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Penal

Conselho de Política Criminal retoma votação sobre uso de contêineres para presos com covid-19

Entidades, ex-ministros da Justiça e ex-presidentes do CNPC se manifestaram contra a medida, destacando ser lamentável que o Estado cogite soluções como esta.

Da Redação

segunda-feira, 4 de maio de 2020

Atualizado às 11:07

Nesta terça-feira, 5, o CNPC - Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária irá retomar votação para decidir se presos com covid-19 ou pertencente do grupo de risco podem ser alojados em containers.

A medida foi encaminhada ao conselho pelo Depen - Departamento Penitenciário Nacional, órgão vinculado ao Ministério da Justiça, propondo que fosse analisada a possibilidade de permitir a utilização de estruturas modulares temporárias, como contêineres utilizados no setor da construção civil, para separar presos em flagrante de outros detentos durante a pandemia. Os presos isolados seriam aqueles que apresentassem sintomas da doença e que precisassem de atendimento médico.

A proposta foi encaminhada após a confirmação de morte por covid-19 em presídio brasileiro. Em nota, o Depen explicou como seria a implantação da medida de separação:

"As estruturas provisórias poderiam ser similares a dos hospitais de campanha, com pré-moldados, barracas de campanha e até mesmo na forma de containers habitacionais climatizados, muito utilizados há vários anos na construção civil."

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Críticas

A sugestão foi alvo de manifestação contrária de diversas entidades e órgãos. Entre eles estão a Defensoria Pública da União e de diversos Estados, o IBCCRIM - Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, o IDDD - Instituto de Defesa do Direito de Defesa e a Comissão de Política Criminal e Penitenciária da OAB/SP.

Segundo as entidades, os contêineres ou celas modulares não proporcionam ventilação adequada, água corrente acessível em tempo integral e a delimitação de distância mínima de um ou dois metros entre os custodiados.

Também foi observado que "diante dos anos de repúdio ao sistema dos contêineres, permitir a flexibilização, seria entendimento contraditório ao solidificado no Conselho".

Além disso, as entidades apontam que no último ciclo de Revisão Periódica Universal do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, em 2017, diversos países fizeram recomendações ao Brasil, a fim de que diminuísse a população carcerária, eliminasse a tortura e tratamento degradante e melhorasse as condições das pessoas presas.

No entanto, a promessa não está sendo colocada em prática: "Ao revés, a proposta existente traz o cumprimento de pena de forma humilhante e degradante. Ainda mais grave, nesse sentido, é a proposta de encarceramento em contêineres de pessoas insertas no grupo de risco aumentado para a infecção, doentes e idosos".

Em nota, ex-ministros de Estado da Justiça e ex-presidentes do Conselho Nacional de Política Criminar e Penitenciária manifestaram indignação com a proposta do Depen: "É lamentável que o Estado brasileiro cogite soluções dessa índole".

As autoridades afirmam, ainda, que "as existentes e conhecidas carências e deficiências históricas do sistema penitenciário nacional não podem ser aprofundadas sob qualquer pretexto".

Confira a nota na íntegra:

Os ex-ministros de Estado da Justiça e os ex-presidentes do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), abaixo subscritores, receberam com surpresa e perplexidade a informação divulgada pelo Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN), em 20 de abril de 2020, da sugestão encaminhada ao colegiado do CNPCP com a finalidade de permitir a utilização de "estruturas modulares temporárias", leia-se "containers", para o alojamento de pessoas presas que apresentem sintomas da COVID-19 e necessitem de atendimento médico.

De acordo com a notícia veiculada pela Agência Brasil, "as estruturas provisórias poderiam ser similares às dos hospitais de campanha, com pré-moldados, barracas de campanha e até mesmo na forma de containers habitacionais climatizados, muito utilizados há vários anos na construção civil". Tal recomendação ainda carece de deliberação do CNPCP, em face do pedido coletivo de vista solicitada em sua última reunião.

É lamentável que o Estado brasileiro cogite soluções dessa índole. Vale lembrar que no ano de 2009, o mesmo CNPCP, dessa vez fazendo valer seu compromisso institucional e legal, insurgiu-se contra calamitoso "estado de coisas" existente, à época, no Espírito Santo. Naquela oportunidade, descobriu-se a submissão e aprisionamento prolongado de pessoas detidas, adultos e adolescentes, em containers, alcunhados de autênticos "microondas". A repercussão da gravíssima e intolerável situação redundou na imediata mobilização da sociedade e no oferecimento de denúncias contra o Brasil em organismos internacionais, tais como a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e a Organização das Nações Unidas (ONU).

No difícil momento de pandemia, responsável por afetar a vida de todos os brasileiros, é fundamental que as autoridades constituídas reafirmem sua postura de respeito aos ditames do Estado Democrático de Direito e ao princípio universal de dignidade da pessoa humana, fundamento da República Federativa do Brasil. Nada pode justificar o tratamento de indivíduos em condições subumanas e de precariedade em níveis medievais.

As existentes e conhecidas carências e deficiências históricas do sistema penitenciário nacional não podem ser aprofundadas sob qualquer pretexto. Se a vulnerabilidade dos presos brasileiros se apresenta ainda mais sensível em decorrência da pandemia, o próprio Conselho Nacional de Justiça, mediante Recomendação nº 62/2020, já ali estabeleceu as medidas adequadas a serem implementadas no ambiente carcerário, como a identificação dos grupos de risco e a priorização do cumprimento de pena fora das unidades.

Publicamente, portanto, os subscritores manifestam e declaram que outra solução não há ao CNPCP que não a recusa e o veto imediato e peremptório na adoção de quaisquer medidas dessa natureza.

30 de abril de 2020.

Eugênio Aragão, ex-ministro da Justiça

José Carlos Dias, ex-ministro da Justiça

José Eduardo Cardozo, ex-ministro da Justiça

Miguel Reale Júnior, ex-ministro da Justiça

Tarso Genro, ex-ministro da Justiça

Torquato Jardim, ex-ministro da Justiça

Alamiro Velludo Salvador Netto, ex-presidente do CNPCP/MJ

Antonio Claudio Mariz de Oliveira, ex-presidente do CNPCP/MJ

Eduardo Muylaert, ex-presidente do CNPCP/MJ

Eduardo Pizarro Carnelós, ex-presidente do CNPCP/MJ

Geder Gomes, ex-presidente do CNPCP/MJ

Luiz Bressani, ex-presidente do CNPCP/MJ

René Ariel Dotti, ex-presidente do CNPCP/MJ

Sérgio Salomão Shecaira, ex-presidente do CNPCP/MJ

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