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A coisa julgada no novo Código de Processo Civil

Giovana Andreoli Gay

Numa breve análise à evolução histórica do instituto, a coisa julgada, inicialmente, era configurada basicamente como a "presunção da verdade", na qual a sentença irrevogável era considerada absolutamente verdadeira nos fatos e no Direito.

quarta-feira, 14 de setembro de 2016

Atualizado em 13 de setembro de 2016 08:08

O Código de Processo Civil de 2015 trouxe diversas mudanças às normas processuais brasileiras, todavia, um ponto que merece destaque refere-se à coisa julgada.

Numa breve análise à evolução histórica do instituto, verificamos que a coisa julgada, inicialmente, era configurada basicamente como a "presunção da verdade", na qual a sentença irrevogável era considerada absolutamente verdadeira nos fatos e no Direito. Após alguns anos, esta passou a ser considerada como um efeito da sentença. E, em sua terceira e atual teoria, a "res judicata" definiu-se não apenas como um mero efeito da sentença, mas sim, como uma qualidade de indiscutibilidade e imutabilidade que adere aos efeitos do decisum.

Neste sentido, o Novo Código de Processo Civil em seu artigo 502 dispõe que "denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso".

Embora os termos assinalados sejam parecidos, convém mencionar que o legislador utilizou a palavra "imutabilidade" para definir a impossibilidade de a coisa julgada ser desfeita ou alterada. Por sua vez, a "indiscutibilidade" relaciona-se à impossibilidade de questionar o que já foi decidido e transitou materialmente em julgado.

Ocorre que, com a inserção do Novo Diploma Processual, uma questão entrou em discussão entre os doutrinadores quanto à extensão dessa imutabilidade, haja vista o disposto no §1º do artigo 503, ex vi:

"Art. 503 - A decisão que julgar total ou parcialmente o mérito tem força de lei nos limites da questão principal expressamente decidida.

§ 1º O disposto no caput aplica-se à resolução de questão prejudicial, decidida expressa e incidentemente no processo, se:

I - dessa resolução depender o julgamento do mérito;

II - a seu respeito tiver havido contraditório prévio e efetivo, não se aplicando no caso de revelia;

III - o juízo tiver competência em razão da matéria e da pessoa para resolvê-la como questão principal. (g.n.)"

No Código anterior, era incontroverso que somente o dispositivo da decisão transitava em julgado. Entretanto, a partir do novo texto, entende-se que a imutabilidade e a indiscutibilidade alcançam os motivos da sentença no tocante à questão prejudicial, partindo da premissa que a resposta jurisdicional foi concluída.

Estendendo a imutabilidade aos motivos da sentença, segundo o Professo Marcelo Pacheco Machado, "temos a pacificação do conflito com maior amplitude, evitando o surgimento de novos processos (eficácia negativa da coisa julgada) e simplificando o julgamento de mérito de outros (eficácia positiva da coisa julgada)".

Nesse contexto, os que defendem a coisa julgada sobre questões prejudiciais estão preocupados com a utilidade e com o efetivo rendimento do processo.
Por sua vez, com a restrição da coisa julgada ao objeto litigioso do processo (delimitado pelo pedido e causa de pedir), há melhores condições de identificar quais matérias serão imutabilizadas com o julgamento de mérito.

A dúvida que prevalece é: como isto será aplicado na prática?

Como as demandas consideradas "de massa" poderão suportar a imutabilidade de decisões muitas vezes padrão, emanadas, principalmente, em Juizados Especiais, por conta da celeridade e dispensa de formalidades?

Ora, o operador do Direito deverá observar ponto a ponto de cada decisão e, caso verifique qualquer irregularidade ou fundamentação que vá de encontro ao seu interesse, deverá impugná-la para não sofrer as consequências, posteriormente, de uma questão supostamente discutida e resolvida?

Realmente não nos parece razoável!

Além disso, frequentemente nos deparamos com decisões absolutamente omissas aos questionamentos do postulante e, numa tentativa de reapreciação do juízo por meio de embargos aclaratórios, a fim de se observar, de fato, a petição erigida, este simplesmente rejeita-a, sob a justificativa de impossibilidade de reapreciação do mérito.

Resta patente, portanto, que o legislador se preocupou em estabelecer limites para que a coisa julgada se estabeleça quanto aos motivos da sentença, a fim de reduzir surpresas para as partes e gerar economia processual.

Entretanto, essa imutabilidade também exige maior atenção do juízo às questões apreciadas em sua integralidade, justamente para assegurar a efetiva aplicação do Direito.

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*Giovana Andreoli Gay é advogada do escritório Pires & Gonçalves - Advogados Associados.

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