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AP 2.694

Moraes e Zanin votam para condenar réus do núcleo 4 da trama golpista

1ª turma do STF analisa ação penal contra sete réus acusados de promover desinformação.

Da Redação

terça-feira, 21 de outubro de 2025

Atualizado às 16:25

A 1ª turma do STF retomou na manhã desta terça-feira, 21, o julgamento da AP 2.694referente ao chamado "núcleo 4" da tentativa de golpe de Estado.

Até o momento, o relator, ministro Alexandre de Moraes, votou pela condenação de seis réus pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. São eles:  Ailton Barros, Ângelo Denicoli, Giancarlo Rodrigues, Guilherme Almeida, Marcelo Bormevet e Reginaldo Abreu, 

Em relação ao sétimo acusado, Carlos César Rocha, o relator votou pela condenação apenas pelos crimes de organização criminosa armada e tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, absolvendo-o das demais imputações por falta de provas.

Moraes também propôs o envio de cópias do processo para apuração da conduta do presidente do PL, Valdemar da Costa Neto.

Ministro Cristiano Zanin também proferiu voto, acompanhando integralmente o relator.

Veja a conclusão do voto:

Veja o placar:

O julgamento será retomado às 14h.

Além desta terça-feira, está prevista sessão de julgamento do caso para a quarta-feira, 22, das 9h às 12h.

Réus e acusações

Os réus do núcleo 4 são: 

  • Ailton Moraes Barros (ex-major do Exército);
  • Ângelo Denicoli (major da reserva do Exército);
  • Carlos Cesar Moretzsohn Rocha (presidente do Instituto Voto Legal);
  • Giancarlo Rodrigues (subtenente do Exército);
  • Guilherme Almeida (tenente-coronel do Exército);
  • Marcelo Bormevet (agente da PF);
  • Reginaldo Abreu (coronel do Exército);

Segundo a denúncia, eles teriam atuado na divulgação de informações falsas sobre a segurança das urnas eletrônicas e em ataques a instituições e autoridades.

Todos respondem pelos crimes de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, participação em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.


Voto do relator


Preliminares

Ao abrir o voto, ministro Alexandre de Moraes destacou que as principais questões preliminares já haviam sido enfrentadas no recebimento da denúncia e no julgamento do "núcleo 1" (AP 2.668). Com a materialidade já firmada, portanto, o foco recai na autoria e na participação de cada acusado.

As defesas suscitaram, entre outros pontos, incompetência do STF, violação ao juiz natural, cerceamento de defesa, inobservância de prerrogativas da Defensoria Pública, nulidade por inovação estrutural, prova ilícita por derivação e violação da cadeia de custódia.

O relator rejeitou todas as preliminares. Destacou que a maioria dos argumentos fora afastada em decisões pretéritas, sem fatos novos capazes de alterar a compreensão firmada.

Sobre cerceamento de defesa, lembrou que incumbe à defesa assegurar a presença de suas testemunhas; no caso mencionado (oitiva do ministro do TCU Jorge Oliveira), a participação por videoconferência foi facultada, não havendo interesse manifestado pela testemunha.

Quanto ao pedido de ouvir réu em processo conexo, registrou que o depoimento já consta como prova emprestada e que o acusado não é obrigado a testemunhar.

Afastou, ainda, alegações de prova ilícita e de violação ao princípio da congruência - sem prejuízo de determinar o desentranhamento de um documento mencionado pela PGR nas alegações finais e não juntado aos autos, providência que não contamina o processo.

Por fim, quanto ao prazo em dobro para a Defensoria, consignou que o rito da lei 8.038/90 não contempla o benefício e não houve prejuízo, pois as defesas apresentaram alegações finais no prazo regular. 

Mérito

No mérito, Moraes situou a causa no contexto da organização criminosa armada já reconhecida pela 1ª turma no julgamento do "núcleo crucial" (AP 2.668).

Segundo o relator, as imputações da PGR distribuem-se por núcleos distintos, porém interligados, voltados à tentativa de golpe de Estado.

Na AP 2.668, por maioria, a turma reconheceu a existência de uma organização criminosa com atuação estável e permanente, que se valeu de estruturas do Estado para permanecer no poder de forma ilícita e, na sequência, impedir a posse do governo legitimamente eleito.

