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STF

Teoria do domínio do fato: Cargo de chefia não presume conhecimento de delito

Precedente da 2ª turma trancou ação penal contra ex-presidente de petroquímica.

Da Redação

terça-feira, 6 de dezembro de 2016

Atualizado às 16:46

Ao analisar HC de Álvaro Fernandes da Cunha Filho, ex-presidente da OPP Petroquímica (empresa do grupo Odebrecht que deu origem à Braskem), a 2ª turma do STF fixou importante precedente com relação à teoria do domínio do fato, a partir do voto do ministro Toffoli.

O MPF o denunciou por evasão de divisas com outros dois dirigentes desta e outra petroquímica, em valores que somam 1% do capital. No entender da acusação, reforçada pela subprocuradora-Geral da República Claudia Sampaio Marques, "o MPF quando apresenta uma denúncia diz: eu vou provar que fulano cometeu tal crime. A lei penal diz indícios de autoria".

"Foi uma grande operação de risco envolvendo duas petroquímicas cujo valor superava 1% do capital. A quem se pode atribuir a prática desse crime se não aos gestores da empresa? Quando diz que o paciente tem o domínio do fato, está dizendo que ele ordenou. O fato de não ter assinado os documentos não é possível para trancamento da ação penal."

Diferenciação de responsabilidades

O relator do HC, ministro Toffoli, rejeitou no voto a denúncia, considerando-a inepta. S. Exa. detalhou aspectos da teoria do domínio do fato (muito discutida no julgamento da famigerada AP 470, o mensalão) e refutou o argumento do parquet de que "não seria crível" que o então presidente da petroquímica não soubesse dos atos, embora não tenha assinado e/ou participado de reuniões descritas na peça acusatória do MPF.

De acordo com Toffoli, o estatuto da empresa previa a divisão de competência com as diretorias, ao passo que a denúncia faz descrição de condutas de outros réus.

Para o relator, a inexigibilidade de individualização, na denúncia, das condutas dos dirigentes da pessoa jurídica pressupõe a indiferenciação das responsabilidades, no estatuto ou no contrato social, dos membros do conselho de administração ou dos diretores da companhia, ou dos sócios ou gerentes da sociedade por quotas de responsabilidade limitada. Assim, "quando se afigurar possível a diferenciação de responsabilidades, a denúncia não poderá se lastrear genericamente na condição de dirigente ou sócio da empresa".

"Todos nós presidíamos tribunais. Tínhamos condições de saber todos os contratos de licitação? O PGR sabe tudo? São competências distribuídas. A denúncia apenas e tão somente imputa "concurso para o crime" por ser à época dos fatos presidente da OPP."

O relator concluiu que, nesse contexto de divisão de competência no estatuto entre os diretores, o que permite a individualização de responsabilidades, elencar a teoria do domínio do fato apenas por ser o presidente da empresa não se sustenta.

"Essas alçadas são normais em instituições. Imaginar que o diretor financeiro não tinha alçada de 1%?! É crível que um diretor financeiro não tenha alçada de 1%? Não houve reunião acima da diretoria financeira."

Toffoli demonstrou preocupação com a aplicação da teoria do domínio do fato de forma indiscriminada, sem critério, causando a responsabilização genérica.

"Não haveria nenhum óbice, no caso concreto, a que a denúncia invocasse a teoria do domínio do fato para validamente lastrear a imputação penal deduzida contra o paciente, desde que apontasse indícios convergentes no sentido de que ele não somente teve conhecimento da prática do crime de evasão de divisas, como também dirigiu finalisticamente a atividade dos demais acusados. Não basta invocar que o paciente se encontrava numa posição hierarquicamente superior para se presumir tivesse ele dominado toda a realização delituosa, com plenos poderes para decidir sobre a prática do crime de evasão de divisas, sua interrupção e suas circunstâncias."

Segundo Toffoli, nada impede que, diante de outros elementos probatórios, nova denúncia seja feita. A decisão pelo trancamento da ação penal foi unânime, com os votos dos ministros Teori, Lewandowski e Celso de Mello.

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