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Desagravo

Diálogo de juiz com ofensa a advogado vaza em sentença por engano

A conversa com a assessora continha termos que ofendiam o advogado, sua constituinte e comprometiam o julgamento.

Da Redação

sexta-feira, 16 de abril de 2021

Atualizado em 23 de abril de 2021 08:13

Em uma sentença de divórcio litigioso, constou diálogo transcrito em seis páginas entre o juiz e sua assessora contendo termos que ofendiam o advogado atuante, sua constituinte e comprometiam o julgamento do feito.

O Conselho Pleno da OAB/SC aprovou por aclamação que a seccional faça uma representação junto à Corregedoria-Geral de Justiça, bem como a realização de Desagravo Público diante da gravidade da conduta do juiz.

 (Imagem: Freepik)

(Imagem: Freepik)

"E se fosse o contrário?"

O advogado relatou sobre o caso contextualizando os fatos e preservando o segredo de justiça. Ele explicou que tentou ligar para o gabinete para alertar da decisão, mas ninguém atendeu e a decisão foi disponibilizada com aquela conversa transcrita.

"Assim, acionei a Comissão de Prerrogativas de Joinville para pensarmos o que iríamos fazer. Para nossa surpresa, ao longo da semana a decisão foi excluída do processo que eu já havia sido intimado e a situação só se agravou."

O advogado contou que pediu à assessoria do juiz uma retratação e 5 minutos depois o magistrado me ligou e pediu desculpas no privado.

"Então solicitei que o mesmo se retratasse nos autos. Eu o questionei: 'E se fosse o contrário? Se tivesse vazado uma conversa minha com uma assessora do meu escritório em que eu estivesse falando qualquer coisa para desmerecer seu trabalho. Como o senhor reagiria?'."

O advogado contou que no final da conversa o juiz deu a entender que iria se declarar suspeito nos autos, visto que antecipou o julgamento.

"Mas não foi o que aconteceu: ele teve a audácia de proferir a nova sentença e ainda formalizar exatamente o que havia antecipado em sua conversa via WhatsApp com sua assessora."

Ação imediata

Para o presidente da seccional, Rafael Horn, o diálogo transcrito indevidamente na sentença representa ofensa a todos os jurisdicionados e à advocacia, principalmente pela ausência de uma desculpa pública após o magistrado estar ciente do equívoco cometido.

"Toda vez que um advogado tiver uma prerrogativa violada em Santa Catarina, nós não podemos nos calar. Nós não podemos nos omitir. Nós precisamos mostrar que respeitamos todas as autoridades e exigimos reciprocidade em face de todos aqueles que integram o Sistema de Justiça."

O pedido proposto pela presidente da subseção de Joinville, Maria de Lourdes Zimath, relatou que no dia 07 de abril a subseção - assim que tomou conhecimento dos fatos - oficiou ao juiz para que prestasse esclarecimentos a fim de apurar os fatos.

No entanto, somente nesta quinta-feira, 15, o juiz respondeu ao ofício admitindo, por equívoco, que a conversa com a assessora foi parar nos autos, porém não teceu nenhum comentário sobre o conteúdo das alegações, nem mesmo um pedido formal de desculpas.

"Erros não deveriam ser cometidos. Mas se ocorrem, a atitude após o erro tem de ser valorizada. Infelizmente, mesmo sendo instado a se manifestar sobre o ocorrido, a resposta que eu tive no final da tarde de ontem foi insuficiente! O magistrado deveria ter se desculpado publicamente e se retratado, porém, nada disso houve."

Defesa das Prerrogativas

O vice-presidente da seccional, Maurício Voos, colocou-se à disposição para representar a Seccional em todas as medidas e instâncias necessárias.

"Em razão da gravidade dos fatos precisamos levantar essa bandeira para que essa situação jamais ocorra, pois um processo como esse talvez seja o processo da vida das pessoas e não podemos permitir que seja alvo de piadinhas, deboche e descaso, não só com o advogado, mas com todas as pessoas envolvidas."

Relatora do processo, a presidente da Comissão de Prerrogativas, conselheira estadual Caroline Rasmussen, justificou que o deferimento do desagravo público para o caso está previsto no art. 7º, XVII, do Estatuto da Advocacia.

"É inaceitável o tratamento dirigido ao advogado. Aqui se trata de manter o dever de urbanidade a ser dispensado aos advogados no exercício da sua nobre missão que é administrar a justiça, nos termos do art. 133 da Constituição da República. Imprescindível que a OAB/SC, por meio de órgão máximo, responda o ato com a veemência e a urgência que se impõe. Se o infeliz acontecimento não for imediatamente repudiado, a classe profissional restará desvalorizada como um todo."

Informações: OAB/SC.

