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A responsabilidade das escolas na prevenção e combate ao bullying: Implicações civis e criminais para os diretores escolares

sexta-feira, 26 de maio de 2023

Atualizado às 07:59

Introdução 

O bullying é um problema sério e recorrente nas escolas, afetando negativamente a vida dos estudantes e comprometendo o ambiente educacional saudável. Reconhecendo a gravidade desse fenômeno, o Brasil promulgou a lei 13185/2015, que estabelece medidas de combate ao bullying nas instituições de ensino. Neste artigo, discutiremos a importância das escolas na aplicação dessa lei, bem como a possibilidade de sofrerem processos judiciais por ação ou omissão, de acordo com o artigo 186 d do Código Civil, e a responsabilidade criminal do diretor da escola nos termos do artigo 13 do Código Penal. 

A Lei do Bullying 13.185/2015 

A lei 13.185/2015 desempenha um papel de relevância jurídica no enfrentamento do fenômeno do bullying no território brasileiro. Essa legislação estabelece uma série de diretrizes voltadas à prevenção e ao combate dessa prática danosa no ambiente escolar, visando proporcionar um ambiente seguro e propício ao desenvolvimento saudável de todos os estudantes. Em termos legais, a referida lei define o bullying como uma conduta de violência física ou psicológica, intencional e repetitiva, que se caracteriza pela ausência de motivação evidente, sendo perpetrada por indivíduos ou grupos contra uma ou mais vítimas. 

O artigo 4º da lei 13185/2015 estabelece que as escolas devem promover a conscientização, prevenção e combate ao bullying por meio da implementação de ações educativas, planos de prevenção e políticas de combate a essa prática. Essas medidas devem ser incorporadas de maneira transversal nos projetos pedagógicos, no currículo escolar e nas atividades extracurriculares. 

A importância do artigo 4º está na sua orientação direta às escolas, atribuindo a elas a responsabilidade de adotar medidas efetivas para lidar com o bullying. Essas ações educativas e preventivas visam conscientizar alunos, professores, famílias e demais membros da comunidade escolar sobre os efeitos nocivos do bullying e a importância de sua prevenção e combate. 

A implementação das ações previstas no artigo 4º não apenas cumpre uma obrigação legal, mas também contribui para a criação de um ambiente escolar seguro e saudável. Ao promover a conscientização e prevenção do bullying, as escolas têm a oportunidade de identificar precocemente situações de risco, oferecer suporte adequado às vítimas e agressores, e promover a construção de relações interpessoais saudáveis e respeitosas. 

É importante ressaltar que o artigo 4º estabelece a necessidade de integração dessas ações educativas no projeto pedagógico e no currículo escolar, garantindo sua abordagem constante e sistemática. Além disso, o engajamento da comunidade escolar, incluindo alunos, professores, diretores e pais, é essencial para o sucesso dessas iniciativas. 

Portanto, o artigo 4º da lei 13185/2015 reforça a importância das escolas em promover a conscientização, prevenção e combate ao bullying. Ao implementar ações educativas e políticas de combate ao bullying, as escolas não apenas cumprem com suas obrigações legais, mas também contribuem para a construção de um ambiente escolar seguro, inclusivo e propício ao desenvolvimento saudável dos estudantes. 

A importância das escolas na aplicação da lei 

As escolas desempenham um papel fundamental na aplicação efetiva da Lei 13185/2015. Primeiramente, é dever das instituições de ensino promover a conscientização sobre o bullying, tanto entre os estudantes quanto entre os profissionais que atuam no ambiente escolar. A disseminação de informações e a realização de campanhas educativas contribuem para a prevenção desse problema. 

Além disso, as escolas devem implementar mecanismos de identificação e combate ao bullying, como a criação de canais de denúncia e o estabelecimento de medidas disciplinares claras. É importante que os alunos se sintam encorajados a relatar casos de bullying, e que a escola esteja pronta para agir de forma rápida e eficaz na resolução desses conflitos. 

