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A disputa não é por ideologias, é sobre o que fazer no cenário global de ascensão da China

terça-feira, 20 de novembro de 2018

Atualizado às 09:03

Em agosto, quando a eleição começava a esquentar, veio ao Brasil o secretário (lá ministro chama assim) de Defesa dos Estados Unidos, Jim Mattis. Por que a visita? Parte do esforço de Washington para conter a expansão da influência chinesa. Isso não é suposição, ou dedução: ele mesmo fez questão de afirmar.

 

No governo de Donald Trump, a contenção da China ombreia com a contenção do Islã político na lista de prioridades em política externa. E há dois séculos os EUA olham as terras do Alasca a Ushuaia pelas lentes da Doutrina Monroe, "América para os americanos". A conclusão é imediata.

 

Na teoria, os "americanos" de Monroe não são só os do norte, mas todos os habitantes entre o Estreito de Behring e o Canal de Beagle. Na prática, dada a brutal desproporção entre os Estados Unidos e os vizinhos, a doutrina reserva o território à influência norte-americana, excluindo da denominação o Canadá e o México.

 

É esperado portanto que em períodos de disputa aberta da hegemonia Washington aperte o torniquete por aqui. Foi assim nas pressões sobre Getúlio Vargas na Segunda Guerra e na deposição de João Goulart, acontecimento que aliás só é explicável no contexto da Guerra Fria deles contra a União Soviética.

 

No front externo, Bolsonaro precisaria absorver ao menos em parte a sabedoria de Getúlio. O único erro que o líder da Revolução de 30 não podia correr na Segunda Guerra era terminar encaixotado do lado errado da história. E não cometeu. Pendulou, mas alinhou-se aos vitoriosos a tempo, e com ganhos materiais para o Brasil.

 

Nações com capacidade limitada de projeção de poder, hard ou soft, precisam de governantes com frieza, cinismo e inteligência para pendular sem arriscar o pescoço, o deles e o do país, e timing para alinhar no lado e momento certos. Assim é também quando se olha a disputa agora de hegemonia entre Estados Unidos e China.

 

A China é o contendor mais formidável que os EUA já tiveram, se não globalmente ao menos por aqui. Apenas para pegar os últimos cem anos, nem alemães nem soviéticos tinham em escala parecida as duas mercadorias que os chineses têm em abundância e oferecem aos países da América do Sul: capitais e mercados.

 

O principal nó da política dos EUA para as Américas é desejar reduzir a influência chinesa aqui quando, ao mesmo tempo, Trump impulsiona ali o buy american and hire american. Resta o quê? Os laços civilizatórios que unem os americanos do norte, do centro e do sul. E principalmente a força militar.

 

É visível que os Estados Unidos estão empenhados em fortalecer e impulsionar governos amigos na região. Mas há o detalhe: numa era em que os países sul-americanos mantêm eleições periódicas, o esforço americano para conter o soft power do dinheiro e do mercado chineses só se pagará se trouxer resultados aqui.

 

Pode-se gostar ou não do que escreve o novo chanceler, Ernesto Araújo, a respeito do papel de Trump na defesa do que chama de Ocidente. Lá na frente, entretanto, a política externa do governo Bolsonaro será julgada pelos resultados materiais que o Brasil vai colher da aproximação com a Casa Branca.

 

O presidente eleito tem o direito de desconfiar da penetração maciça de capitais chineses no Brasil. Mas precisará apresentar alternativas. Precisará mostrar que sua política externa abriu mercados a atraiu capitais para impulsionar o avanço das empresas brasileiras e melhorar a vida dos trabalhadores brasileiros.

 

Ao fim e ao cabo, o que o novo chanceler escreveu em seus artigos e seu blog ficará apenas para análise dos historiadores e dos acadêmicos. Porque, como dizem os americanos, at the end of the day os resultados materiais serão o parâmetro para saber se a política externa da dupla Bolsonaro-Araújo deu certo ou errado.

 

Até a semana que vem.