O colegiado também reconheceu a prática de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado ao patrimônio público e deterioração de patrimônio tombado.

A liderança dessa organização, afirmou, foi exercida pelo ex-presidente Jair Messias Bolsonaro (já condenado na ação anterior), com apoio de integrantes do alto escalão do governo e de membros das Forças Armadas. O Núcleo 4, ora julgado na AP 2.694, teria atuado em momentos específicos da execução delitiva.

A turma identificou 13 atos executórios (meados de 2021 a 8/1/23). Os réus desta ação teriam integrado cinco deles, associados ao núcleo de desinformação, entre os quais:

  • Uso de órgãos públicos para monitorar adversários e atacar o Poder Judiciário e a Justiça Eleitoral (participação de Ângelo Denicoli, Marcelo Bormevet e Giancarlo Rodrigues);
  • Utilização indevida da estrutura das Forças Armadas em relatórios sobre o sistema eletrônico de votação (Reginaldo Abreu);
  • Produção e difusão de live em 4/11/22 questionando a integridade das eleições (Ângelo Denicoli, Carlos César Rocha e Guilherme Almeida);
  • Elaboração e apresentação de minuta de golpe a comandantes das Forças Armadas (Ailton Barros);
  • Preparação de "gabinete de crise" a ser instalado após a consumação do golpe (Reginaldo Abreu).

Segundo o relator, as provas indicam que os réus compuseram o setor dedicado à disseminação coordenada de desinformação, com uso de redes e aplicativos para difundir conteúdo falso e orquestrar ataques às instituições - modus operandi das chamadas "milícias digitais".  O objetivo: desacreditar o processo eleitoral, corroer a confiança pública e manter o grupo no poder mesmo diante de resultado desfavorável.

Trata-se, disse, de "novo populismo digital extremista", que não se confunde com liberdade de expressão, mas com condutas típicas previstas no CP.

A desinformação organizada foi instrumento de agressão ao Estado Democrático de Direito, inclusive com técnicas de persuasão militar direcionadas a públicos específicos.

Ailton Moraes Barros: minuta e pressão sobre comandantes

Moraes atribuiu a Ailton Moraes Barros dois eixos de atuação:

  • participação na minuta de golpe e sua apresentação a comandantes das Forças Armadas; e
  • pressão pública, por meio de ataques virtuais, sobre o comandante do Exército e o comandante da Aeronáutica.

A seguinte cronologia foi destacada:

  • 6/12/22: reunião em que teria sido apresentada versão inicial da minuta ao então presidente da República; o tema teria sido levado a encontros com os comandantes.
  • 14/12/22: nova reunião convocada pelo então ministro da Defesa com os três comandantes; Exército e Aeronáutica não aderem. Segundo o relator, inicia-se estratégia de coação pública direcionada a comandantes e familiares.
  • 15/12/22: mensagens atribuídas a Walter Braga Netto orientariam Barros a intensificar ataques ao comandante da Aeronáutica e elogiar o então comandante da Marinha.
  • 19/12/22: postagem conclamando a "imediata consumação" do plano.

Mensagens apreendidas indicam interlocução entre núcleos por meio de Mauro Cid, apontado como ponto de contato.

Para o relator, os elementos demonstram adesão consciente de Barros à estrutura criminosa, com ataques virtuais para coagir a cúpula militar - materialidade comprovada e autoria evidenciada.

Ângelo Denicoli: estrutura paralela e desinformação sobre urnas

Segundo Moraes, Ângelo Denicoli integrou o núcleo de desinformação, participando da montagem de estrutura paralela de inteligência e da produção de conteúdos sobre supostas vulnerabilidades das urnas.

Sob liderança de Jair Bolsonaro, teria havido coordenação entre Augusto Heleno (GSI) e Alexandre Ramagem (ABIN) para usar órgãos de Estado no monitoramento de adversários e na difusão massiva de material que deslegitimasse o sistema eletrônico de votação.

Documentos, comunicações e testemunhos indicam, segundo Moraes, vínculo estável e contribuição técnica de Denicoli.