A Responsabilidade Civil da Escola 

No que diz respeito à responsabilidade civil das escolas, o artigo 186 d do Código Civil estabelece que aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, fica obrigado a repará-lo. Isso significa que as escolas podem ser responsabilizadas caso não tomem as devidas providências para prevenir e combater o bullying. 

Caso a instituição de ensino seja negligente na implementação das medidas previstas na Lei 13185/2015, deixando de criar um ambiente seguro e de atuar de forma adequada diante dos casos de bullying, ela pode ser acionada judicialmente pelos danos morais causados às vítimas. É importante ressaltar que a responsabilidade civil não se restringe apenas ao diretor da escola, mas pode abranger também os demais profissionais envolvidos, como os professores e orientadores. 

A possibilidade de responsabilidade civil da escola em casos de bullying está baseada no princípio geral do Direito Civil que estabelece a obrigação de reparar os danos causados a terceiros. A escola, como instituição responsável pelo ambiente educacional, tem o dever de zelar pela integridade física e emocional de seus alunos. Dessa forma, se a escola falha em adotar medidas efetivas para prevenir e combater o bullying, ela pode ser considerada responsável pelos danos morais ou materiais causados às vítimas. 

Existem dois fundamentos legais principais que embasam a responsabilidade civil da escola em casos de bullying:

  • Responsabilidade Objetiva: A Lei do Bullying 13.185 estabelece a responsabilidade objetiva da escola. Isso significa que não é necessário comprovar a culpa ou negligência da instituição para que ela seja responsabilizada pelos danos causados. Basta demonstrar que ocorreu o ato de bullying no ambiente escolar e que a escola não tomou as medidas adequadas para prevenir ou interromper a situação. Nesse caso, a escola é considerada responsável independentemente de sua conduta, pois o dano é presumido em função da omissão ou falta de cuidado na sua obrigação de proteção aos alunos.
  • Teoria do Risco: A escola, como entidade que exerce atividade de educação, também pode ser responsabilizada com base na teoria do risco. De acordo com essa teoria, a escola, ao admitir os estudantes em seu ambiente, assume o risco de eventualmente ocorrerem situações de bullying. Assim, é dever da escola adotar medidas adequadas para prevenir e combater o bullying, ou seja, o risco inerente à sua atividade educacional é transferido para a instituição, que deve agir de forma diligente para minimizá-lo. 

Portanto, se a escola falhar em cumprir o seu dever de proteção aos alunos e não tomar as providências necessárias para prevenir e combater o bullying, ela pode ser acionada judicialmente pelos danos morais ou materiais sofridos pelas vítimas. É importante destacar que a responsabilidade civil pode abranger não apenas o diretor da escola, mas também os professores, orientadores e demais profissionais que atuam na instituição, desde que seja comprovado que a conduta ou omissão deles contribuíram para o dano causado às vítimas. 

Por fim, é relevante ressaltar que cada caso é avaliado individualmente, considerando as circunstâncias específicas, a legislação aplicável e a jurisprudência vigente. Recomenda-se sempre consultar um profissional do Direito para obter uma análise detalhada e adequada sobre a responsabilidade civil da escola em casos de bullying. 

A Responsabilidade Criminal do Diretor Escolar: Relevância da Omissão e Danos Reflexos do Bullying 

No contexto da responsabilidade criminal do diretor escolar em relação ao bullying, é importante considerar a relevância da omissão e os eventuais danos reflexos decorrentes desses casos. O artigo 13 do Código Penal brasileiro estabelece que a omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe àqueles que têm obrigação legal de cuidado, proteção ou vigilância, assumiram a responsabilidade de impedir o resultado ou, através de seu comportamento anterior, criaram o risco da ocorrência do resultado. 

No contexto do bullying, isso significa que o diretor escolar pode ser responsabilizado criminalmente caso, tendo conhecimento de situações de bullying na instituição de ensino, não tome as medidas adequadas para preveni-las ou combatê-las. Se o diretor tem o dever legal de cuidado, proteção ou vigilância, sua omissão em agir diante do bullying pode ser considerada penalmente relevante. 

