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A revolução do processo eletrônico na advocacia

Mauro Pedroso Gonçalves

Ao contrário do que parece, o processo eletrônico não levará à extinção dos serviços prestados por escritórios correspondentes.

segunda-feira, 21 de maio de 2012

Atualizado em 18 de maio de 2012 12:56

Em vista de uma Justiça mais célere e eficiente, passou a ser admitido no Brasil, com a lei 11.419/06, o uso do meio eletrônico na tramitação de processos judiciais, comunicação de atos e transmissão de peças processuais. O processo eletrônico permite a eliminação de atividades presenciais ordinárias, inerentes ao uso do papel, como, por exemplo, o protocolo físico de petições, consulta de autos de processo e obtenção de cópias.

Essa revolução tecnológica permite inúmeras vantagens para todos os envolvidos em uma relação processual, como considerável ganho de tempo e economia financeira. A redução da papelada vem acabar com a burocracia e dificuldade de obtenção de espaço para arquivamento. Além disso, amortiza os custos decorrentes da impressão, bem como facilita a consulta e organização de documentos.

Na prática, o "processo sem papel" possibilita que juízes, advogados, procuradores e membros do Ministério Público tenham acesso instantâneo aos autos e produzam, via internet, atos processuais em suas casas, escritórios ou viagens. Juízes podem prolatar decisões urgentes, despachos, sentenças; advogados e promotores conseguem ajuizar cautelares, apresentar petições, interpor recursos, tudo sem qualquer comparecimento pessoal aos Tribunais para protocolo das peças.

Como o peticionamento eletrônico já é obrigatório em diversos órgãos do Poder Judiciário, todos os operadores do direito devem voltar, o quanto antes, para essa inevitável tendência, principalmente a classe dos advogados, que mais sente os benefícios e sofre as incertezas dessa nova sistemática.

Tal modernização não só gera economia, dinamismo e rapidez, como também apresenta alguns problemas, principalmente nessa fase inicial de implementação. Cada Tribunal está desenvolvendo um sistema próprio, o que tem dificultado bastante a atuação dos advogados que têm que litigar nos mais diversos Tribunais. As disparidades vão desde a utilização dos sistemas até a forma de envio e tamanho das petições (em megabytes).

Por isso, é necessária uma atuação mais ostensiva do CNJ - Conselho Nacional de Justiça e da OAB - Ordem dos Advogados do Brasil na padronização de procedimentos, para que o processo eletrônico jamais seja visto como um transtorno, e sim pura evolução.

Enquanto ao CNJ compete unificar os sistemas de atuação em todos os órgãos do Poder Judiciário, cabe à OAB levar ao CNJ as ideias, reclamações e dificuldades dos advogados. Assim, em um trabalho conjunto, os sistemas devem ser aperfeiçoados para que seja disponibilizado um totalmente adequado e, frisa-se, único!

Afinal, nenhum outro profissional do direito sofre tanto com a espera judicial quanto o advogado, sempre angustiado com a lentidão da Justiça e devedor de constantes explicações ao cliente. Por outro lado, merece destaque a procura da OAB em acompanhar o Judiciário nas melhorias do processo eletrônico, estando, inclusive, autorizada a emitir certificados digitais, como se verá a seguir.

(i) Do certificado digital da OAB

De nada adiantaria eliminar o meio físico se não houvesse uma maneira de tornar confiável o processo eletrônico. Com a certificação digital, é certo que as informações tornam-se ainda mais seguras que as constantes na frágil papelada.

Em termos gerais, o certificado digital é um arquivo eletrônico que identifica as pessoas físicas e jurídicas na rede mundial de computadores, isto é, na internet. Como as transações são criptografadas, essa credencial assegura o sigilo e autenticidade das informações.

Para assinar um documento, é usada uma chave privada e essa assinatura pode ser conferida pela chave pública da certificação. Esse par de chaves é protegido pelas senhas PIN (Personal Identification Number) e PUK (PIN Unlock Key). A PIN permite que seu titular assine digitalmente o documento, como se fosse uma assinatura de próprio punho. Após três tentativas incorretas de digitação do PIN, o certificado é bloqueado e somente se dará o desbloqueio por meio do PUK, que é a senha de emergência. Com três digitações incorretas do PUK, o certificado fica inutilizado.

Não se confunde a assinatura digital com digitalização de assinatura. A assinatura manuscrita para protocolo eletrônico é dispensável. Já a assinatura digital, obtida por intermédio do certificado digital, garante que o documento foi assinado por seu remetente.

O certificado digital é adquirido em uma AC - Autoridade Certificadora, habilitada pelo ITI - Instituto Nacional de Tecnologia da Informação, sendo o último uma autarquia federal vinculada à Casa Civil da Presidência da República. Essa autarquia ficou responsável pelas políticas ligadas à certificação digital e seu objetivo é manter a ICP-Brasil - Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira.

A ICP-Brasil, por sua vez, instituída pela Medida Provisória 2.200-2/2001, norma que deu início à implantação do sistema nacional de certificação digital no país, resume-se a uma cadeia de Autoridades Certificadoras, como a Presidência da República, Secretaria da Receita Federal, Caixa Econômica Federal, Serasa, Serpro e Certisign.