Giancarlo Rodrigues e Marcelo Bormevet: Abin paralela, monitoramento e desinformação

Analisados em conjunto, Giancarlo Gomes Rodrigues (subtenente do Exército cedido à ABIN) e Marcelo Araújo Bormevet (agente da PF) teriam atuado na chamada "ABIN paralela", estrutura clandestina voltada a interesses da organização criminosa.

Segundo o relator, por indicação do então diretor-geral Alexandre Ramagem, Bormevet compôs a célula e coordenou atividades com Giancarlo, seu subordinado.

Teriam sido usados, de forma irregular, sistemas como o First Mile, com dezenas de milhares de pesquisas na gestão Ramagem - inclusive sobre ministros do STF, parlamentares e membros do TSE.

Giancarlo teria realizado centenas de consultas com credenciais compartilhadas e alimentado perfis nas redes com informações falsas, sugerindo a criação de contas inautênticas para ampliar alcance. Em diálogos, menciona "continuar a jogar a sementinha do mal", relatando marcações constantes ao vereador Carlos Bolsonaro.

As investigações apontam tentativas de associar familiares e assessores de magistrados à empresa Positivo, fabricante das urnas, para criar falsa narrativa de favorecimento - padrão que Moraes qualifica como modus operandi das "milícias digitais".

Para o relator, as condutas revelam vínculo estável e consciente com a organização, em inteligência ilegal e campanhas de desinformação.

Guilherme Almeida: difusão de conteúdo sobre suposta fraude e estímulo a mobilizações

O relator afirmou que o tenente-coronel Guilherme Almeida, então no COTER, teria atuado na etapa pós-eleição do núcleo de desinformação.

Mensagens e arquivos indicam que, em 4/11/22, encaminhou a Mauro Cid o link da live de Fernando Cerimedo com a legenda "fraude comprovada, acabou para o Lula", difundiu a íntegra da transmissão e espelhou conteúdo em site hospedado em Portugal após a derrubada no Brasil.

Áudios de 4/11/22 atribuem a Almeida a tese de que modelos antigos de urnas favoreceriam um candidato e modelos novos, outro.  O voto registra envio massivo por listas e grupos (inclusive em ambientes militares), com inclusão no grupo "AMAN Todos", sinalizando direcionamento à base castrense.

Entre 4 e 6/11/22, o réu estimulou mobilizações, greves e bloqueios de rodovias como mecanismo de pressão, e afirma: "houve fraude sim, e não vamos aceitar o resultado".

Há referências a operações psicológicas e a menções equivocadas ao art. 142 da CF, interpretação já repudiada pelo STF.

Para o relator, o conjunto probatório demonstra alinhamento às ações descritas na denúncia, com uso de técnicas de influência para estimular mobilizações.

Reginaldo Vieira de Abreu: manipulação do relatório das Forças Armadas e gabinete de crise

Moraes atribui a Reginaldo Vieira de Abreu (coronel do Exército) a prática de dois atos executórios:

  • utilização indevida da estrutura das Forças Armadas no relatório de fiscalização do sistema eletrônico de votação (ministério da Defesa); e
  • preparação de "gabinete de crise" a ser instalado após a consumação do golpe.

No primeiro ponto, o réu teria propagado informações falsas e tentado postergar a divulgação de relatório já concluído logo após as eleições, em alinhamento ao então ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira (condenado) e a Jair Bolsonaro, visando manipular o conteúdo e, depois, desqualificá-lo publicamente.

Como chefe de gabinete do secretário-executivo general Mário Fernandes (réu), buscou alinhar conclusões das Forças Armadas às informações falsas difundidas por Fernando Cerimedo e Carlos César Rocha (live de 4/11/22, intermediada por Ângelo Denicoli).

Em mensagens, defende que o relatório deveria estar "no mínimo, alinhado com eles"conduta que o relator chamou de "lavagem da desinformação".

No segundo ponto, documentos intitulados "HD 2022" detalham a arquitetura de um gabinete institucional de crise com previsão para 16/12/22, mencionando expressamente Reginaldo na assessoria de inteligência.

O arquivo foi impresso no Palácio do Planalto por Mário Fernandes, e seis cópias foram impressas por Reginaldo, com registros técnicos que identificam usuário, data e hora.