É fundamental ressaltar que a responsabilidade criminal do diretor ocorre tanto por sua ação direta quanto por sua omissão consciente. Portanto, se o diretor, ciente da prática de bullying em sua escola, não adotar as providências necessárias para evitar ou interromper a violência, ele pode ser considerado responsável criminalmente pelos danos causados às vítimas. O diretor deve agir de forma diligente, implementando medidas de prevenção, atendendo às denúncias e tomando as devidas providências disciplinares contra os agressores. 

Além disso, é importante considerar os eventuais danos reflexos decorrentes dos casos de bullying. Muitas vezes, as vítimas sofrem consequências emocionais, psicológicas e até físicas que podem se estender para além do ambiente escolar. Esses danos reflexos podem incluir problemas de autoestima, ansiedade, depressão e até mesmo comportamentos autodestrutivos. Nesse sentido, a responsabilidade criminal do diretor também pode se estender para as consequências desses danos, caso sua omissão tenha contribuído para agravar a situação. 

Em suma, a responsabilidade criminal do diretor escolar em relação ao bullying envolve tanto ações diretas quanto omissões relevantes. O diretor deve agir de forma diligente para prevenir e combater o bullying, e sua omissão consciente pode ser penalmente condenável. Além disso, é importante considerar os danos reflexos que as vítimas podem sofrer em decorrência do bullying, uma vez que a omissão do diretor pode contribuir para agravar essas consequências. A implementação efetiva da lei 13185/2015 e a atuação responsável das escolas são essenciais para garantir a proteção dos estudantes e a criação de um ambiente educacional seguro e saudável. 

Registro do Programa de Combate ao Bullying: Comprovação da Conformidade com a Lei 

Além da importância da implementação efetiva do programa de combate ao bullying, as escolas também devem realizar o registro adequado desse programa, a fim de comprovar sua conformidade com a lei 13185/2015. Esse registro é um elemento essencial para demonstrar o comprometimento da escola em prevenir e combater o bullying, além de fornecer uma evidência documental importante em casos de processos judiciais. 

A seguir, serão apresentadas algumas orientações sobre como a escola pode realizar o registro do programa de combate ao bullying:

  • Documentação detalhada: A escola deve documentar de forma clara e detalhada todas as ações e medidas adotadas para prevenir e combater o bullying. Isso pode incluir a elaboração de um documento ou manual que descreva as diretrizes, protocolos e estratégias utilizadas pela escola para lidar com o problema.
  • Políticas e normas: O registro do programa deve conter as políticas e normas estabelecidas pela escola em relação ao bullying, abordando aspectos como definição do bullying, procedimentos de denúncia, medidas disciplinares, acompanhamento das vítimas e agressores, e programas de conscientização e prevenção.
  • Canais de denúncia: A escola deve registrar a existência de canais de denúncia de casos de bullying, informando claramente aos alunos, pais e funcionários como podem relatar situações de bullying de maneira segura e confidencial.
  • Capacitação dos profissionais: É importante registrar as ações de capacitação realizadas com os profissionais da escola, como palestras, workshops e treinamentos sobre o bullying, seus efeitos e como lidar com essas situações de forma adequada.
  • Registro de casos e medidas tomadas: A escola deve registrar todos os casos de bullying que ocorrerem, incluindo informações sobre as partes envolvidas, as medidas adotadas para resolver a situação e o acompanhamento das vítimas e agressores.
  • Atualização e revisão: O registro do programa de combate ao bullying deve ser atualizado e revisado regularmente, garantindo que as políticas e medidas estejam alinhadas com as necessidades e melhores práticas atuais. 

Registro do Programa de prevenção e combate ao bullying 

Ao manter um registro detalhado do programa de combate ao bullying, a escola demonstra seu compromisso em lidar adequadamente com essa questão, além de fornecer uma documentação sólida em caso de necessidade de comprovação perante autoridades competentes ou em processos judiciais. É importante lembrar que o registro deve ser mantido de forma segura e acessível, respeitando as leis e regulamentos de proteção de dados aplicáveis. 

