MIGALHAS DE PESO

  1. Home >
  2. De Peso >
  3. ISS - O problema não resolvido dos conflitos de competência entre os municípios e a bitributação

ISS - O problema não resolvido dos conflitos de competência entre os municípios e a bitributação

Como existem vários entes Federativos com permissão para criar impostos (...) a CF preceitua que cabe à lei complementar dispor sobre eles, certamente para evitá-los.

segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Atualizado em 6 de setembro de 2013 13:58

Inúmeras prestadoras de serviços procuram-nos com uma indagação: para quem devo recolher o ISS? Para o município em que estou sediada ou para o município onde estão localizadas as tomadoras dos meus serviços?

Comecemos por esclarecer que, ao conferir competência às pessoas políticas para criar impostos, a CF o faz de forma separada e discriminada, indicando os fatos que os entes Federativos devem descrever como geradores da obrigação tributária (arts. 153, 155 e156). O que sobra (o resíduo) da discriminação dos fatos geradores, a Constituição entrega à União (art. 154).

A análise conjunta desses dispositivos constitucionais revela que a CF proíbe um ente Federativo de invadir a competência do outro, o que equivale a dizer que cada um somente pode criar o imposto que lhe foi entregue.

Como existem vários entes Federativos com permissão para criar impostos, inclusive descrevendo os mesmos fatos geradores, como é o caso dos Estados e municípios, antevendo a possibilidade de conflitos de competência, a CF preceitua que cabe à lei complementar dispor sobre eles, certamente para evitá-los (art. 146, I).

No caso do ISS, são mais de cinco mil municípios com permissão para instituí-lo. Para evitar conflitos de competência entre eles, a LC 116/03 veicula regra dispondo que o serviço considera-se prestado e o imposto devido no local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador, exceto nas hipóteses previstas nos incisos I a XXII, quando o imposto será devido no local da prestação (artigo 3º).

Pois bem: o art. 3º da LC 116/03 estipula que o ISS é devido no local do estabelecimento prestador ou, na falta desse, no local do domicílio do prestador, justamente para evitar conflitos de competência entre os diversos Municípios e discrimina taxativamente as hipóteses configuradoras de exceção, nas quais o imposto é devido no local da prestação, também com esse mesmo propósito.

Sucede que a LC 116/03 não conseguiu evitar conflitos de competência entre os municípios.

Os conflitos de competência entre os municípios, em torno da exigência do ISS, ainda permanecem e as circunstâncias que os ensejam beiram o indecoroso e o imoral.

Tais situações, para além de inconstitucionais e ilegais, são indecorosas e imorais porque o mesmo município defende ter direito ao imposto, se a prestadora de serviços está sediada em seu território, e, também, defende ter direito ao imposto, se a prestadora está sediada no território de outros Municípios, mas as tomadoras se encontram em seu território.

À situação indecorosa e imoral de um município exigir o ISS como lhe convém e somente para si foi conferida certa aparência de legitimidade, por meio da criação do cadastro obrigatório de empresas prestadoras de serviços sediadas em outros municípios.

Desconsiderando a CF, notadamente, o art. 146, I, e a LC 116/03, especialmente, seu art. 3º, os municípios têm criado um cadastro para prestadoras de serviços sediadas fora de seu território. Se o pedido de inscrição nesse cadastro é indeferido, as prestadoras passam a ser sua contribuinte.

Esse cadastro acaba por definir quem é o credor do ISS e, por isso, a lei que o cria viola o art. 146, I, da CF, que estabelece ser tarefa da lei complementar dispor para evitar conflitos de competência entre os municípios, assim como viola o art. 3º da LC 116/03, por ser esse dispositivo o que define o Município competente para exigir o ISS.

Repise-se: na prática, é a inscrição, ou não, nesse cadastro que define se o ISS é devido ao Município onde está sediada a empresa prestadora dos serviços.

Quando a inscrição é indeferida, a prestadora de serviços, obrigatoriamente, vê-se diante de uma situação de bitributação, dado que o município onde está sediada exige o ISS, com fundamento no art. 3º da LC 116/03, e o município onde estão localizadas as tomadoras exige, via retenção na fonte, o ISS sobre a mesma base de cálculo.

Observe-se: a não inscrição no cadastro torna a empresa contribuinte do município que o criou. Entretanto, como sua legislação não tem validade, vigência e eficácia fora de seu território, ele não pode exigir diretamente o ISS da prestadora sediada em outro município, então, ele faz a exigência, via retenção, da tomadora. Há, assim, uma nítida invasão de competência.

Esse tal cadastro, por qualquer ângulo que se examine, é inconstitucional.

A inconstitucionalidade evidencia-se pelo fato de a lei municipal, criadora do cadastro, ombrear com o art. 3º da LC 116/03 para evitar conflitos de competência entre os municípios no que concerne à exigência do ISS.

A exigência de inscrição da prestadora sediada em outro município no tal cadastro para não se tornar contribuinte do município que o criou, sem margem para dúvidas, afronta o inciso I do art. 146 da CF.

Em conformidade com o inciso I do art. 146 da CF somente lei complementar pode definir qual o critério para tornar um Município competente, ou não, para exigir o ISS.

É evidente que o indeferimento num cadastro exigido por lei municipal não pode definir quem é o município credor do ISS, porque a CF proíbe no inciso I do art. 146!

Com essa conduta, os municípios contribuem para sobrecarregar ainda mais o Poder Judiciário, pois as prestadoras de serviços que se veem diante da situação de bitributação acionam-no para definir qual dos Municípios em conflito é competente para exigir o ISS e por fim à dúvida que as atormentam.

__________

* Maria Ednalva de Lima é advogada do escritório Maria Ednalva de Lima Advogados Associados.

Maria Ednalva de Lima Advogados Associados

AUTORES MIGALHAS

Busque pelo nome ou parte do nome do autor para encontrar publicações no Portal Migalhas.

Busca