maurício Teles Barbosa. O autor pedia a retirada de qualquer referência a um trecho do discurso feito pela deputada Estadual Cidinha Campos, em agosto de 2003, do site da Alerj e do Google, em que a parlamentar teria acusado-o de cometer os crimes de prevaricação e formação de quadrilha quando ele ainda trabalhava como delegado Federal no RJ.

Para o desembargador Maldonado de Carvalho, relator, a imunidade parlamentar garante o exercício da atividade com a mais ampla liberdade de manifestação, logo os deputados e senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.

"A imunidade material, portanto, descaracteriza a ilicitude e impede que o parlamentar responda, civil ou criminalmente, por eventual lesão moral. Assim, caracterizada a pertinência com o mandato e o interesse de determinada parcela do funcionalismo estadual quanto ao assunto abordado na opinião do Parlamentar no exercício de seu mandato, não há como prosperar o pedido direcionado a obrigação de fazer, nos termos em que foi requerido", ressaltou o magistrado.

  • Processo : 0097909-54.2011.8.19.0001

__________

Primeira Câmara Cível

Apelação Cível nº 0097909-54.2011.8.19.0001

Relator: Des. MALDONADO DE CARVALHO

IMUNIDADE PARLAMENTAR. MANIFESTAÇÃO DIFUNDIDA NO INTERIOR DO PLENÁRIO DA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. OBRIGAÇÃO DE FAZER. PEDIDO DE RETIRADA DO SITE DA ALERJ DE TRECHO DO DISCURSO PROFERIDO PELA DEPUTADA ESTADUAL CIDINHA CAMPOS. 1. A imunidade parlamentar material que confere inviolabilidade na esfera civil e penal a opiniões, palavras e votos manifestados pelo congressista (CF, art. 53, caput) incide de forma absoluta quanto às declarações proferidas no recinto do Parlamento. 2. Por estar vinculada ao próprio Poder, os efeitos da inviolabilidade atingem os atos aparentemente ilícitos de natureza penal e civil, garantindo, com isso, a plena liberdade de atuação do parlamentar. 3. A imunidade material, portanto, descaracteriza a ilicitude e impede que o parlamentar responda, civil ou criminalmente, por eventual lesão moral. 4. À divulgação no sítio eletrônico da ALERJ do discurso proferido da Tribuna pela Deputada Estadual, que se restringe a resumir e comentar a manifestação feita da tribuna pela parlamentar no exercício de seu mandato, consistindo, por isso, em mera extensão da imunidade material, tal fato abarcado também se encontra pela mesma inviolabilidade material. 5. Caracterizada a pertinência com o mandato e o interesse de determinada parcela do funcionalismo estadual quanto ao assunto abordado na opinião do Parlamentar no exercício de seu mandato, não há como prosperar o pedido direcionado a obrigação de fazer, nos termos em que foi requerido. 6. Decisão que se reforma.

PROVIMENTO DO RECURSO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 0097909-54.2011.8.19.0001, em que é apelante ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO ALERJ e apelado MAURICIO TELES BARBOSA.

ACORDAM os Desembargadores que integram a Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade, em dar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator.

Relatório às fls. 272/273.

Para melhor exame da lide, necessário se faz tecer alguns comentários iniciais.

Como bem se vê, o autor, Secretário de Estado de Segurança Pública da Bahia, ajuizou AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER em face do ESTADO DO RIO DE JANEIRO, objetivando, em síntese, a retirada de trecho do discurso proferido pela Deputada Estadual Cidinha Campos, em 26/08/2003, que vem sendo divulgado no site da ALERJ e do GOOGLE.

Afirma o autor, em breve síntese, que a deputada em seu discurso o acusa de ter praticado crime de prevaricação, ou de formação de quadrilha, quando do cumprimento do mandado de prisão em desfavor de fraudador da Previdência Social, na época que exercia o cargo de Delegado Federal no Estado do Rio de Janeiro, sendo certo, no entanto, que nunca sofreu qualquer processo criminal ou administrativo em relação a esses fatos.

E sob esse argumento, após a informação prestada pelo Chefe do Departamento de Polícia Federal no sentido de que não se vislumbrou localizar procedimento administrativo disciplinar em desfavor do servidor Delegado de Policia Federal Mauricio Teles Barbosa (fls. 58/59), a douta Juíza condutora do feito concedeu, em parte, a antecipação dos efeitos da tutela, determinando a expedição de mandado de intimação à Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro para que, no prazo de 72 horas, fosse retirado de seu site, ou outro qualquer que disponha, o trecho do discurso da Deputada Estadual Cidinha Campos indicado na inicial, o que foi mantido no AI nº 0022892-15.2011.8.19.0000, da minha Relatoria.