Dessa forma, a escola fortalece sua posição de cumprimento da lei 13185/2015 e reforça sua responsabilidade em proporcionar um ambiente escolar seguro e acolhedor para todos os alunos. 

O programa de combate ao bullying, nos termos da lei 13185/2015, precisa estar registrado na diretoria de ensino para garantir a transparência e a conformidade com as diretrizes legais estabelecidas. O registro do programa na diretoria de ensino permite que as autoridades responsáveis tenham conhecimento e fiscalizem a efetividade das medidas adotadas pelas escolas no combate ao bullying. 

Existem algumas razões importantes que justificam a necessidade desse registro:

  • Fiscalização e supervisão: O registro do programa de combate ao bullying na diretoria de ensino possibilita que as autoridades competentes exerçam a fiscalização e a supervisão adequadas sobre as ações das escolas. Através desse registro, a diretoria de ensino pode verificar se as escolas estão cumprindo suas obrigações legais e adotando medidas efetivas para prevenir e combater o bullying.
  • Padronização e alinhamento: O registro do programa permite que a diretoria de ensino promova a padronização e o alinhamento das ações de combate ao bullying em todas as escolas sob sua jurisdição. Isso é importante para garantir uma abordagem consistente e eficaz no enfrentamento do problema, evitando disparidades e lacunas na implementação das medidas.
  • Avaliação e acompanhamento: Com o registro, a diretoria de ensino pode avaliar e acompanhar a evolução do programa de combate ao bullying ao longo do tempo. Isso inclui verificar se as medidas estão sendo efetivas, identificar possíveis lacunas e promover melhorias contínuas. A avaliação e o acompanhamento sistemáticos auxiliam na identificação de boas práticas e na identificação de áreas que necessitam de intervenção adicional.
  • Transparência e prestação de contas: O registro na diretoria de ensino promove a transparência e a prestação de contas por parte das escolas. Ao disponibilizar essas informações, as escolas demonstram seu compromisso em combater o bullying, fornecendo uma base documental para verificação externa e oferecendo transparência à comunidade escolar, aos pais e aos alunos sobre as medidas adotadas.
  • Orientação e suporte: O registro do programa permite que a diretoria de ensino forneça orientação e suporte adequados às escolas. Com base nas informações registradas, a diretoria pode identificar necessidades específicas, fornecer diretrizes atualizadas e oferecer recursos adicionais para fortalecer a eficácia do programa de combate ao bullying nas escolas. 

Conclusão 

A Lei do Bullying 13.185/2015 representa um avanço importante no combate a essa prática nociva nas escolas. As instituições de ensino desempenham um papel fundamental na aplicação efetiva da lei, sendo responsáveis por promover a conscientização, prevenir e combater o bullying. 

A negligência ou omissão das escolas na implementação das medidas de combate ao bullying pode resultar em responsabilidade civil, nos termos do artigo 186 d do Código Civil, sujeitando-as a processos judiciais e à obrigação de reparar os danos morais causados às vítimas. Além disso, o diretor da escola pode ser responsabilizado criminalmente, nos termos do artigo 13 do Código Penal, pois deveria agir para implementar a prevenção ao bullying e não o fez. 

É fundamental que as escolas estejam comprometidas em criar um ambiente seguro e acolhedor, adotando políticas efetivas de prevenção e combate ao bullying. A conscientização e capacitação dos profissionais, a implementação de canais de denúncia e a atuação rápida e eficaz diante dos casos são elementos essenciais para o sucesso na erradicação do bullying e na proteção dos estudantes. 

A colaboração entre escola, estudantes, pais e comunidade é indispensável para enfrentar o desafio do bullying, garantindo um ambiente escolar saudável e seguro, onde todos possam desenvolver-se plenamente, nos termos do caput do artigo 5 da Constituição Federal. A aplicação adequada da Lei 13185/2015 é um passo importante nessa jornada de implementação de culta de paz nas escolas, nos termos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação artigo 12 incisos IX e X.

Bibliografia

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