Confira alguns dos trechos da conversa divulgados pelo portal nd+:

[18:55, 25/03/2021] Assessora: Eu tenho raiva dela já kkk ela e esse advogado só incomodam

[18:56, 25/03/2021] Juiz: Mas antes um novo ofício do que ouvir o cara para explicar um contrato de trabalho

[18:56, 25/03/2021] Assessora: Exatamenteeeee

[18:56, 25/03/2021] Juiz: Ademais a oitiva pode ser suprida pelo ir dele caso permaneça dúvida

[18:57, 25/03/2021] Juiz: Ela adoraria pegar o ir der

[18:57, 25/03/2021] Juiz: Dele

[18:57, 25/03/2021] Assessora: Ela pediu a quebra de sigilo bancário dele

[18:57, 25/03/2021] Assessora: Foi indeferido

[18:57, 25/03/2021] Juiz: Advogado quer chupar o cara até o caroço

[18:57, 25/03/2021] Assessora: Ela diz que ele oculta dinheiro

18:58, 25/03/2021] Assessora: Esse processo me persegue desde o dia que começamos nessa vara hahahah

[18:58, 25/03/2021] Assessora: Acho que a primeira ligação de atendi foi deles

[18:58, 25/03/2021] Juiz: Então vamos acabar com ele logo

***

[19:43, 25/03/2021] Juiz: O carro está em nome da empresa

[19:43, 25/03/2021] Assessora: Eu não lembro direito o que exatamente ela alegou

[19:39, 25/03/2021] Juiz: Isso ela já deve apresentar na inicial sob pena de violação ao princípio da correlação

[19:39, 25/03/2021] Assessora: Eu já nem lembrava. Mas tem esses danos aí tbm

[19:41, 25/03/2021] Juiz: Dano? Pelo que?

[19:41, 25/03/2021] Assessora: Lembra? Ela diz que ele deu pra ela e tals e que é dela kkk

[19:41, 25/03/2021] Juiz: Móveis com testemunha? Pode esquecer

[19:41, 25/03/2021] Assessora: O carro

[19:42, 25/03/2021] Juiz: O carro sim

[19:42, 25/03/2021] Assessora: Sim. Isso não

[19:42, 25/03/2021] Juiz: Digo o dano moral e material

[19:42, 25/03/2021] Assessora: Ahhhh ela sofreu muito

[19:42, 25/03/2021] Assessora: Kkkkk

[19:42, 25/03/2021] Juiz: O documento do carro está em nome da firma, certo?

[19:42, 25/03/2021] Assessora: Ele foi horrível com ela

[19:42, 25/03/2021] Assessora: Ela

[19:42, 25/03/2021] Juiz: A gente também

[19:42, 25/03/2021] Juiz: Com a gente também

[19:42, 25/03/2021] Assessora: Hahahha siiiiim. Merecíamos indenização

***

[19:47, 25/03/2021] Assessora: 50 salários mínimos ela quer

[19:48, 25/03/2021] Assessora: Os danos materiais tem a ver com o fato de ela ter cancelado a Unimed dela pra ficar só na dele e agora se lascar sem Plano de saúde

[19:48, 25/03/2021] Assessora: Não pra confiar nesses maridos

***

[19:54, 25/03/2021] Assessora: Aiiii

[19:54, 25/03/2021] Assessora: Esse processo é o oh

[19:55, 25/03/2021] Assessora: Dr., se você não resolver ele nessa audiência. Não sei quem fará essa sentença kkkk

[19:55, 25/03/2021] Juiz: Se esse é o ponto controvertido atual, acho que podemos julgar.

[19:55, 25/03/2021] Assessora: Você precisa fazer essa aÍ pelo bem geral da nação

***

[20:16, 25/03/2021] Juiz: Fatos narrados (mesmo que reconhecidos como ocorridos) são inerentes a um processo de separação litigioso sem que com isso se transmude para ato ilícito e seu resultado em dano moral

[20:16, 25/03/2021] Juiz: São aborrecimentos

[20:16, 25/03/2021] Juiz: Separação é triste

[20:16, 25/03/2021] Juiz: Casamento é feliz

[20:17, 25/03/2021] Juiz: E vice-versa!

[20:17, 25/03/2021] Juiz: É a vida

[20:17, 25/03/2021] Juiz: Não foi espancada

[20:17, 25/03/2021] Juiz: Não foi estuprada

[20:17, 25/03/2021] Juiz: Não foi morta

[20:17, 25/03/2021] Juiz: Não foi esfaqueada?

[20:17, 25/03/2021] Assessora: Hahahhahah

[20:18, 25/03/2021] Juiz: Então foi um casamento normal

[20:18, 25/03/2021] Juiz: Sofreu psicologicamente?

[20:18, 25/03/2021] Assessora: Vou salvar e fazer um quadro pra colocar no gabinete com essas conclusões

[20:18, 25/03/2021] Assessora:

[20:18, 25/03/2021] Assessora: [SOBRENOME], [NOME DO JUIZ]. 25/3

[20:19, 25/03/2021] Assessora: Kkkk

[20:19, 25/03/2021] Juiz: Todos passam por isso por conta da natureza do evento em si sem que isso configure

ato ilícito e dano moral ressarcivel

[20:19, 25/03/2021] Juiz: Bota no fundo da sala de aud

***

[20:50, 25/03/2021] Juiz: Só cuida quando julgar para não usar termos como "não provou"

[20:51, 25/03/2021] Juiz: Se precisar diga que os documentos levam à conclusão..

[20:51, 25/03/2021] Juiz: ..contrária à tese apontada

[20:52, 25/03/2021] Juiz: Já que vamos julgar antecipadamente precisa cuidar com esses termos ou destacar que a prova documental é essencial para dirimir tal ponto controvertido

[20:52, 25/03/2021] Juiz: Sempre fugindo de uma brecha atinente à necessidade ou possibilidade de uma prova oral para auxiliar na conclusão

[20:53, 25/03/2021] Juiz: Pois aí um recurso de cerceamento ganha espaço

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