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Explicações Governamentais

MIGALHAS 1.122, de 8/3/2005, sob o título "Legitimidade Ativa", registra que "O STF arquivou o pedido de interpelação judicial proposto pelo PSDB contra Lula.

sexta-feira, 11 de março de 2005

Atualizado em 10 de março de 2005 11:09

Explicações Governamentais


Adriano Pinto*

MIGALHAS 1.122, de 8/3/2005, sob o título "Legitimidade Ativa", registra que "O STF arquivou o pedido de interpelação judicial proposto pelo PSDB contra Lula. Os tucanos queriam explicação sobre o discurso no qual Lula afirmava ter sabido por "um alto companheiro" de suposta corrupção no governo FHC. O ministro Sepúlveda Pertence alegou que como o PSDB não foi alvo direto da declaração de Lula, não teria legitimidade para pleitear os esclarecimentos."

Está no Site do STF, com data de 7/3/2005, a notícia, com acesso ao inteiro teor da decisão monocrática do Ministro-relator, Sepúlveda Pertence, na qual se registra precedentes do Tribunal, a partir de um pedido de explicações da associação dos juízes classistas da Justiça do Trabalho a respeito de declarações do Ministro da Justiça acaso ofensivas da categoria,

na ementa se consignou:

"Somente quem se julga ofendido pode pedir explicações em juízo. A utilização dessa medida processual de caráter preparatório constitui providência exclusiva de quem se sente moralmente afetado pelas declarações dúbias, ambíguas ou equívocas feitas por terceiros.

Tratando-se de expressões dúbias, ambíguas ou equívocas alegadamente ofensivas, que teriam sido dirigidas aos Juízes classistas, é a estes - e não à entidade de classe que os representa - que assiste o direito de utilizar o instrumento formal de interpelação judicial.

O reconhecimento da legitimidade ativa para a medida processual da interpelação judicial exige a concreta identificação daqueles (os Juízes classistas, no caso), que se sentem ofendidos, em seu patrimônio moral (que é personalíssimo), pelas afirmações revestidas de equivocidade ou de sentido dúbio".

Destaca o Ministro SEPULVEDA PERTENCE, que esse julgado serviu de parâmetro para a decisão ulterior de espécies semelhantes, a saber.

Interpelação requerida pela AMB - Associação dos Magistrados Brasileiros contra o Senador Antônio Carlos Magalhães, que teria aludido em termos pejorativos à magistratura nacional, quando foi assentado:

"Pedido de explicação em juízo como medida preparatória de ação penal relativa a delitos contra a honra.

Não tem legitimidade ativa para requerê-lo entidade de classe que age em defesa da honra de todos ou de alguns ou de um dos seus associados, porquanto a legitimidade ativa para esse pedido pertence, individualmente, a cada associado, por se tratar de ato personalíssimo do que se sente ofendido. Precedente do Plenário da Corte AGRPET 1.249."

Pedido de explicações ao atual Presidente da República formulado pela Associação dos Magistrados do Estado de Pernambuco, a propósito da alusão notória à suposta "caixa preta do Poder Judiciário, tendo como relator o Ministro Gilmar Mendes, que, também invocando o que se decidira na Pet 1249-AgRg -, por decisão individual, negou seguimento ao pedido de explicações, aduzindo:

"A própria inicial aponta como potencialmente ofendidos os Juízes de Direito e os Desembargadores do Estado de Pernambuco. Não será, por certo, a AMEPE o ente legitimado a propor a eventual ação penal. Assim, na linha firmada por esta Corte no Agravo Regimental na Pet 1249, negou seguimento a esta interpelação".

A decisão monocrática do Ministro SEPULVEDA PERTENCE, se muito bem estruturada sobre precedentes do Tribunal, revela o distanciamento, cada vez maior, do STF de sua missão institucional como tribunal constitucional, quando se tem conflito entre o governo e os governados.

Em primeiro lugar, pratica-se o pecado mortal de conferir interpretação e aplicação da Constituição à partir de conceitos e normas estabelecidas em leis infraconstitucional, numa verdadeira inversão de valores, pela qual, o legislador ordinário passa a dar sentido e conteúdo à tão decantada supremacia da Constituição.

Em sede de foro especial por prerrogativa de função que leva uma questão penal à Competência do Supremo Tribunal Federal, também se faz matéria constitucional o exame da conduta penalmente tipificada, assim como todos os pressupostos processuais, para os quais as normas infraconstitucionais constituem meras expressões formais a serem conciliadas com os valores, princípios e normas da Constituição.

Nesse contexto, a questão não se resolve pelo exame ou invocação do Art. 144 do Código Penal, para situar na individualidade dos que integram um partido político, dos que compõem um grupo social legalmente representado, a legitimidade ativa para pedir explicações em juízo quanto a referências, alusões ou frases, das quais se possa inferir calúnia, difamação ou injúria.

