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Jornalista Diogo Mainardi interpela Lula

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Da Redação

sexta-feira, 7 de julho de 2006

Atualizado às 08:30

 

Mainardi X Lula

 

Polêmico, Diogo Mainardi pede explicações a S. Exa.

  • Dos Fatos

Vamos aos fatos, pois contra eles não há argumentos.

 

A polêmica de Lula com jornalistas não é nova... remember Larry Rohter, do NYT.

 

Com Diogo Mainardi só é diferente pois Lula não pode, por força constitucional, desterrar um brasileiro. Vontade não lhe deve faltar.

 

Ao que parece, a animosidade é recíproca. O espetaculoso colunista Mainardi vem dizendo, repetidamente, que quer derrubar Lula.

 

E a homérica tentativa ganhou mais um capítulo.

 

.......

 

Tudo começou no dia 17 de maio último. A revista Veja (ed. 1.956) trouxe na parte superior da capa uma chamada com o literalmente bombástico teor :

"Daniel Dantas, o banqueiro-bomba. O seu arsenal tem até número de suposta conta de Lula no exterior".

No miolo do hebdomadário, uma entrevista de Daniel Dantas concedida ao jornalista Márcio Aith. E, depois, ainda na mesma edição, a coluna assinada por Diogo Mainardi aproveitando tópicos da entrevista para soltar suas já conhecidas farpas. Abaixo algumas :

 

Coluna de Diogo Mainardi

"Lendo com cuidado, dá para ver o instante exato em que o Brasil acabou"

Daniel Dantas não fala. Para quem não fala, até que ele falou muito. O suficiente para mandar um monte de gente para a forca. Em primeiro lugar, Lula e seus ministros.

Passei quatro horas no escritório de Daniel Dantas, no Rio. No fim, arranquei dele meia hora de entrevista. Vale sobretudo como registro histórico. Lendo com cuidado, dá para ver o instante exato em que o Brasil acabou.

O PT PEDIU PROPINA AO OPPORTUNITY?

O que houve foi uma sugestão de que, se déssemos uma quantia expressiva ao partido, eles poderiam nos ajudar a resolver as dificuldades que estávamos tendo com o governo.

ENTÃO FOI PIOR DO QUE PROPINA: FOI EXTORSÃO. QUEM PEDIU O DINHEIRO?

Delúbio Soares.

QUAL A QUANTIA?

Entre 40 e 50 milhões de dólares. Era a necessidade de recursos que eles tinham. E Delúbio queria saber se poderíamos ajudá-los.

A QUEM FOI FEITO O PEDIDO?

A Carlos Rodenburg, que na época (julho de 2003) trabalhava conosco.

VOCÊ PAGOU OS 50 MILHÕES DE DÓLARES?

Perguntei ao meu advogado, Nélio Machado, se o pagamento seria ilegal ou não. Ele respondeu que isso é tipificado no artigo 316 do Código Penal, e que não estaríamos incorrendo em crime algum.

ESSE FOI O PRIMEIRO PEDIDO DE DINHEIRO DO PT AO OPPORTUNITY?

Durante a campanha presidencial de 2002, Ivan Guimarães foi ao nosso escritório e entregou um kit do partido ao Carlos Rodenburg, com o objetivo de conseguir algum apoio financeiro. Rodenburg mandou devolver o kit, porque não sabia quem era Ivan Guimarães. Isso foi interpretado pelo PT como um ato hostil, mas nós éramos politicamente neutros e não tínhamos nada contra o partido.

Agora releia a entrevista. Mas sabendo o seguinte: Daniel Dantas cedeu aos achacadores petistas. Ele e muitos outros.


  • Do Pedido

Como já se esperava, a matéria caiu como uma bomba no Palácio do Planalto. Mas Lula "atipicamente" estava viajando. De fato, estava em Viena, na Áustria. E lá concedeu entrevista aos jornalistas brasileiros. Ao ser perguntado sobre a edição da revista da Abril, teria - após coçar a barba - declarado :

"Não sei se o jornalista que escreve uma matéria daquelas tem a dignidade de dizer que é jornalista. Poderia dizer que é bandido, mau caráter, malfeitor, mentiroso".

