MIGALHAS DE PESO

Hebe

Ela sempre foi o exemplo de mulher trabalhadora que soube contribuir no seu ofício para a harmonia social e a coesão familiar.

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Atualizado em 5 de outubro de 2012 14:47

Fazia um bom tempo que eu não via a Hebe pessoalmente até que o Amilcare, dono da RedeTV!, telefonou-me convidando a Eurídice e a mim para um jantar que ofereceria em sua homenagem, em Brasília.

A Hebe seria homenageada, e o foi, pelo Tribunal Superior do Trabalho que a condecorou por seus relevantes serviços prestados à causa dos direitos sociais no País.

De fato, a Hebe sempre foi o exemplo de mulher trabalhadora que soube contribuir no seu ofício para a harmonia social e a coesão familiar, atuando sempre a favor da causa da Justiça e das pessoas menos favorecidas.

Quando uma greve no judiciário de São Paulo se arrastava por mais de um mês, gerando prejuízos de toda ordem para a população e já alcançando em substanciosas perdas a economia do Estado, atendendo a pedidos, passei a dar expediente no escritório do STJ na Avenida Paulista.

E de lá, acompanhado apenas por um assessor, o Roberto Cordeiro, tendo à mão os dados dos graves prejuízos que a greve estava causando, pois já deixara de ser a favor dos servidores da Justiça para ser contra a população, e ante a inabilidade do então presidente do TJ/SP recusando-se a negociar e rejeitando autoritariamente qualquer colaboração do presidente do STJ e também do presidente do STF, que era o Nelson, busquei a mídia passando aqueles dias em entrevistas nos jornais, nas rádios e nas televisões, atiçando propositadamente, mas de leve, a população contra o comando da greve.

Já tinha ido ao programa do Ratinho e a outros de grande alcance popular, especialmente na Record, quando chegou o convite para eu ir ao programa da Hebe.

Na chegada encontrei os rapazes do Fala Mansa, uma banda de forró universitário e o sanfoneiro, se bem me lembro, tinha origem familiar em Bacabal, no Maranhão. Brinquei de cantor com eles ali nos bastidores.

Quando entrei em cena já estava lá no famoso sofá da Hebe aquela modelo de quase 2 metros de altura, a Daniella Sarahyba - que anos depois, eu já fora do STJ, me contactaria para ser seu advogado contra a Beneton.

A Hebe tinha uma capacidade incrível de gostar das pessoas à primeira vista. Direta nas perguntas, muito profissional e excelente administradora do tempo, me encabulou quando, ao final, me pediu para eu cantar.

Mas assim, brinquei, vestido de presidente do STJ? Pode tirar o paletó e afrouxar a gravata, Ministro.

O Fala Mansa entrou em cena, eu dei o tom do baião, a Hebe ficou segurando meu paletó e mandei - a todo mundo eu dou psiu, siu, siu... perguntando por meu bem, bem, bem... (Um clássico do Luiz Gonzaga, que a plateia cantou comigo).

No dia seguinte eu andava pelas ruas e notava as pessoas me olhando com um olhar diferente. Quem não me conhece não sabe que, pessoalmente, sou um cara tímido.

Naqueles dias andando pelas ruas, eu não sabia como me esconder. Na Rua Tutoia, uma senhora foi direta - gostei muito, gostei...

Eu já era reincidente. Lembrei-me então do que, muitos anos antes, aconteceu num ônibus, no Rio de Janeiro, no dia seguinte após eu ter atuado no Júri do Silvio Santos, em S. Paulo. Negava sempre, não, não era eu...

Mas o senhor se parece muito com aquele Vidigal. Mas não era eu, minha senhora.

A Hebe me fez popular no Brasil e me ajudou muito com aquela entrevista a esvaziar aquela greve insana. Na assembléia geral seguinte, na Praça João Mendes, em frente ao Fórum, já não havia quórum para decisão nenhuma.

A greve acabou por inanição. Voltei a Brasília feliz, consciente de que apenas cumpri com o meu dever de gestor público.

A Comendadora Hebe Camargo, naquela noite do jantar na casa do Amilcare, em Brasília, ainda irradiava energia no olhar, mas o sorriso já não era o mesmo. A sobrinha que a acompanhava me disse que a viagem e aquelas horas da solenidade no TST a cansara. Ainda não retornara à quimioterapia contra o câncer no peritônio que a perseguia.

A Hebe agora descansa em paz.

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*Edson Vidigal é ex-presidente do STJ e professor de Direito na UFMA






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