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Supremo | Sessão

STF encerra sustentações orais em julgamento do marco temporal

Corte analisa quatro ações que contestam a lei 14.701/23.

Da Redação

quinta-feira, 11 de dezembro de 2025

Atualizado às 16:08

Nesta quinta-feira, 11, o STF encerrou a fase de sustentações orais no julgamento de quatro ações que questionam a constitucionalidade da lei 14.701/23, responsável por instituir a tese do marco temporal para a demarcação de terras indígenas.

A norma restringe a reivindicação de territórios indígenas às áreas ocupadas em 5 de outubro de 1988 - data da promulgação da CF - ou àquelas que, naquela ocasião, estavam submetidas a disputa judicial.

O julgamento foi suspenso para a reflexão dos ministros e será retomado oportunamente.

 (Imagem: Antonio Augusto/STF)

STF analisa lei que estabeleceu marco temporal de terras indígenas.(Imagem: Antonio Augusto/STF)

Entenda

As quatro ações discutem a validade da lei que estabeleceu o marco temporal e definiu novas regras para demarcação, uso e gestão de terras indígenas.

ADC 87, proposta por PL, PP e Republicanos, busca o reconhecimento da constitucionalidade integral da lei.

Para as legendas, a norma resulta de legítima deliberação do Congresso, e os vetos presidenciais posteriormente derrubados não revelam inconstitucionalidades, mas apenas divergências políticas. Por isso, pedem que o STF confirme a validade de todos os dispositivos.

Já a ADIn 7.582, ajuizada pela Apib, PSOL e Rede Sustentabilidade, sustenta que a lei representa o maior retrocesso aos direitos indígenas desde a redemocratização.

As entidades afirmam que o marco temporal e outras previsões legais violam a CF ao restringir direitos territoriais, desconsiderar o dever de consulta previsto na Convenção 169 da OIT, criar entraves indevidos ao processo de demarcação e ampliar riscos de violência e degradação ambiental.

ADIn 7.583, apresentada por PT, PCdoB e PV, também pede que a lei seja declarada inconstitucional.

Os partidos lembram que o próprio STF, ao julgar o Tema 1.031 da repercussão geral, afastou a tese do marco temporal como critério para definir ocupação tradicional indígena. Assim, argumentam que a nova lei afronta diretamente decisão vinculante da Corte.

Por fim, a ADIn 7.586, proposta pelo PDT, questiona diversos dispositivos da norma e afirma que a lei viola a CF de maneira frontal ao restabelecer o marco temporal e impor limites que dificultam ou inviabilizam demarcações.

O partido aponta ainda vícios formais e materiais, ofensa a tratados internacionais e risco de novos esbulhos e discriminações contra povos originários.

Amici curiae

Em nome do Estado de Santa Catarina, o procurador Marcelo Mendes defendeu a constitucionalidade da lei 14.701/23 e enfatizou a necessidade de soluções conciliadas e regionalizadas para os conflitos fundiários envolvendo terras indígenas.

Ele afirmou que a experiência catarinense demonstra a viabilidade de arranjos locais construídos em diálogo com a Funai e com as comunidades, citando iniciativas recentes do governo estadual em áreas indígenas.

Mendes também manifestou preocupação com o item 5 da tese firmada pelo STF no Tema 1.031, que prevê direito de regresso da União contra os Estados em casos de indenizações decorrentes de demarcações, argumentando que as titulações históricas foram realizadas conforme o entendimento vigente à época.

Ao final, pediu a procedência da ADC 87 e a revisão da responsabilização automática dos entes estaduais.

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Representando o PSOL, o advogado Bruno Aurélio Rodrigues da Silva Pena destacou a relevância da proteção aos povos indígenas, mas sustentou que a demarcação deve observar equilíbrio com direitos fundamentais, como a propriedade privada.

Ao citar o caso de Palmeira dos Índios/AL, afirmou que pequenos agricultores estariam sendo afetados por processos demarcatórios conduzidos sem participação adequada dos proprietários, o que geraria insegurança jurídica e preocupação social.