Diogo Mainardi e o jornalista Márcio Aith assinam as matérias que provocaram a reação irada de Lula. São, portanto, os responsáveis : Aith na entrevista, e Mainardi na farpa.

 

Diante das declarações, de que o jornalista (?) "é bandido, mau caráter, malfeitor, mentiroso", Mainardi quis saber quem Lula teria honrado com a vienense referência presidencial : se ele, Mainardi, ou o colega de redação, Aith.

 

Na peça prepatória para uma futura ação personalíssima - de fato, outro não é o objetivo deste procedimento judicial - o jornalista resolveu interpelar Lula, dando-lhe, assim, condições para, até mesmo, explicar-se. Mainardi teve como patrono no feito o escritório Lourival J. Santos - Advogados.

 

Proposta a ação, no dia 14 de junho o ministro Gilmar Mendes determinou a notificação de Lula, para que prestasse, querendo, no prazo de quarenta e oito horas a partir do recebimento da notificação, as explicações que julgar cabíveis.

 

Do Direito

 

Lula, por meio do advogado-geral da União, prestou informações. E, em verdade, não deu explicação alguma, dizendo ainda que seria descabida a interpelação.

 

S. Exa. argumentou que Diogo Mainardi, em seu pedido, afirmou ser apenas participante da matéria jornalística, junto com outro colega, e não se afirmou ofendido. Para Lula, por meio da AGU, o sentimento de ofensa "é uma exigência legal expressa para a definição clara da sua legitimidade processual cuja falta recomenda o pronto indeferimento do pedido."

 

Cumprido o procedimento, o ministro Gilmar Mendes arquivou a Interpelação Judicial (PET 3668 - v. abaixo).

 

Em seu despacho, Mendes lembrou que não cabe ao STF, no rito da Interpelação, avaliar o conteúdo das explicações oferecidas. Portanto, após as explicações prestadas pelo advogado-geral da União em nome de S. Exa., Gilmar Mendes determinou o arquivamento da ação.

"Determino a entrega dos autos ao requerente [Diogo Mainardi], independentemente de traslado, declarando extinto o presente feito, em virtude do exaurimento de sua finalidade."

________

 

Veja abaixo a íntegra decisão do Ministro Gilmar Mendes.

PETIÇÃO 3.668-9 DISTRITO FEDERAL

RELATOR : MIN. GILMAR MENDES

REQUERENTE(S) : DIOGO BRISO MAINARDI

ADVOGADO(A/S) : LOURIVAL JOSÉ DOS SANTOS E OUTRO(A/S)

REQUERIDO(A/S) : LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA

DECISÃO: Trata-se de pedido de explicações formulado por Diogo Briso Mainardi, com o objetivo de que o Excelentíssimo Senhor Presidente da República ofereça esclarecimentos quanto a afirmações que teria feito em entrevista concedida a jornalistas brasileiros na cidade de Viena, em viagem oficial à Áustria, as quais foram amplamente divulgadas na imprensa.

Afirma-se que a presente interpelação é medida cautelar preparatória de ação criminal, tendo por fundamento o art. 144 do Código Penal e o art. 25 da Lei no 5.250/67 (fl. 3). A par da consideração de que o pronunciamento do Presidente da República teria caráter ofensivo e potencialmente caracterizador de crime contra a honra, aponta-se o caráter dúbio das afirmações.

O Requerente formula o seguinte pedido:

"Assim, (...) requer seja o Exmo. Sr. Presidente da República compelido a explicar a que jornalista da revista Veja, especificamente, se referiu quando declarou que 'não sei se o jornalista que escreve uma matéria daquelas tem a dignidade de dizer que é jornalista. Poderia dizer que é bandido, mau-caráter, malfeitor, mentiroso', posto que da matéria participaram o Requerente e o jornalista Marcio Aith". (fl. 8)

Efetuada a notificação, foi encaminhada resposta pelo Requerido (fls. 35-36), representado pelo Advogado-Geral da União, afirmando descabida a providência reclamada, propondo o seu arquivamento sem outra consideração. Eis o fundamentação:

"Apesar do notificante dizendo-se tão-só participante da matéria jornalística e não se afirmar ofendido - o que é uma exigência legal expressa para a definição clara de sua legitimidade processual cuja falta recomenda o pronto indeferimento do pedido -, vale registrar que o ora Notificado, consoante, aliás, reconhece o próprio requerente, referiu-se apenas à matéria noticiada que lhe provocou indignação, a ela dirigindo seus comentários.

