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Constitucional

STF: É válida resolução do CNMP que disciplina interceptações telefônicas no âmbito do MP

Para maioria dos ministros, Conselho não extrapolou competência ao editar a norma, como afirmava a PGR no pedido.

Da Redação

quarta-feira, 25 de abril de 2018

Atualizado às 18:30

O plenário do STF decidiu, nesta quarta-feira, 25, que é constitucional a resolução 36/09, do CNMP, que disciplina os pedidos e utilização das interceptações telefônicas no âmbito do MP.

Por apertada maioria, 6 a 5, a Corte julgou, nos termos do voto do relator, ministro Barroso, improcedente o pedido formulado pela PGR, para a qual o Conselho extrapolou competência ao editar a norma.

Seguiram o relator os ministros Fachin, Rosa, Fux, Celso e Cármen. Para os ministros, a resolução não afronta a legislação que regulamenta as interceptações (lei 9.296/96), bem como não transgride qualquer limite constitucional, mas apenas busca uniformizar procedimentos.

Ficaram vencidos em parte Moraes, Toffoli, Lewandowski e Gilmar, e vencido o ministro Marco Aurélio.

O pedido

A resolução do CNMP estabelece, entre outras regras, a obrigatoriedade de que o membro do MP responsável pela investigação criminal ou instrução penal comunique mensalmente à corregedoria-Geral, em caráter sigiloso, dados relativos a interceptações telefônicas em andamento, bem como aquelas iniciadas e terminadas no período.

Autora da ação, a PGR argumentou que, ao editar a resolução, o CNMP agiu além de sua competência constitucional de regulamentar, tanto com invasão da autonomia funcional dos membros do MP como por ter inovado o ordenamento jurídico. Alegou, por fim, que não se pode equiparar o ato administrativo à lei em sentido formal.

Voto do relator

Para o relator, ministro Luís Roberto Barroso, é válido o dispositivo questionado. Ele destacou que, "se o CNMP tem competência para punir o membro do MP que se comporte de maneira desconforme com a normatização adequada, o CNMP, evidentemente, tem também a competência para definir, em abstrato, qual é o comportamento exigido".

No entendimento do ministro, a resolução estabelece regras triviais para a preservação do sigilo, "que é evidentemente um dos deveres funcionais do MP com relação à quebra de sigilo telefônico ou telemático", e não cria requisitos formais de validade para a interceptação - mas apenas normas administrativas que vão nortear a conduta do MP nesses casos.

"Ao contrário do alegado, os arts. 2º e 4º da resolução não criam novos requisitos formais de validade. A consequência para eventual inobservância dos preceitos do ato impugnado não é a nulidade das interceptações telefônicas, já que sequer se extrai essa cominação na norma em questão, mas sim eventual procedimento administrativo disciplinar, por se tratar de previsões ligadas ao dever funcional de sigilo e a eficiência da atuação ministerial.

Por outro lado, os art. 5º e 9º da resolução não violam a independência funcional dos membros do parquet. O primeiro dispositivo não interfere na livre convicção ministerial sobre a necessidade de requerer ou não a prorrogação da interceptação; simplesmente dispõe que, ao se pedir a continuidade da medida, deve-se instruir o requerimento de prorrogação com a mídia - CD ou DVD - que contenha o inteiro teor do áudio das comunicações interceptadas, com a indicação dos trechos relevantes à apreciação do pedido de prorrogação."

Ele reiterou que a resolução não trata de imposição de uma linha de atuação ministerial, o que poderia violar a independência funcional, mas apenas uma padronização formal mínima dos pedidos de prorrogação; destacou, ainda, que a existência de um grau mínimo de padronização atende os princípios da eficiência "e é altamente conveniente para a continuidade das investigações".

Assim, votou por conhecer da ação, rejeitando as questões preliminares e, no mérito, julgou improcedente, declarando a constitucionalidade da resolução. Acompanharam o relator os ministros Fachin, Rosa, Fux, Celso de Mello e Cármen Lúcia.