Sobreveio a sentença que, confirmando os efeitos da tutela, julgou parcialmente procedentes os pedidos, por entender a douta Julgadora que não seria possível impor a condenação de obrigação de fazer a empresa GOOGLE, uma vez que esta não é parte no presente feito.

É esta a controvérsia sobre a qual gira a demanda.

Apesar do pedido inicial, como já destacado, estar direcionado tão-somente a obrigação de fazer, as questões passam a ser examinadas sob duas óticas. A primeira se refere à imunidade parlamentar da Deputada Estadual no exercício do seu mandato; a segunda, relacionada à divulgação no sítio eletrônico da ALERJ que reproduz o discurso por ela proferido na Tribuna daquela Casa Legislativa.

As imunidades parlamentares - material (art. 53, caput) e a formal (art. 53, §§ 2º, 3º, 4º e 5º) -, são, a bem da verdade, prerrogativas e vedações constitucionais prevista pela Carta Magna aos membros do Poder Legislativo. São garantias de existência e independência do próprio Parlamento.

São, por certo, prerrogativas concedidas aos parlamentares para o exercício de sua atividade com a mais ampla liberdade de manifestação, por meio de palavras, discussão, debate e voto.

Logo, "Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos" (art. 53, caput, CF).

Gozam os Parlamentares, portanto, de inviolabilidade quanto às opiniões, palavras e votos proferidos no exercício do mandato.

Trata-se de cláusula de irresponsabilidade funcional do congressista, que não pode ser processado judicial ou disciplinarmente pelos votos que emitiu ou pelas palavras que pronunciou no Parlamento ou em uma das suas comissões.

De fato, por ser a imunidade material vinculada ao próprio Poder, os efeitos da inviolabilidade atingem os atos aparentemente ilícitos de natureza penal e civil, garantindo, com isto, a plena liberdade de atuação do parlamentar.

A imunidade material, portanto, descaracteriza a ilicitude e impede que o parlamentar responda, civil ou criminalmente, por eventual lesão moral.

No RE 576.074AgR/RJ, o Ministro LUIZ FUX, faz ver que "o âmbito de abrangência da cláusula constitucional de imunidade parlamentar material, prevista no art. 53 da Constituição, tem sido construído por esta Corte à luz de dois parâmetros de aplicação. Quando em causa atos praticados no recinto do Parlamento, a referida imunidade assume contornos absolutos, de modo que a manifestação assim proferida não é capaz de dar lugar a qualquer tipo de responsabilidade civil ou penal, cabendo à própria Casa Legislativa promover a apuração, interna corporis, de eventual ato incompatível com o decoro parlamentar. De outro lado, quando manifestada a opinião em local distinto, o reconhecimento da imunidade se submete a uma condicionante, qual seja, a presença de um nexo de causalidade entre o ato e o exercício da função parlamentar".

Ora, uma vez que a manifestação danosa alegada foi proferida pela Deputada Estadual nas dependências da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, desnecessário se mostra indagar sobre a presença de vínculo entre o conteúdo do ato praticado e a função pública parlamentar exercida, pois o fato está também acobertado pelo mesmo manto da inviolabilidade, de maneira absoluta.

Para esses pronunciamentos feitos no interior das Casas Legislativas, caberá a própria Casa a que pertencer o parlamentar coibir eventuais excessos no desempenho dessa prerrogativa.

Por outro lado, à divulgação no sítio eletrônico da ALERJ do discurso proferido da Tribuna pela Deputada Estadual, que se restringe a resumir e comentar a manifestação feita da tribuna pela parlamentar no exercício de seu mandato, consistindo, por isso, em mera extensão da imunidade material, tal fato abarcado também se encontra pela mesma inviolabilidade material.

E nessa linha construtiva, não se pode colocar em dúvida que os destaques dados pela parlamentar não foram além do exercício do seu mandato, cuja opinião é inviolável, como já aqui apregoado, nos limites da legalidade objetiva (art. 29, VIII, da Constituição Federal).

Assim, caracterizada a pertinência com o mandato e o interesse de determinada parcela do funcionalismo estadual quanto ao assunto abordado na opinião do Parlamentar no exercício de seu mandato, não há como prosperar o pedido direcionado a obrigação de fazer, nos termos em que foi requerido.

À vista do exposto, a Câmara dá provimento ao recurso para julgar improcedente o pedido, com a inversão do ônus da sucumbência.

Rio de Janeiro, 02 de outubro de 2012.

Desembargador MALDONADO DE CARVALHO

Relator