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Potocas e patacoadas

sexta-feira, 5 de março de 2010

Atualizado em 4 de março de 2010 15:17

 

Como divulgado neste vespertino, realizou-se recentemente o lançamento da segunda edição de modesta obra literária, na qual o atrevido autor se põe a discretear sobre temas vários, o que somente a idade e o atrevimento justificam fazer-se.

Insta, no entanto, seja divulgado o presente relato porque alguns candidatos a leitores que lá compareceram tiveram de aguardar por mais tempo do que, razoavelmente, seria o previsto para o desembaraço da obra por eles adquirida a peso de oiro.

De fato, ante o precipitado esgotamento dos exemplares então ali disponíveis, tornou-se necessário requisitar da editora, que assiste em outra freguesia, mais uns tantos livros, o que, mesmo contando-se com a eficiência de nossas empresas de transporte aéreo, não seria possível executar-se em minutos.

Demais disso, como sabem os viventes, em razão da oração fervorosa dos nordestinos, clamando por mais chuva nas cidades que habitam, São Paulo vem sendo o alvo principal de tal dádiva, não fosse essa cidade aquela que, no Brasil, possui o maior número desses brasileiros, coisa de 3.500.000, coisa que nenhuma cidade nordestina apresenta, já que Fortaleza, a mais populosa delas, mal chega aos 2.500.000 habitantes. Daí que, trazidos desde o aeroporto em barco a motor, tais livros lograram chegar a seu destino somente quando já havia sido servida a sobremesa, um finíssimo Poire au vin avec morceaux de Roquefor, que se seguiu ao lauto banquete compartilhado pelos convivas que lá foram, se não para adquirir a valiosa obra literária, ao menos para dar ao seu famoso autor o amplexo que a amizade e os interesses subalternos justificam, ou desfrutar do ágape, que se antecipava magnífico.

Aliás, Pierre Bocuse, que se havia comprometido a trazer pessoalmente o vol-au-vent de escargot por ele especialmente confeccionado para a ocasião, chamado às pressas pelo Príncipe Alberto, o Calvo, encarregou seu primeiro cozinheiro, Helmut von Gestetner, de representá-lo na efeméride, o que causou certa barafunda, pois este aludia a um tal Blätterteigpastete, nome que, como sabemos todos, tem aquela iguaria na terra natal de Immanuel Kant, coisa que o maître destacado para o local teve dificuldade de entender, por causa do sotaque bávaro do enviado de Bocuse, segundo declarou na ocasião aquele serviçal.

Quanto ao vinho, um autêntico Gewurztraminer, safra 1965, a opinião unânime dos connoisseurs presentes foi no sentido de que dificilmente se formaria uma dupla tão afinada como aquela estabelecida por Herr Gestetner para a ocasião. Nem Renato Machado lhe poria reparos. Entrevistados pela reportagem, alguns desses entendidos mal puderam balbuciar alguma palavra inteligível, limitando-se a engrolar palavras elogiosas, entremeadas de gargalhadas inesperadas, o que, segundo nos parece, dispensa maiores considerações.

Como quer que seja, os louvaminheiros de sempre, como soe ocorrer, não deixaram em brancas nuvens a acurácia do insigne restaurateur, ao qual entoaram loas mais do que propositadas.

Aliás, não foi registrado nenhum caso de coma alcoólico, limitando-se os paramédicos presentes a atender duas ou três senhoras que alegaram terem vindo de países frios e haverem estranhado o calor aqui reinante, não lhes bastasse já os efeitos do inevitável jet-leg.

Outrossim, o número de personalidades do jet-set presentes foi tal que deixamos de registrar seus nomes, para não sermos injustos com aqueles e aquelas que, menos salientes, limitaram-se a permanecer em seus camarotes, abanando-se discretamente. Digno, porém, de registrar a presença da cantora Madona, que se encantou com a obra literária e sua capa, determinando a seu coach que aproveite seu título para o próximo hit que ela deve gravar até o fim do semestre, segundo segredou ao governador Serra. God bless you, darling, como disse o autor do livro quando lho entregou. You know that Jesus loves you, acrescentou ele na ocasião, criando um jeu-de-mots, que foi muito apreciado pela colega Beyoncé, cujas palavras, entretanto, não foram muito bem interpretadas pela socialite que a acompanhava, a qual desconhecia que trocadilho em inglês é pun.

Dentre os ausentes, Roberto enviou telegrama, lamentando que imprevisto de última hora (aliás, imprevisto é sempre de última hora, caro Roberto) o retivesse no Rio de Janeiro, mas enviou um belíssimo buquê de flores azuis. Indagou, no telegrama, como anda sua biografia não-autorizada, "Doces tardes de Domingo", pois Erasmo, o pessimista da dupla, acha que a obra não ficará pronta até o fim do ano, como havia sido programado. O homenageado ficou de responder ao telegrama tão logo termine seu périplo pelas principais capitais do país.

Muito mais haveria a dizer daquele inesquecível acontecimento, tivéssemos nós o cálamo de um Baron Münchausen.