Divergência

Moraes divergiu parcialmente do relator. Para ele há, sim, pontos de inconstitucionalidade na resolução do CNMP. O ministro afirmou que, assim como o CNJ não pode editar normas processuais e mesmo procedimentais da atuação do juiz, o CNMP não pode editar resoluções para estabelecer normas processuais ou procedimentais de atuação finalística dos membros do MP.

Para Moraes, há, na resolução, normas que "extrapolaram totalmente não só o poder normativo do CNMP, mas a própria ideia de editar normas para sua atuação".

"O que fez o CNMP foi alterar o próprio conteúdo da lei 9.296. Ou seja, legislou em matéria processual. E, ao assim legislar, houve flagrante desrespeito não só ao art. 130 A da CF, porque foge das funções do CNMP, mas, mais grave: houve desrespeito à clausula de reserva legal exigida para que se afaste uma inviolabilidade prevista no art. 5º."

O ministro votou pela inconstitucionalidade dos seguintes dispositivos: § 2º do art. 4º; art. 5º; art. 6º; art. 9º; e, ainda, que seja dada interpretação conforme ao § 3º do art. 8º. Ele explicou ponto a ponto o que considera inconstitucional. Veja abaixo.

O art. 5º define que seja encaminhado à corregedoria a íntegra do áudio indicando trechos relevantes das conversas com relatório circunstanciado, o que invade, na visão do ministro, a competência do Congresso. "A lei 9.296 traz as hipóteses e a forma. Não há previsão de requisito para renovação exigindo que se apresente os áudios, inteiro teor. Há apenas necessidade de fundamentação do pedido pelo juiz." A norma, portanto, fere, na visão de Moraes, não só a independência funcional dos membros do MP, mas também a reserva legal que o art. 5º, inciso XII, estabelece: "na forma e hipóteses previstas em lei".

Já o caput do art. 6º diz que o membro do MP deverá acompanhar o procedimento de interceptação. Mais uma vez, Moraes aponta que a lei não exige isso - mas apenas que se dê ciência ao membro do MP, para que, se quiser, acompanhe. O ministro observou que sequer há membro do MP em todos os municípios do país. Ainda que o não cumprimento do critério não acarrete nulidade do processo, como frisou Barroso, Moraes acredita que a norma impõe pressão para que o membro do MP, quando receber a prova, entenda que não é válida para a instrução penal e oferecimento da denúncia. O parágrafo único do mesmo artigo, para o ministro, cria obrigação à autoridade policial. A norma diz que, nos inquéritos policiais em que houver quebra de sigilo de comunicações, necessariamente o membro do MP deverá manter o controle sobre o prazo para sua conclusão, devendo requisitar da autoridade policial responsável a remessa imediata dos autos ao juízo competente.

Quanto ao § 3º do art. 8º, segundo o qual é defeso ao membro do MP realizar interceptações telefônicas ou quebrar o segredo de justiça sem autorização judicial, sob pena de responsabilidade criminal, Moraes entendeu que a regra autoriza que o membro do MP ou o próprio servidor da instituição, com autorização judicial, ele mesmo realize a operação - e a lei não autoriza isso. A lei estabelece que quem realiza é autoridade policial, e o MP será apenas cientificado. Neste ponto, o ministro sugere interpretação conforme, "porque obviamente que é defeso realizar sem autorização judicial, mas nos termos da lei".

Por fim, destacou que o § 2º, do art. 4º, e o art. 9º também acabam possibilitando essa opção, "que, certa ou errada, não foi a opção legislativa". Para ele, ambos são inconstitucionais.

Moraes foi acompanhado por Toffoli, Lewandowski e Gilmar. Marco Aurélio, por sua vez, divergiu totalmente do relator: para ele, deveria ser dado provimento total ao pedido da PGR. Os ministros, no entanto, ficaram vencidos.

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