MIGALHAS QUENTES

  1. Home >
  2. Quentes >
  3. Histórico: STF limita internação de adolescentes em unidades socioeducativas
HC

Histórico: STF limita internação de adolescentes em unidades socioeducativas

Julgamento também prevê a criação de um Observatório Judicial para acompanhar os dados de lotação das unidades.

Da Redação

segunda-feira, 24 de agosto de 2020

Atualizado às 18:35

A 2ª turma do STF concedeu ordem em HC para limitar a internação de adolescentes infratores à exata capacidade da respectiva unidade socioeducativa. O julgamento virtual foi finalizado na última sexta-feira, 21, e foi liderado pelo voto do relator, ministro Edson Fachin.

O colegiado atendeu a pedido da Defensoria Pública do ES. Após a impetração, pleitearam a extensão as Defensorias dos Estados da BA, CE, PE e RJ, buscando, igualmente, a ordem para corrigir a superlotação nos respectivos Estados.

O HC contou ainda com a participação de entidades da sociedade civil (OAB/RJ, Conectas, Alana, IBCCRIM e Movimento Nacional de Direitos Humanos).

Vale recordar que também é da 2ª turma outro precedente relevante na mesma seara: em fevereiro de 2018, a partir do voto condutor do ministro Lewandowski, o colegiado garantiu prisão domiciliar a gestantes e mães de crianças que estejam em prisão provisória, em atenção à dignidade humana e prioridade absoluta das crianças.

Condição peculiar

t

O relator do habeas, ministro Edson Fachin, anotou no voto que, no âmbito da execução das medidas socioeducativas, "o respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento se traduz nos princípios brevidade e excepcionalidade da medida de internação". 

"Os sujeitos inimputáveis pelo critério etário detêm o direito subjetivo de tratamento condizente com o conjunto de regras e princípios que lhe é pertinente e específico, e de não receber tratamento igual ou pior ao conferido a adultos em situação equivalente."

Citando diversos estudos, incluindo do CNJ, CNMP e da Corte Interamericana, Fachin ressaltou a necessidade de se fixar parâmetros e critérios racionais a fim de assegurar a observância dos direitos fundamentais de adolescentes infratores.

"Deve-se, pois, atentar para uma atuação do Poder Judiciário que garanta a dignidade aos internados mediante atuação que coíba toda forma análoga a tratamento cruel ou degradante. Exsurge, por conseguinte, viável e necessária a atuação jurisdicional reparadora, sem ofensa ao inarredável postulado da separação dos poderes."

Prioridade absoluta

Com um tópico dedicado à proteção normativa dos adolescentes em processo de ressocialização, o voto de S. Exa. afirmou que o postulado constitucional da prioridade absoluta da criança e do adolescente deve nortear o processo pedagógico de ressocialização.

"As políticas públicas direcionadas aos adolescentes, aqui incluídos os internados, devem contemplar medidas que garantam os direitos assegurados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, nomeadamente o direito à vida, à saúde, à liberdade, ao respeito, à dignidade, à convivência familiar e comunitária, à educação, à cultura, ao esporte e ao lazer, à profissionalização e à proteção no trabalho."

Dessa forma, prosseguiu o relator, a medida socioeducativa, principalmente a privação de liberdade, deve ser aplicada somente quando for imprescindível, nos exatos limites da lei e pelo menor tempo possível.

"Verifica-se, com efeito, que a ausência de rigidez nos prazos e no escalonamento nas passagens das medidas socioeducativas mais rígidas e severas àquelas mais brandas visa a fomentar a evolução adequada e responsável no plano individual pelo adolescente, de modo a serem admitidos periódicos pedidos de reavaliação nesses casos."

t

Após a análise da situação concreta, com a citação dos dados estatísticos que revelam taxa média de ocupação nacional de 99% nas unidades de internação do país, Edson Fachin consignou não ser viável que o Supremo, "em tema tão sensível, alusivo à dignidade dos adolescentes internados, venha a chancelar a superlotação nas unidades destinadas ao cumprimento de medidas socioeducativas".

"A limitação do ingresso de adolescentes nas Unidades de Internação em patamar superior à capacidade de vagas projetadas, além de cessar as possíveis violações, previne a afronta aos preceitos normativos que asseguram a proteção integral, densificando as garantias dispostas no artigo 227 da Constituição Federal (com redação dada pela Emenda Constitucional nº. 65/2010), além de fortalecer o postulado de respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento."

Assim, o relator concedeu a ordem no HC para determinar que as unidades de execução de medida socioeducativa de internação de adolescentes não ultrapassem a capacidade projetada de internação prevista para cada unidade, nos termos da impetração e extensões.

Observatório Judicial

Por fim, S. Exa. ainda propôs no voto a criação de um Observatório Judicial sobre o cumprimento das internações socioeducativas na forma de comissão temporária, a ser designada pelo presidente do STF, para acompanhar os efeitos da deliberação no julgado, especialmente em relação aos dados estatísticos sobre o cumprimento das medidas estabelecidas e o percentual de lotação das unidades de internação.

Os ministros Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Cármen Lúcia acompanharam o voto do relator, tornando a decisão unânime. 

Em seu voto, ministro Lewandowski destacou que "a institucionalização deve ser, sempre, sujeita à mais estrita excepcionalidade, não devendo ser admitida em situações nas quais a dignidade dos adolescentes seja desrespeitada, como em unidades superlotadas".

S. Exa. sugere ainda que, no cumprimento da ordem, os juízos responsáveis atentem para a idade do adolescente internado, priorizando-se a rápida colocação em meio aberto dos adolescentes mais jovens:

"Os menores com idade entre 12 e 13 anos, segundo o Comitê de Direitos da Criança, nem sequer deveriam estar sujeitos à possibilidade de responsabilização infracional pela via da internação, e são os que mais sofrem com a institucionalização precoce - que, como visto, tem desconsiderado suas necessidades físicas e psicológicas, bem como emocionais e educacionais - e com a estigmatização que inevitavelmente decorre da internação, estando frequentemente internados por atos infracionais de menor importância, praticados pela primeira vez. (...)

A responsabilização não pode, em nenhuma hipótese, confundir-se com criminalização ou institucionalização de pessoas muito jovens e ainda em formação de sua personalidade."

Por sua vez, ministro Gilmar Mendes anotou no voto:

"O Estado deve respeitar um padrão mínimo de dignidade no cumprimento das medidas socioeducativas de internação determinadas. Precisamos, como sociedade, entender que ao tratarmos os internados de modo desumano, abusivo e agressivo, corrompem-se claramente os objetivos de ressocialização que orientam o sistema. Ou seja, ao invés de reduzir o cometimento de novos fatos graves, amplia-se o ciclo de violência e seletividade, que só acarretará mais criminalidade à sociedade."

Ministro ainda destacou que a proposta de criação do observatório para supervisionar a implementação das medidas "é pioneira e louvável".

Ministro Celso de Mello não votou por afastamento decorrente de licença médica.

Patrocínio

Patrocínio

FREDERICO SOUZA HALABI HORTA MACIEL SOCIEDADE INDIVIDUAL DE ADVOCACIA

FREDERICO SOUZA HALABI HORTA MACIEL SOCIEDADE INDIVIDUAL DE ADVOCACIA

TORRES & SILVA SOCIEDADE DE ADVOGADOS LTDA
TORRES & SILVA SOCIEDADE DE ADVOGADOS LTDA

TORRES & SILVA SOCIEDADE DE ADVOGADOS LTDA