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Solicitação de dados

Para especialistas, STF acertou ao validar pedido de dados ao exterior

Em importante decisão, STF possibilitou que autoridades nacionais solicitarem dados diretamente a provedores de internet com sede no exterior.

Da Redação

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2023

Atualizado em 24 de fevereiro de 2023 08:28

Nesta quinta-feira, 23, o STF julgou constitucional a possibilidade de autoridades nacionais solicitarem dados diretamente a provedores de internet estrangeiros com sede ou representação no Brasil sem, necessariamente, seguir o procedimento do acordo celebrado entre o Brasil e os Estados Unidos.

Para especialistas em Direito Digital, a decisão da Suprema Corte foi acertada.

 (Imagem: Freepik)

Autoridades nacionais podem requisitar dados diretamente a provedores no exterior.(Imagem: Freepik)

A advogada Patricia Peck, sócia do Peck Advogados, ressaltou que a internet desafia as fronteiras territoriais entre os países e é considerada um território internacional na sua essência. Logo, para a advogada, com os avanços da transformação digital, se intensificou a necessidade de obtenção de alguma prova que não está necessariamente nos limites da localização geográfica de um ordenamento jurídico.

"Por isso, o sistema de MLATs acabou se tornando um mecanismo para obtenção de dados que estão fora do alcance de uma jurisdição. No entanto, apesar de ser uma opção viável para uso pelas Autoridades, tem certas restrições, o pedido pode ou não ser concedido, e sua tramitação é considerada demorada. Ou seja, continuamos com o desafio de atender os casos graves e de maior urgência."

Para Peck, a decisão traz uma reflexão importante que é da importância de se manter as opções, ou seja de ter a possibilidade de que as Autoridades brasileiras tenham alternativas, entre elas, também poder acionar diretamente provedores com sede no exterior.

"Como efeito, se por um lado pode permitir agir mais rapido em casos especificos, também aumenta o risco deste atendimento à ordem da Autoridade Brasileira poder gerar um conflito entre as legislações das partes, que é algo que o MLAT foi feito para mitigar."

O advogado Luiz Augusto Filizzola D'Urso, do escritório D'Urso e Borges Advogados Associados, ressaltou que para a internet não há fronteiras, e por óbvio há uma enorme dificuldade das autoridades em investigar e combater ilícitos e irregularidades cometidas pela internet, principalmente quando são oriundas de países estrangeiros.

"Por isso entendo acertada a decisão do Supremo, pois dá mais autonomia para autoridades, que quando justificarem essa solicitação, por óbvio, poderão receber de empresas estrangeiras e provedores estrangeiros dados importantes na investigação ou no combate a ilícitos e irregularidades que se perpetuam na internet."

Segundo D'Urso, por falta de jurisdição muitas empresas não têm obrigação de enviar esses dados, até em alguns casos, nem a decisão judicial pode obrigar determinadas empresas, a depender do país em que ela se encontra.

"Mas se sonha, se exige, se procura e se busca uma colaboração internacional para que se melhore a experiência na utilização da internet e que se combata com mais eficiência os ilícitos na rede. Essa decisão do STF vai de encontro a essa premissa de que a internet precisa melhorar e que quando nós temos uma grande quantidade de impunidade acontecendo em razão de ilícitos cometidos porque esses autores estão fora do país, você busca alternativas para solucionar esse problema. E esta é uma das soluções que o Supremo enxerga na tentativa de melhorar esse cenário."

O advogado Fabrício da Mota Alves, sócio do Serur Advogados, destacou que embora o MLAT seja constitucional, não é o único instrumento de obtenção de informações para instrução pessoal de investigações penais e outros tipos de procedimentos.

"Como bem destacou o relator, Min. Gilmar Mendes, o próprio Marco Civil da Internet previu mecanismo legal próprio para fundamentar decisões judiciais de requisição de dados pessoais e outras informações, ainda que a empresa não esteja localizada em território nacional. É importante destacar que o próprio MCI é uma norma de alcance extraterritorial, e seu artigo 11, citado pelo relator, foi inserido no processo legislativo de maneira a compatibilizar esse alcance com os interesses da Justiça e da sociedade brasileiras."

Segundo Fabrício, o efeito prático dessa decisão não deve ser relevante, embora encerre uma controvérsia persistente provocada principalmente por empresas de tecnologia multinacionais, porque a jurisprudência brasileira, em todas as jurisdições, tem sido uníssona quando a legalidade e a constitucionalidade das decisões judiciais de requisição de dados e informações a empresas estrangeiras com representante no Brasil.

"Ao menos agora, esse tipo de argumento de baixa ou nenhuma adesão pelo Judiciário tende a se encerrar de vez, reduzindo os obstáculos impostos para se evitar cumprir ordens judiciais legítimas."

Segundo Alexandre Atheniense, advogado especialista em Direito Digital, a decisão é de grande relevância e de forma acertada.

"Quem faz uso de medidas judiciais que acabam tendo como desdobramento a necessidade de acionar provedor estrangeiro sabe como é difícil, pra não dizer que é inoperável, extrair uma carta rogatória para essa finalidade. Os problemas que acontecem nas plataformas digitais demandam soluções e medidas eficientes e rápidas. No momento em que se torna dispensável a carta rogatória pra cumprir uma ordem judicial emanada de uma autoridade nacional, isso faz com que a efetividade do processo seja alcançada e os resultados para punir os infratores também."

Para Atheniense, a decisão do Supremo vai no sentido de promover a celeridade processual e, sobretudo, a efetividade para o cumprimento de decisões que até então se tornavam inexequíveis em razão do tempo que se leva e o custo operacional. "Além de toda metodologia ultrapassada em termos de expedição de carta rogatória para uma finalidade tão pontual, tão rápida, que pode ser prestadas informações por parte dos provedores estrangeiros", ressaltou.

O advogado Alexandre Zavaglia Coelho, do CEPI-FGV Direito de SP, ressaltou que, sem entrar nas discussões sobre a legitimidade e se o caso seria ou não constitucional, ou seja, de competência do STF, a decisão do relator segue o Marco Civil da Internet e a Convenção de Budapeste.

"A decisão segue o Marco Civil da Internet e a Convenção de Budapeste no sentido de que se houve qualquer ato de tratamento de dados no Brasil e empresa estrangeira opera por aqui, mesmo que sem uma representação local, há o dever de prestar informações, especialmente para garantir a preservação e a produção de provas. Importante compreender que isso não se confunde com a responsabilidade do provedor sobre o conteúdo, mas sobre o seu dever de prestar informações."

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