Em interrogatório na AP 2.693, Mário Fernandes confirmou ter determinado a seu chefe de gabinete a emissão das cópias. No dia seguinte, visitou Jair Bolsonaro no Palácio da Alvorada.

Para o relator, provas documentais e técnicas evidenciam a autoria de Reginaldo nos crimes imputados.

Carlos César Rocha: laudo falso, desinformação e condenação parcial

Em relação a Carlos César Moretzsohn Rocha, presidente do IVL - Instituto Voto Legal, Moraes descreveu a falsificação de laudo que embasou a representação eleitoral do PL de 22/11/22, a qual pedia a anulação de metade das urnas (as fabricadas antes de 2020) - pedido classificado pelo relator como "uma das coisas mais bizarras que a Justiça Eleitoral já recebeu".

À época presidente do TSE, Moraes recordou que a legenda pretendia anular apenas votos do segundo turno, mantendo o primeiro (em que elegeu 99 deputados), o que levou ao reconhecimento de litigância de má-fé e à aplicação de multa de R$ 22,9 milhões, posteriormente mantida pelo Plenário.

Contratado pelo PL, o IVL subcontratou a empresa Gaio (Éder Lincei Magalhães Balbino).

Em 6 e 7/11/22, Lincei concluiu pela inexistência de fraudes; o mesmo atestou Tony Calé de França, do ITA. Apesar disso, Rocha ignorou os alertas e permitiu o vazamento de versão preliminar e apócrifa do relatório, sem assinatura e com dados inconsistentes, participando de coletiva do PL para reforçar a narrativa falsa - alinhada à live de Fernando Cerimedo (intermediação de Ângelo Denicoli) e à estratégia de Reginaldo Abreu.

Para o relator, Rocha buscou "lavar" desinformação com verniz técnico, atuando dolosa e conscientemente para tensionar a população contra a Justiça Eleitoral.

Testemunhos, como o de Éder Lincei e do secretário de TI do TSE, Júlio César Valente, corroboram que não havia indícios de fraude.

Assim, o relator concluiu que Rocha aderiu aos desígnios da organização criminosa e atentou contra o Estado Democrático de Direito. Contudo, à luz do in dubio pro reo, Moraes reconheceu dúvida razoável sobre o dolo quanto aos atos posteriores ligados ao golpe de Estado.

Nesse sentido, votou para condená-lo por organização criminosa e atentado ao Estado Democrático de Direito (art. 359-L), mas absolvê-lo dos crimes de golpe de Estado (art. 359-M), dano qualificado (art. 163) e deterioração de patrimônio tombado (art. 62, I).

Conclusão

Ao concluir, ministro Alexandre de Moraes afastou todas as preliminares e julgou procedente a ação penal quanto aos seguintes réus do Núcleo 4 - Ailton Gonçalves Moraes Barros, Ângelo Martins Denicoli, Giancarlo Gomes Rodrigues, Guilherme Marques de Almeida, Marcelo Araújo Bormevet e Reginaldo Vieira de Abreu - para condená-los pelos crimes de:

  • organização criminosa armada;
  • tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito;
  • golpe de Estado;
  • dano qualificado (violência e grave ameaça contra patrimônio da União e com considerável prejuízo à vítima); e
  • deterioração de patrimônio tombado.

Em relação a Carlos César Moretzsohn Rocha, presidente do Instituto Voto Legal, o relator julgou parcialmente procedente a ação penal para condená-lo por organização criminosa armada e tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito (art. 359-L do CP), e absolvê-lo, por ausência de provas, dos crimes de golpe de Estado (art. 359-M), dano qualificado (art. 163) e deterioração de patrimônio tombado (art. 62, I), à luz do in dubio pro reo quanto ao dolo nos atos posteriores.

Moraes ainda propôs, nos termos do art. 18 do CPP, a extração de cópias da descrição fática e do acervo probatório relativo a Carlos César Rocha, para remessa à PET 12.100, a fim de reabrir investigação sobre organização criminosa e tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito em relação ao presidente do PL, Valdemar da Costa Neto - caso prevaleça a maioria na 1ª turma.

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