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Dever de sigilo

STJ tranca ação penal de mulher acusada de aborto pelo próprio médico

O colegiado concluiu que o médico se mostra como confidente necessário, estando proibido de revelar segredo de que tem conhecimento em razão da profissão.

Da Redação

terça-feira, 14 de março de 2023

Atualizado em 15 de março de 2023 11:24

Nesta terça-feira, 14, a 6ª turma do STJ trancou ação penal que apurava crime de aborto provocado pela própria gestante. O colegiado, por unanimidade, concluiu pela nulidade das provas do processo, uma vez que elas foram fornecidas pelo médico que atendeu a acusada, o qual é proibido de revelar segredo que tem conhecimento em razão de sua profissão.

De acordo com o processo, a paciente teria aproximadamente 16 semanas de gravidez quando passou mal e procurou o hospital. Durante o atendimento, o médico suspeitou que o quadro fosse provocado pela ingestão de remédio abortivo e, por isso, decidiu acionar a Polícia Militar.

Após a instauração do inquérito, o médico ainda teria encaminhado à autoridade policial o prontuário da paciente para comprovação de suas afirmações, além de ter sido arrolado como testemunha. Com base nessas informações, o Ministério Público propôs a ação penal e, após a primeira fase do procedimento do tribunal do júri, a mulher foi pronunciada pelo crime do artigo 124 do CP

No pedido de habeas corpus, além de sustentar a tese de quebra de sigilo profissional pelo médico, a defesa apontou suposta incompatibilidade entre a criminalização do aborto provocado e os princípios constitucionais, requerendo a declaração de não recepção, pela Constituição de 1988, do artigo 124 do CP. 

 (Imagem: Freepik)

6ª turma do STJ tranca ação penal de mulher acusada de aborto pelo próprio médico.(Imagem: Freepik)

Ao votar, o ministro Sebastião Reis, relator do caso, destacou que segundo o art. 207 do CPP, são proibidas de depor as pessoas que, em razão de função, ministério, ofício ou profissão, devam guardar segredo, salvo se, desobrigadas pela parte interessada, quiserem dar o seu testemunho.

S. Exa. destacou, ainda, que o médico que atendeu a paciente se encaixa na referida proibição, uma vez que se mostra como confidente necessário, estando proibido de revelar segredo de que tem conhecimento em razão da profissão, bem como de depor sobre o fato como testemunha.

Assim, em seu entendimento, a instauração do inquérito policial decorreu de provocação por parte do próprio médico, que, além de ter sido indevidamente arrolado como testemunha, encaminhou o prontuário médico da paciente para a comprovação das afirmações. "Encontra-se contaminada a ação penal pelos elementos de informação coletados de forma ilícita, sendo, portanto, nulos", asseverou.

Nesse sentido, concedeu o HC para trancar a ação penal. No mais, determinou que os autos sejam encaminhados ao Conselho Regional de Medicina, bem como ao MP local para que seja tomada das medidas cabíveis quanto à conduta do médico que atendeu a paciente e realizou a notícia crime.

O colegiado, por unanimidade, acompanhou o entendimento.

Crítica

Ao final do julgamento, ministros criticaram a condução do Judiciário sobre o caso. "Só pondero que, aqui, todos erraram, né?", disse Rogerio Schietti, ao apontar que, além do médico, erraram MP e juiz, que permitiram o depoimento do profissional. Sebastião Reis endossou a fala, e destacou que o próprio Judiciário, que reclama da quantidade de processos, se alimenta desses processos, "reiterando erros". 

Leia o voto do relator. 

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