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Blindagem patrimonial. Você já ouviu falar?

É comum ouvirmos interpretações pejorativas sobre a blindagem patrimonial. O presente artigo pretende esclarecer o conceito, apresentando de maneira clara o seu verdadeiro significado e alcance.

14/5/2025

O conceito de blindagem patrimonial e o erro interpretativo decorrente do mau uso do termo.

Não é incomum observar, no resultado das pesquisas sobre “blindagem patrimonial” no Google, um equívoco recorrente cometido por alguns aplicadores do Direito: a incompreensão do verdadeiro conteúdo do termo.

Esse equívoco recorrente acabou provocando, nos últimos anos, uma visão pejorativa do termo “blindagem” quando essa se refere ao patrimônio. Alguns dizem, inclusive, que “não existe blindagem patrimonial”.

Será mesmo? Vamos analisar o termo e fazer algumas considerações relevantes.

O significado de “blindagem”

Antes de serem tecidos quaisquer comentários quanto ao citado equívoco em relação ao termo, é necessário compreendê-lo adequadamente e por completo. Em consulta ao dicionário da língua portuguesa, “blindagem” é um substantivo feminino que se refere à ação de blindar. “Blindar”, por sua vez, significa “envolver, cobrir, colocar um revestimento resistente ou impermeável para proteger ou servir de abrigo para”.

O significado de “patrimônio”

“Patrimônio”, por sua vez, é descrito como sendo “o conjunto de bens, direitos e obrigações economicamente apreciáveis, pertencentes a uma pessoa ou a uma empresa”.

Blindagem patrimonial: Esclarecendo o conceito

Como apontado anteriormente, alguns aplicadores do Direito costumam afirmar que inexiste “blindagem patrimonial” no Brasil. Essa afirmação decorre primordialmente de uma constatação triste, mas real: muitos profissionais “venderam” a ideia de que, por meio dessa “blindagem”, seria possível tornar o patrimônio daquele devedor que contratasse os serviços oferecidos inacessível aos seus credores.

Se essa ideia de blindagem vendida por esses profissionais fosse verdadeira, de fato não haveria “blindagem patrimonial” no Brasil.

Contudo, o termo em si não é problemático, mas, como apontado, apenas o seu mau uso por profissionais desqualificados, que vendem esse termo como solução para devedores que pretendem, deliberadamente, não honrar com os compromissos assumidos.

Observa-se, portanto, que os citados profissionais que venderam essa solução valeram-se de um nome popular, de fácil divulgação e compreensão e, por estratégia de marketing, acabaram causando essa percepção negativa sobre o termo ora estudado.

Em resumo, os citados profissionais não estavam vendendo um serviço lícito de blindagem patrimonial, mas sim uma promessa ilícita de inviolabilidade do patrimônio.

No caso, essa inviolabilidade do patrimônio não pode ser prometida, uma vez que, por força de lei, “o devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para o cumprimento de suas obrigações” (art. 789 do CPC).

Sobre o tema, Nelson Rosenvald ensina que a responsabilidade patrimonial do devedor é regida pelo princípio da responsabilidade patrimonial, que estabelece que "o devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para o cumprimento de suas obrigações, salvo as restrições estabelecidas em lei" (ROSEVALD, 2015, p. 827).

Contudo, blindagem e inviolabilidade são, como visto, conceitos diferentes.

Então o que deve ser entendido como “blindagem patrimonial”?

O serviço de blindagem patrimonial nada mais é do que um conjunto de medidas lícitas e, portanto, previstas em lei, que busca minimizar, em casos específicos, os riscos decorrentes do exercício de qualquer atividade empresarial.

Toda sociedade empresarial está sujeita a riscos. Em razão disso e do notável ímpeto de se judicializar absolutamente qualquer conflito de interesses no Brasil, essa blindagem patrimonial busca segregar e separar adequadamente o patrimônio empresarial do patrimônio pessoal daqueles que empreendem.

São medidas, portanto, não apenas jurídicas, mas também contábeis, que buscam somente resguardar o patrimônio pessoal dos sócios contra os riscos do exercício da atividade empresarial.

Sobre o tema, Gladston Mamede e Eduarda Cotta Mamede ensinam que a blindagem patrimonial é uma estratégia jurídica que visa proteger o patrimônio pessoal de empresários e investidores, utilizando-se de estruturas societárias e instrumentos legais para mitigar riscos e responsabilidades (MAMEDE; MAMEDE, 2015).

Conclusão

Diferentemente do que se diz corriqueiramente sobre a blindagem patrimonial, a sua utilização é plenamente legal, desde que sejam utilizados instrumentos jurídicos legalmente previstos, sem qualquer intuito fraudulento ou tendente a lesar direitos de terceiros.

Assim, podemos sintetizar esse pequeno artigo indicando, como pontos centrais que devem ser observados para a legalidade desse tipo se serviço, os seguintes:

Como explicado, o mau uso do marketing por alguns profissionais da área criou uma imagem ruim de um termo que, como explicado, não tem em si mesmo nada de negativo ou ilegal.

Blindar é proteger, e não tornar inacessível (inviolável). O termo não é apenas correto, mas reflete exatamente o seu intuito protetivo.

Ressalta-se, por fim, reafirmando a correção do termo, que nenhuma blindagem é intransponível, de modo que a sua utilização dentro dos limites legais é indispensável para resguardar o patrimônio pessoal dos sócios de empresas.

__________

MAMEDE, Gladston; MAMEDE, Eduarda Cotta. Blindagem patrimonial e planejamento jurídico. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2015.

ROSEVALD, Nelson. Manual de Direito Civil: Volume 2 – Parte Geral e Obrigações. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2015.

Elgen Leite de Castro Costa Júnior
Advogado. Revisor da Revista Meritum (Qualis A3). Mestre em Direito Privado e bacharel em Direito pela PUC/MG. LL.M em Direito Empresarial na FGV. Planejamento patrimonial e sucessório. D. Societário.

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