Em homenagem ao grupo de trabalho de autocomposição instituído no STF, pediu que a Corte consolide as redações consensuais durante as negociações conduzidas pelo ministro Gilmar Mendes, notadamente quanto aos arts. 7º e 18 da lei 14.701/23.

Defendeu, por fim, a constitucionalidade da norma e a garantia de contraditório pleno a proprietários de boa-fé nos procedimentos de demarcação.

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Pela Confederação Nacional de Municípios, o advogado Ricardo Hermany defendeu a homologação dos consensos alcançados no grupo de trabalho coordenado pelo ministro Gilmar Mendes, especialmente a inclusão dos municípios desde o início dos processos demarcatórios, o que garantiria transparência e segurança administrativa.

Ele ressaltou que a matéria exige equilíbrio entre direitos indígenas, proprietários de boa-fé e competências locais de planejamento urbano. Ao apresentar dados sobre educação, saúde e cultura em municípios com terras indígenas, destacou a sobrecarga financeira das gestões municipais e defendeu a continuidade das soluções consensuais construídas no âmbito do STF.

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Pelo Greenpeace, a advogada Angela Moura Barbarulho defendeu que os direitos territoriais indígenas têm natureza de cláusula pétrea e não podem ser restringidos por lei infraconstitucional, lembrando que o próprio STF já declarou inconstitucional o marco temporal no Tema 1.031.

Ao destacar estudos da ONU, FAO, IPCC e MapBiomas, ela afirmou que as terras indígenas são essenciais para conter o desmatamento, proteger a biodiversidade e regular o clima e os recursos hídricos.

Para a organização, a demarcação é dever jurídico do Estado e peça central das políticas ambientais previstas nos arts. 225 e 231 da CF.

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Falando pelo WWF Brasil, o advogado Júnior Nicácio Wapichana afirmou que a lei 14.701/23 afronta diretamente o entendimento firmado pelo STF ao reconhecer que os direitos territoriais indígenas são originários e, portanto, incompatíveis com qualquer marco temporal.

Em manifestação marcada pela defesa da centralidade do território para a sobrevivência física e cultural dos povos, ele lembrou que muitos grupos, inclusive em isolamento voluntário, desconhecem que suas vidas estão sendo julgadas.

Ressaltou ainda que precedentes como Raposa Serra do Sol não autorizam restrições generalizadas e que o Congresso não pode legislar de modo a limitar direitos fundamentais considerados cláusulas pétreas.

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Pelo Instituto Alana, a advogada Ayrumã Tuxá fez uma manifestação profundamente marcada pela experiência pessoal de deslocamento forçado, relatando que a inundação do território tradicional de seu povo na década de 1980 impediu que sua geração vivesse plenamente sua infância e identidade comunitária.

Defendeu que a lei 14.701/23 aprofunda danos históricos ao romper a continuidade territorial dos povos indígenas e viola direitos fundamentais já reconhecidos pelo STF no Tema 1.031.

Ao destacar os impactos da perda territorial sobre crianças e adolescentes - inclusive no bem-estar psicológico e na reprodução cultural das comunidades - sustentou que a proteção da infância é indissociável da preservação das terras indígenas.

Concluiu afirmando que a CF impõe ao Supremo o dever de resguardar minorias vulnerabilizadas e pediu o reconhecimento da inconstitucionalidade da norma por representar um retrocesso incompatível com os direitos originários.

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Pela Associação Civil Alternativa Terrazul, o advogado Adriano de Oliveira Silva, do povo tucano, ressaltou que as terras indígenas permanecem como as áreas mais preservadas do país e desempenham papel decisivo na regulação climática e na conservação ambiental.

Citando dados científicos e exemplos como o Parque do Xingu, afirmou que esses territórios garantem chuvas, estabilidade ecológica e proteção contra eventos extremos, ao mesmo tempo que enfrentam secas históricas, queimadas e invasões.

Para o advogado, a lei 14.701/23 - que chamou de "Lei do Genocídio" - representa grave retrocesso ao impor obstáculos burocráticos, reinstalar o marco temporal e paralisar demarcações, inclusive em áreas com povos isolados. 

