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As maiores preocupações de especialistas em Direito Penal

Da Redação

quarta-feira, 5 de setembro de 2007

Atualizado às 08:23


Crime, Justiça e Violência

Justiça Restaurativa, criação de Juizados de Instrução, regulamentação da delação premiada e direito penal garantista foram pontos destacados no Congresso

A questão das garantias individuais dos cidadãos e o limite da intervenção do Estado no combate e repressão ao crime conduziram os debates do 1º Congresso Internacional Crime, Justiça e Violência, realizado de 30/8 a 3/9, em SP.

Acadêmicos, professores de Direito Penal, juristas e criminologistas nacionais e estrangeiros demonstraram durante esses cinco dias grande preocupação com o avanço do poder punitivo estatal. E manifestaram disposição de tentar impedir esta atual tendência, invocada em nome de uma suposta segurança da sociedade.

Atualmente a questão da segurança é pauta do dia em qualquer lugar do mundo, seja pelo avanço do terrorismo, seja pelo tráfico de drogas. E o problema é que, em nome da segurança, muito se tem descuidado das garantias mínimas das pessoas, como cidadãos, e leis são violadas. Os temas apresentados e debatidos tinham relação - direta ou indiretamente - com a questão das garantias mínimas dos cidadãos.

Promovido pela Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes o congresso ainda apresentou proposta de criação dos Juizados de Instrução, anexos aos Tribunais Superiores, que cuidariam apenas de processos envolvendo autoridades com foro privilegiado. Ela agora será entregue ao ministro da Justiça, Tarso Genro.

Para destacar a importância dessa proposta, Luiz Flávio Gomes citou o caso do "mensalão", cuja denúncia demorou quase um ano e meio para ser julgada no Supremo Tribunal Federal, em razão dos trâmites obrigatórios, prazos a serem cumpridos e diligências, e, ainda, em função do imenso volume de processos a cargo de cada ministro - uma média de 6 mil por ano. Os Juizados de Instrução passariam a instruir, decretar prisões e determinar a soltura de presos quando houver injustiças, reduzindo significativamente o tempo de tramitação dos processos.

Em sua proposta, Luiz Flávio Gomes irá sugerir que o Juizado de Instrução seja formado por juízes e desembargadores, que se candidatariam às vagas, num processo semelhante à escolha de ministros dos tribunais. "Os juízes teriam tarefas normais e presidiriam as investigações", afirma.

De acordo com a proposta, depois de aprovado e instalado o Juizado de Instrução, a competência seria gerada de imediato e tudo em andamento passaria automaticamente para o órgão. Dessa forma, o recebimento de uma denúncia envolveria um único juiz.

A exemplo do que fará com a criação dos Juizados de Instrução, Luiz Flávio Gomes entregará ao ministro Tarso Genro proposta de regulamentação uniforme e específica da delação premiada, outro tema discutido no congresso. "A proposta abordará tópicos relevantes, como prêmios proporcionais, veracidade nas informações prestadas, exigência de checagem minuciosa dessa veracidade, eficácia prática da delação, segurança e proteção para o delator e, eventualmente, sua família", acrescenta.

Outro ponto de destaque do congresso foi o repúdio veemente ao Direito Penal do Inimigo, teoria do doutrinador alemão Günther Jakobs, sustentada desde 1985 com base nas políticas públicas de combate à criminalidade nacional e/ou internacional. Em sua obra "Direito Penal do Inimigo: noções e críticas", o autor dissocia o cidadão de bem e o inimigo, de forma que o primeiro pode até infringir alguma norma, mas tem os seus direitos de cidadão-acusado preservados. Porém o segundo, o inimigo, não é vinculado às normas de direito, e sim à coação que, segundo o autor, é a única forma de combater a sua periculosidade.

Para Luiz Flávio Gomes, "quem sustenta o chamado 'direito penal' do inimigo pode ser caracterizado como um grande inimigo do direito penal garantista, porque tal teoria representa um tipo de direito penal excepcional, contrário aos princípios liberais acolhidos pelo Estado Constitucional e Democrático de Direito".

O congresso contou com a participação também do ministro Gilmar Mendes, vice-presidente do STF. Ao defender o papel de que o Estado só pode exercer poder dentro dos limites do Direito, o ministro destacou os abusos do Ministério Público, que, em seu dever de acusar, acaba muitas vezes apresentando acusações sem fundamento.

Gilmar Mendes também falou sobre o elevado número de habeas corpus julgados pelo STF, relacionados a decretos de prisão preventiva, que acabam sendo concedidos "de forma desfundamentada, trazendo para o tribunal um ônus adicional político", em função do apelo popular. Cerca de 60% dos habeas corpus chegam ao Supremo após terem sido indeferidos nas instâncias inferiores. "Isso demonstra que algo deve estar errado nas instâncias inferiores."

Em sua palestra, Abuso do poder acusatório e a jurisprudência do STF, o ministro criticou a imprensa, que muitas vezes generaliza temas e publica análises de julgamentos de questões penais no STF, sem um aprofundamento jurídico adequado do assunto.

Os debates do Congresso Internacional trataram também da Justiça Restaurativa, uma prática já difundida na Europa e aplicada no Brasil apenas em Porto Alegre, Distrito Federal e no município paulista de São Caetano do Sul. Também chamada de mediação de conflitos, a Justiça Restaurativa pode ser uma alternativa mais eficaz ao simples encarceramento ou outras formas de punição tradicionais, em casos de delitos de média gravidade cometidos por menores, contra o patrimônio, crimes sexuais e violência doméstica.

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