(...)

Esse quadro mostra-se por si só evidente, pois o ora Notificante tanto não se afirma ofendido como não se afirma autor da matéria, referindo a petição trazida ao Supremo Tribunal Federal, e muito ligeiramente, apenas que"da matéria participaram o Requerente e o jornalista Márcio Aith".

Registre-se que o pedido de explicações, nos termos do art. 144 do Código Penal, é cabível sempre que houver dúvidas e ambigüidades em relação à referência, alusão ou frase, das quais é possível inferir calúnia, difamação ou injúria.

No caso dos autos, o Requerente deixou expressa a sua qualificação como parte legítima para o pedido de explicações, assentando que:

"Com efeito, ainda que Sua Excelência não tenha identificado o jornalista que pretendia inculcar com as sérias acusações assacadas, ficou claro tratar-se de articulista da revista Veja, a quem o chefe da nação acusou de escrever, com certa freqüência, artigos críticos contra si e seu governo. Este fato qualifica o Requerente, responsável por coluna jornalística semanal publicada na revista Veja, como parte legítima para propor esta medida, que visa o justo esclarecimento da identidade da pessoa acusada.

Ademais, pelo estilo jornalístico do Requerente e de seus artigos críticos sobre a política nacional, e também pelo fato de ter participado da matéria comentada por Sua Excelência, é juridicamente justificável a propositura desse procedimento." (fl. 06-07)

A doutrina é uníssona em afirmar que o pedido de explicações constitui procedimento prévio destinado a aparelhar eventual ajuizamento de ação penal, nos casos de delitos contra a honra (TUCCI, Rogério Lauria. Pedido de explicações. In: Revista dos Tribunais, ano 69, vol. 538, p. 297, ago/1980). Conforme ensinamentos de Heleno Fragoso:

"Freqüentemente a ofensa é feita de forma equívoca e duvidosa, a fim de que possa o agente praticá-la com maior segurança, certo de que atingirá o alvo. É maneira covarde de ofender a honra alheia, e que assume diversas formas. Ora o fato é imputado de forma dubitativa, ora se dá da pessoa visada apenas algumas características, ora, enfim, empregam-se palavras de duplo sentido, que podem expressar a ofensa." (Lições de Direito Penal. Parte Especial. São Paulo : Editora Forense, 1995, v. 1, p. 146).

O cabimento do pedido de explicações ocorre, portanto, quando se verifica a necessidade de esclarecer situações, frases ou expressões, escritas ou verbais, caracterizadas por dubiedade, equivocidade ou ambigüidade. Nos termos da jurisprudência desta Corte "se ausentes estes pressupostos, a interpelação judicial, porque desnecessária, revela-se processualmente inadmissível" (STF-PET nº 851-1, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 16.09.94)

Por fim, registre-se que não cabe a esta Corte, no rito da interpelação, avaliar o conteúdo das explicações oferecidas. Mesmo na hipótese de o requerido recusar-se a atender o pedido de explicações, não pode o juiz constrangê-lo a prestá-las, uma vez que feita a notificação, com ou sem resposta, está exaurida a tarefa judicial (STF - HC nº60.953/RS, 1ª Turma, Rel. Min. Rafael Mayer, DJ 09.09.83).

Assim sendo, determino a entrega dos autos ao requerente, independentemente de traslado, declarando extinto o presente feito, em virtude do exaurimento de sua finalidade.

Publique-se.

Brasília, 30 de junho de 2006.

Ministro GILMAR MENDES

Relator


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