Essa escolha de aplicação do modelo legal infraconstitucional, no caso, serve, à toda evidência, para excluir o governante com foro constitucional do controle judicial, ainda quando, como no caso, se tenha afirmado que tudo quanto diga o Presidente da República sobre matéria pública excede à imunidade temporal da persecução penal de seus atos estranhos ao exercício de suas funções, outorgada pelo art. 86, § 4º, da Constituição.

E, pior, aproveita-se o formalismo da lei infraconstitucional, sem a sua expressão processual complementar, que reconhece a existência de substitutos nos entes coletivos que agregam pessoas físicas, cidadãos.

A atuação do Partido Político se deu, no caso, em forma de substituição processual constitucionalmente garantida (CF/88, art.5º, XXI), pautada pelo trato coletivo e impessoal dos direitos subjetivos de seus filiados. E, nesta dimensão, a defesa de direitos - divisíveis e disponíveis - pode ser promovida pelo Partido Político, para tornar efetiva a ordem constitucional que prevê deva o Presidente da República responder por eventuais tipicidades criminais, conforme o art.85, § 1º, da CF/88.

Existem nas situações em que um presidente da República imputa a existência de corrupção em gestão pública realizada por filiados do Partido Político, caso excepcional em que a eventual lesão a um conjunto de direitos individuais há de ser qualificada, à luz dos valores jurídicos estabelecidos na Constituição, como lesão a interesses relevantes da comunidade de filiados, presente hipótese de lesão ao interesse político de preservar imagem pública, como fator da própria disputa eleitoral para qual devem trabalhar.

É admissível, no máximo, que a atuação do Partido Político, em forma de substituição processual autônoma, seja limitada à obtenção dos provimentos genéricos indispensáveis à restauração dos valores sociais comprometidos, sendo-lhe vedado deduzir pretensões que signifiquem, simplesmente, tutela de interesses particulares de seus filiados, ainda que homogêneos, ou de grupo.

Certamente, cabe ao Partido Político, mesmo sem explicitação legal, a defesa de interesses sociais, especialmente no contexto político, assim entendidos aqueles cuja tutela é importante para preservar a organização e o funcionamento da sociedade e para atender a suas necessidades de bem-estar e desenvolvimento.

A identificação destes interesses sociais, especialmente quando também políticos, compete tanto ao legislador ordinário, como ao próprio Partido Político (CF/88, art.17, § 1º) mediante avaliação de situações concretas não previstas expressamente em Lei, tudo sujeito ao indispensável contraditório e ao controle judicial, de modo a que sejam coibidos abusos e desvios de legitimidade.

Mas, certamente, pior do que o caso envolvendo o Partido Político, são os precedentes da conduta do STF em relação a órgãos de representação classista, inclusive dos magistrados, para os quais, fechou a porta do controle judicial das condutas das autoridades elevadas ao foro privilegiado.

Em bom senso, sem desvios de homenagens aos governantes, ninguém pode pretender que se transfira para os integrantes de uma associação de classe, de forma individual, o ônus de afrontar poderosos detentores do poder político e econômico, e, portanto, essa jurisprudência construída pelo STF desvirtua seu desempenho, negando à sociedade, ao cidadão, a aplicação efetiva, social, da Constituição.

Finalmente, resta considerar que a Presidência da República é antes da pessoa individual do seu titular, o principal órgão da Administração Pública (CF/88, art.76), constituindo-se garantia constitucional de todos os administrados (pessoas físicas ou jurídicas) obter informações de interesse particular, coletivo ou geral (CF/88, art.5º, XXXIII).

A lesão aos valores constitucionalmente contemplados, ou a simples potencialidade dela, é especialmente significativa, razão pela qual deve ser desconsiderados eventuais formalismos que possam inibir o acesso ao controle judicial.

Ao invés de situar o controle judicial da conduta de autoridades governamentais na dependência de posições individuais e particulares, para que possam ter relevância social, mais efetivo socialmente e afinado com os valores e princípios constitucionais, será acolher as iniciativas das representações coletivas como previsto no art.5º, XXI, da CF/88.

É garantia constitucional expressa (CF/88, art.5º, XXI) e decorrente dos princípios constitucionais (CF/88, art.5º, § 2º), que a defesa de direitos individuais, se faça em reação coletiva, seja pelo significado particular de cada um, seja pelo que a lesão deles, globalmente considerada, representa em relação aos valores proclamados na própria Constituição, instrumento fundamental para promover o desenvolvimento equilibrado das relações entre governantes e governados.
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*Advogado do escritório Adriano Pinto & Jacirema Moreira - Advocacia Empresarial









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