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A busca pela paridade contributiva nas entidades fechadas patrocinadas pelo Poder Público. Até quando esperar?

segunda-feira, 22 de março de 2021

Atualizado às 08:15

A discussão da paridade contributiva na previdência complementar fechada, quando patrocinada pelo Poder Público, nos lembra a malsinada busca pelo teto remuneratório do serviço público. Neste caso, o art. 37, XI da Constituição de 1988, após algumas mudanças, nunca conseguiu gerar o efeito desejado. Os motivos foram variados: impossibilidade de inclusão de parcelas individuais, ausência de autoaplicabilidade da norma e, mais recentemente, exclusão de parcelas "indenizatórias", entre outros argumentos.

Já no caso da paridade contributiva na previdência complementar, a regra foi explicitamente prevista pela Emenda Constitucional 20/98, ao dispor, no art. 202, § 3º da Carta de 1988, que "É vedado o aporte de recursos a entidade de previdência privada pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, suas autarquias, fundações, empresas públicas, sociedades de economia mista e outras entidades públicas, salvo na qualidade de patrocinador, situação na qual, em hipótese alguma, sua contribuição normal poderá exceder a do segurado".

A clareza do dispositivo é patente. A norma veio a impor relevante limite aos aportes estatais a entidades previdenciárias, pois, não raramente, boa parte das receitas das empresas públicas e sociedades de economia mista era absorvida pelos interesses particulares dos empregados públicos favorecidos. Havia situações nas quais a proporção dos aportes chegava a inacreditáveis sete para um, ou seja, a cada real aportado pelos participantes, a entidade estatal ingressava com sete.

O preceito de 1998 veio com uma transição razoável, de forma às entidades buscarem, atuarialmente, a adequação necessária, mediante revisão de planos e redimensionamento das contribuições. Não por outro motivo, na mesma época, várias entidades previdenciárias migraram dos antigos planos de benefício definido, em regra atuarialmente corrompidos, para os planos de contribuição definida.

Todavia, na atualidade, existem dois estratagemas de superação ao preceito constitucional: primeiro, a paridade prevista seria somente quanto às "contribuições normais", ou seja, não seria aplicável ao equacionamento de déficits, o qual é feito pelas "contribuições extraordinárias" (art. 19, LC nº 109/01). A interpretação apontada, além de incorrer no evidente erro de interpretar a Constituição a partir da lei (o certo seria o contrário), implicaria nulificar a regra da paridade, pois os déficits seriam arcados, na maior parte, pelo Poder Público. Ademais, a proporção contributiva das contribuições normais deve ser observada nas contribuições extraordinárias (art. 21, LC 109/01).

O outro raciocínio, mais sofisticado, implica afirmar que a desproporção contributiva poderia perdurar, ainda hoje, em virtude da própria autorização de ajustes previsto no art. 5º da EC nº 20/98 ("O disposto no art. 202,  § 3º, da Constituição Federal, quanto à exigência de paridade entre a contribuição da patrocinadora e a contribuição do segurado, terá vigência no prazo de dois anos a partir da publicação desta Emenda, ou, caso ocorra antes, na data de publicação da lei complementar a que se refere o  § 4º do mesmo artigo"). Ou seja, a paridade deveria ser aplicada no prazo de dois anos, mas déficits acumulados até aquela data poderiam ser liquidados no futuro.

Esse último pensamento motivou a edição da Resolução CGPC nº 01/2000, a qual, ao prever a necessidade de paridade contributiva, no âmbito das entidades fechadas de previdência privada patrocinadas pelo Poder Público, "isentou" a observância do regramento constitucional quando "do ajuste atuarial por intermédio de estímulo a migração de participantes de planos de benefício definido para contribuição definida" (art. 3º). A regra foi posteriormente revogada pela Resolução CNPC 07/2011.

No limite, seria possível inferir que o ajuste determinado pela EC nº 20/98, no prazo de dois anos, não implicaria a realização forçada, em curto período, dos acertos necessários, especialmente em situações de elevado desequilíbrio. Com base no tempus regit actum, déficits passados ainda seriam regidos pelas regras pretéritas, que não determinavam a paridade. Todavia, ainda que admitida a premissa, o que se vê, na atualidade, é a falta de controle e segmentação entre déficits passados e futuros, com tentativas variadas, mesmo nas instâncias judiciais, de preservar privilégios.

É hora de o modelo de contribuição desejado e constitucionalizado em 1998 ser observado, sem percepções heterodoxas da legislação vigente e, ainda, sem a criação de déficits passados como forma de preservar privilégios futuros. Que o art. 202, § 3º da CF/88 possa, na sua plenitude, ser aplicado na previdência complementar brasileira.