O Conselho Federal da OAB também se tornou uma Autoridade Certificadora, em parceria com a Certisign, empresa responsável pela tecnologia dos certificados. A autorização foi publicada no Diário Oficial em 05/09/2008 e a OAB passou a estar capacitada a emitir certificados digitais, com melhor preço e funcionalidades específicas aos advogados, referentes à identificação nos sistemas dos Tribunais.

Para obtenção do "Certificado Digital OAB", cuja validade é de três anos, basta seguir os procedimentos indicados no website: www.acoab.com.br.

Realizada a compra, o advogado deve se dirigir pessoalmente à sua Seccional, para identificação presencial e validação dos documentos.

Na Seccional, o certificado é gravado em um "token" (pen drive, com conexão USB) ou no chip de sua identidade profissional. Se for gravado na carteira da Ordem, é necessária a aquisição de um uma leitora de cartões, para que o smartcard possa ser conectado ao computador. Com esses instrumentos, o advogado está pronto para acessar os sistemas nos websites dos Tribunais e assinar digitalmente suas petições.

A propósito, vale destacar que o certificado digital possibilita a concretização de uma série de operações de forma virtual, ou seja, sem a presença física do usuário, mas que demandam uma inequívoca identificação, como assinatura de contratos, pareceres, procurações e declarações; envio e recuperação de informações de declarações de impostos; realização de transações bancárias; obtenção de certidões online etc.

Para que se gere, a partir do certificado digital, uma assinatura eletrônica, deve-se adquirir um programa específico de computador. Os aplicativos Microsoft Office já possuem essa funcionalidade. Todavia, é dispensável o referido programa para peticionamento perante os órgãos do Poder Judiciário.

(ii) Do processo eletrônico no Poder Judiciário

Com o processo eletrônico, passaram a não mais precisar ser impressos ou assinados manualmente os despachos, decisões e petições. A conversão para o formato indicado pelo sistema do Tribunal, normalmente "pdf", e o posterior upload do arquivo, com a petição separada dos anexos, propiciam a juntada do documento aos autos.

Os benefícios são claros: celeridade na tramitação dos feitos; extinção do risco de eliminação ou extravio dos autos; peticionamento sem necessidade de deslocamento; tempestividade de petições protocoladas fora do horário de funcionamento do Tribunal, isto é, até as 24 (vinte e quatro) horas do último dia do prazo (artigo 3º, parágrafo único, da lei 11.419/06); disponibilidade de consulta dos autos em tempo integral, mesmo se "conclusos" ao juiz; entre outros.

Em vários órgãos do Poder Judiciário, já é possível utilizar o processo eletrônico, como no CNJ - Conselho Nacional de Justiça; STF - Supremo Tribunal Federal; STJ - Superior Tribunal de Justiça; TST - Tribunal Superior do Trabalho; e alguns Tribunais de Justiça, Tribunais Regionais Trabalho e Tribunais Regionais Federais.

Verifica-se que, por ora, o advogado não só tem que aprender um novo jeito de advogar, como também em fazer tudo isso em cada um dos Tribunais em que atua. Então, o advogado deve ficar atento às normas específicas de cada órgão, em face das divergências e peculiaridades dos sistemas, atinentes à forma de envio, tamanho máximo admitido em megabytes, forma de complementação da petição etc.

Para que a transição não seja abrupta, é recomendável que todos os Tribunais adotem a postura do STJ e da Justiça do Trabalho (TST, TRTs e Varas Trabalhistas), que aceitam tanto o protocolo virtual, quanto os meios convencionais de peticionamento em papel.

Em órgãos da Justiça Federal, como no Tribunal Regional Federal da 1ª Região, não se exige o certificado digital. Para o protocolo eletrônico, basta o advogado fazer um cadastro no site do Tribunal e validá-lo pessoalmente. Contudo, é óbvio que essa assinatura eletrônica é muito menos segura que a proporcionada pelo certificado digital. Infelizmente, esse procedimento é obrigatório para iniciais e recursos, ficando facultativo apenas para autos que ainda são físicos.

Não há dúvidas de que essa mudança cultural é irreversível e, ainda, é difícil, para muitos, depositar no documento digital a confiança dada ao papel. Enquanto não ocorrer a padronização dos sistemas pelo CNJ, nenhum advogado ficará confortável com o uso dessa inovação.

Por fim, cumpre ressaltar que, ao contrário do que se parece, o processo eletrônico não levará à extinção dos serviços prestados por escritórios correspondentes. O que vem eliminar é, apenas e tão somente, a atuação presencial do advogado para providências ordinárias. No entanto, como é cediço, advogar não se resume à elaboração e protocolo de petições.

O Direito não é uma ciência exata e nunca poderá ser afastada a importância do contato pessoal entre os sujeitos processuais. De fato, não se pode cogitar um processo sem que os advogados, procuradores, promotores, partes, testemunhas, peritos possam estar diante de juízes, desembargadores, ministros, serventuários de justiça.

Por essa razão, o mercado de escritórios correspondentes continua assegurado para audiências, sustentações orais, despachar petições e qualquer outra providência que demande a presença física do advogado. Não obstante, o caminho é acabarem as contribuições mensais para acompanhamento de processos, o que favorece, satisfatoriamente, às partes, que terão maior liberdade para contratar os advogados que julguem competentes, independentemente da localização geográfica do escritório.

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* Mauro Pedroso Gonçalves é advogado do escritório Trench, Rossi e Watanabe Advogados

Trench Rossi e Watanabe Advogados

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