STJ: Estudante que fingiu ser médico não irá a Júri por morte de paciente
Decisão entendeu que não havia indícios técnicos suficientes para demonstrar nexo de causalidade entre a conduta atribuída ao estudante e a morte do paciente.
Da Redação
sexta-feira, 12 de dezembro de 2025
Atualizado às 16:46
A 5ª turma do STJ impronunciou estudante de medicina acusado de homicídio após se passar por médico e assumir plantão na emergência de hospital, por entender que não havia indícios técnicos suficientes para demonstrar nexo de causalidade entre a conduta atribuída a ele e a morte de paciente.
Seguindo voto do relator, ministro Joel Ilan Paciornik, o colegiado reformou acórdão do TJ/RJ que havia mantido sentença de pronúncia contra o estudante.
Entenda
O caso envolve estagiário de medicina que se apresentou como médico, assumiu um plantão na emergência e prestou atendimento a um paciente que veio a falecer.
Ao depor, o médico que teve a identidade utilizada confirmou que o acusado era o estagiário acadêmico no dia do plantão do fato. Uma testemunha que levou o enteado à emergência no mesmo dia também relatou que o estudante se apresentou como médico e realizou o atendimento.
O filho da vítima reforçou essa versão ao afirmar que o estudante se apresentou como responsável pelo atendimento da emergência e que as enfermeiras o chamavam de "Doutor".
Disse ainda que ele "não tinha confiança nas atitudes a serem tomadas" e que "as enfermeiras que davam o norte do que tinha que ser feito".
De acordo com o relato, quando o quadro piorou, o estudante pediu ao maqueiro que chamasse o médico do CTI. Nesse momento, teria sido solicitado que ele mostrasse o CRM, mas o documento não foi apresentado e, após pressão, ele teria admitido que não era médico, mas estudante.
Ainda, segundo a denúncia, o paciente, ao chegar à emergência, apresentava dores no abdômen, pernas inchadas, dispneia, e ao ser feito o procedimento de intubação saiu bastante líquido por sua boca e nariz, momento em que o denunciado ficou "paralisado com a situação, não sabendo o que fazer".
Conforme alegado, em poucas horas o quadro clínico do paciente se agravou, vindo este a falecer em decorrência de uma parada cardiorrespiratória.
Dolo eventual
Em interrogatório, o estagiário confirmou que entubou a vítima e que utilizou carimbo falso. Com base nisso, o MP ofereceu denúncia por homicídio com dolo eventual, sob o argumento de que, ao atuar sem a devida qualificação, ele teria assumido o risco de produzir o resultado morte.
Nas instâncias ordinárias, prevaleceu o entendimento de que a materialidade do crime e os indícios de autoria eram suficientes para submeter o caso ao Tribunal do Júri, deixando para os jurados uma análise técnica mais aprofundada sobre a causa da morte.
Voto do relator
Ao analisar o caso no STJ, contudo, o relator, ministro Joel Ilan Paciornik, destacou que a mera condição de garantidor, assumida pelo estudante ao se responsabilizar pelo atendimento, não bastaria para estabelecer responsabilidade penal pelo resultado, e que seriam indispensáveis elementos técnicos que apontassem ligação direta entre ação ou omissão específica e o óbito.
Para S. Exa., eventuais crimes autônomos, como exercício ilegal da medicina, devem ser apurados separadamente e não podem servir como base para presumir autoria de homicídio.
Nesse sentido, concluiu que "eventuais irregularidades relacionadas ao uso de documento falso ou exercício ilegal da medicina - embora configurem condutas administrativamente reprováveis e penalmente típicas autônomas - não podem suprir a ausência de demonstração causal entre a conduta médica específica e o óbito".
Acompanhando o entendimento, o colegiado impronunciou o estagiário, nos termos do art. 414 do CPP.
O escritório Maia, Goulart & Kohl Advogados atuou na defesa do estudante.
- Processo: AREsp 2.870.728
Leia o acórdão.