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Em nome do Conectas Direitos Humanos, o advogado Gabriel de Carvalho Sampaio contestou a narrativa de que a lei 14.701/23 teria resultado de um verdadeiro diálogo institucional, afirmando que o processo legislativo excluiu a participação dos povos indígenas e se baseou em precedentes já superados pelo STF.

Para o Conectas, afastar o marco temporal é reafirmar o pacto constituinte de 1988, que reconheceu os direitos originários como cláusula pétrea e como resposta histórica às violências cometidas contra populações indígenas, negras e vulnerabilizadas.

O causídico criticou a resistência do Legislativo em observar a Convenção 169 da OIT e defendeu que qualquer construção normativa deve reconhecer o protagonismo dos povos afetados.

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Em nome do povo Xokleng, o advogado Rafael Modesto dos Santos sustentou que a lei 14.701/23 se apoia em uma leitura distorcida do caso Raposa Serra do Sol, lembrando que o precedente jamais aplicou o marco temporal e, ao contrário, afirmou a natureza originária e preexistente dos direitos territoriais indígenas.

Ele destacou que interpretações posteriores - inclusive a formulação do "renitente esbulho" - deformaram o sentido da decisão e foram definitivamente superadas pelo STF no Tema 1.031.

Ao afirmar que a demarcação não cria o direito, mas apenas delimita território cuja titularidade indígena é anterior ao próprio Estado, citou trechos do julgamento que reconhecem a prevalência desses direitos mesmo diante de títulos privados.

Criticou ainda a previsão de indenização e retenção sobre terras públicas, afirmando que a CF só admite reparação por ato ilícito do Estado, nunca pela terra nua.

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Pelo Conselho Indigenista Missionário, a advogada Paloma Gomes afirmou que a lei 14.701/23 se insere em um histórico de estratégias para dificultar a posse indígena e favorecer a apropriação privada de territórios tradicionais.

Relatou que a norma afasta critérios fixados pelo STF no Tema 1.031, ignora a boa-fé e alimenta expectativas de indenizações indevidas, estimulando conflitos e especulação.

Ao apresentar dados de invasões, violência e assassinatos, sustentou que a ausência de demarcação é fator determinante para a escalada de ataques contra povos indígenas e contra o patrimônio público.

Comparando a destruição dos territórios à imagem do STF após o 8 de janeiro, afirmou que os povos vivem diariamente a realidade de "terra arrasada".

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Em nome do Conselho Nacional de Direitos Humanos, a advogada Lara Estevão Lourenço afirmou que a lei 14.701/23 agravou um cenário já crítico de violações contra povos indígenas, ampliando a insegurança jurídica e favorecendo invasões, conflitos e violência.

Citando dados do CNDH e da Comissão Pastoral da Terra, ela destacou que indígenas foram, em 2024, as principais vítimas de disputas por terra, água e assassinatos no campo, fenômeno diretamente ligado à indefinição demarcatória.

Para a conselheira, ao reinstalar o marco temporal e impor exigências que tornam o procedimento administrativo mais moroso, a norma viola o art. 231 da CF e obrigações internacionais assumidas pelo Brasil, como a Convenção 169 da OIT e precedentes da Corte Interamericana.

Recordou que o CNDH declarou estado de sistemática violação de direitos indígenas e recomendou a decretação de calamidade pública. 

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Representando a Associação das Comunidades dos Índios Tapeba de Caucaia, o advogado Péricles Martins Moreira afirmou que a lei 14.701/23 viola frontalmente o art. 231 da CF e afronta o precedente vinculante firmado pelo STF no Tema 1.031.

Ele destacou que a Corte já declarou a inconstitucionalidade do marco temporal e reconheceu que os direitos territoriais indígenas são originários, pré-existentes e independem de comprovação de presença física em 5 de outubro de 1988.

Para o advogado, ao tentar reintroduzir tese já superada e impor condicionantes que transformam a demarcação em ato constitutivo, e não meramente declaratório, a lei subverte a lógica constitucional e ignora a história de expulsões e violências sofridas pelos povos.

Sustentou ainda que o legislador não pode, por via indireta, revogar precedente de repercussão geral, sob pena de violar a coerência do sistema de precedentes. 

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