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Ficou difícil dirigir?

Um carro novo com adaptações pode facilitar a vida de muita gente.

sexta-feira, 16 de março de 2018

Atualizado às 07:10

Câncer de mama. A notícia me foi dada logo pela manhã, por uma amiga. O diagnóstico acabara de sair, ela seria operada em duas semanas. Nós nos falamos muitas vezes a partir desse dia e por longos dois anos, tempo que durou a parte mais árdua da batalha contra a doença. Um das sequelas do tratamento foi a necessidade de poupar o braço direito, para que não aparecessem mais nódulos no seio operado. Algumas tarefas, como carregar muito peso, tornaram-se proibitivas. Outra tarefa importantíssima - dirigir - passou a ser um problema. A constante mudança de marchas, no trânsito caótico da cidade, poderia complicar o estado geral de saúde.

O que fazer? É então que se percebe o grande trunfo que tem nas mãos a pessoa que é bem informada acerca de seus direitos. Conhecer as leis é sempre entendido como tornar conscientes nossos deveres. Acossados que ficamos pela montanha de obrigações - de uma conduta impecável no trânsito a toda a sorte de impostos a pagar - esquecemos que temos, sim, muitos direitos. Ocorre que, às vezes, as leis não têm divulgação adequada.

Um tempo atrás virou moda dizer que há leis que "pegam", e outras não. Nada disso. Leis são feitas para "pegar" ou não precisam existir. Há, isso sim, leis que são estudadas seriamente e vêm ao encontro da necessidade da sociedade. E há outras, feitas a toque de caixa, convenientes apenas a um ou outro, por isso acabam esquecidas ou simplesmente revogadas.

E há leis que são muito importantes para determinado grupo de pessoas, mas por envolverem benefícios financeiros, ficam meio "escondidas". É o caso do direito à Carteira Nacional de Habilitação Especial, concedida a pessoas com alguma deficiência física e que precisam de adequação em seus veículos. Minha amiga, por exemplo, poderia dirigir sem qualquer problema um automóvel com câmbio automático. Esses automóveis, todos sabem, são mais caros.

Porém, a lei que permite a adequação dos automóveis e a expedição da CNH Especial também faz vigorar inúmeras vantagens na compra de automóveis. Por exemplo, no caso da minha amiga, submetida como foi a uma mastectomia - nome que se dá à cirurgia que retira o tumor do seio - ela foi beneficiada com isenção de IPI (Imposto sobre Produtos), IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), e ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), na compra de um carro novíssimo. São impostos que incidem fortemente no preço final, ou seja, com as isenções, minha amiga foi beneficiada com uma redução de quase 40% do valor total do automóvel novo. E, de quebra, ela ainda não paga IPVA (Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores) e está liberada do rodízio. Se ela ficou feliz? Claro!

A isenção também vale para os homens portadores de câncer de próstata e que são condutores de veículos. Assim como portadores de artrite, artrose, tendinite, síndrome do túnel do carpo - que causa muitas dores no braço -, poliomielite, pessoas que usam próteses internas e externas; portadores de problemas na coluna e nanismo, característica das pessoas cuja altura é considerada abaixo da média. De um modo geral, podem ser beneficiados portadores de doença que faz a pessoa depender de um veículo e que, ao mesmo tempo, permite usar o volante, feita as devidas adequações.

Há também isenção de IPI e liberação do rodízio para condutores que convivem e cuidam de pessoas portadoras de doenças limitantes ou deficiências. São pessoas que precisam das facilidades de um automóvel, muitas vezes com adaptações para que o deficiente possa ser levado como passageiro. Nesse rol de beneficiados estão os responsáveis por portadores de deficiência física - incluindo aí a deficiência visual -, mental e autismo. Para qualquer cidadão, as exigências para se obter a CNH são: ter 18 anos completos, ser alfabetizado, apresentar original e cópia do RG e CPF, cópia do comprovante de residência e uma foto 3×4 colorida com fundo branco. Para requerer a CNH Especial, além dos requisitos citados acima, o portador de deficiência física passa pela consulta com uma junta médica, que avaliará o nível de deficiência e o adestramento necessário do candidato para dirigir. Na CNH Especial constarão as especificações acerca das adaptações necessárias para garantir a segurança do condutor ou do passageiro deficiente.

Mais uma vez, é bom lembrar que inclusão e cidadania, mais do que termos genéricos ou bonitos para um discurso, são conceitos que se tornam palpáveis na medida em que são garantidos direitos reais e efetivos a todos os cidadãos, e a cada um conforme suas necessidades e características. Afinal, os deveres continuam aí, firmes e fortes, a nos acossar.

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*Ivone Zeger é advogada especialista em Direito de Família e Sucessão. Membro efetivo da Comissão de Direito de Família da OAB/SP, do IBDFAM- Instituto Brasileiro de Direito de Famíia, e do IASP, é autora dos livros "Herança: Perguntas e Respostas", "Família: Perguntas e Respostas" e "Direito LGBTI: Perguntas e Respostas".

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