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Qual é o sonho profissional de um médico?

A disparidade entre as remunerações é grande. A resposta é, antes de tudo, "respeito", que todos merecem, especialmente aqueles que cuidam de vidas.

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Atualizado em 22 de outubro de 2012 15:11

Não sou médica, mas como advogada gosto sempre de me colocar no lugar do outro, tentar entender suas razões e aspirações. Creio que esse exercício não deve ser praticado só pelos profissionais da minha categoria, mas também por muita gente que se preocupa com o outro e quer ajudá-lo.

No meu pensamento mais primitivo, imagino que alguém que escolheu a medicina como carreira é aquele que gosta da vida e quer lutar por ela, curando seus doentes. Numa outra instância mais sofisticada do pensamento, apuro que médico é um ser como qualquer outro, quer ter uma vida digna antes de mais nada. Estar de bem com ela para cuidar bem dos doentes e realizar bem sua tarefa.

E o que é estar de bem com ela, do ponto de vista profissional? Ter um bom trabalho, um consultório legal, uma boa clientela? Talvez sim! Mas como fazer isso quando você acabou de ser formar, não tem o capital pra montar um consultório bacana e tem de trabalhar em três lugares diferentes, varando noites em plantões para sobreviver?

A maior parte dos médicos recém-formados ingressa numa operadora de saúde ou cooperativa médica para poder dar início à vida profissional. Ao fazer isso, ele já terá estampado no livreto ou no site da empresa o seu nome, o que lhe renderá muitos pacientes, dependendo de sua atuação.

Já vai longe o tempo em que médicos renomados montavam consultórios para seus filhos que se tornariam igualmente renomados e já tinham clientela indicada pelo pai. Eles existem, são poucos e cobram no mínimo R$ 500,00 a consulta, mas a maioria dos profissionais é refém dos planos de saúde. Por esta razão assistimos a várias paralisações e protestos nas últimas semanas, em que 18 Estados brasileiros pararam de atender planos de saúde, reivindicando melhor remuneração, clareza nos critérios de reajuste estabelecido em contrato e o fim da interferência na relação médico-paciente.

O CFM (Conselho Federal de Medicina) afirma que a suspensão do atendimento não afetará os serviços de urgência e emergência. Em dois anos, essa é a quarta vez que os médicos anunciam a paralisação.

Matéria publicada na imprensa diz que de acordo com o vice-presidente do CFM as receitas dos planos de saúde no Brasil crescem, em média, 14% ao ano, mas o reajuste não chega até aos médicos. Segundo ele, o valor pago por consulta realizada já chegou a representar 40% dos gastos pelas operadoras, mas atualmente fica entre 14% e 18%.

Dados da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) indicam que, entre 2003 e 2011, a receita das operadoras cresceu 192%, enquanto o valor médio pago por consulta aumentou 65%. Cálculos da própria categoria, entretanto, indicam que o reajuste foi de 50%.

Diante desses fatos, como acabar com a distância tão grande entre mundos (um que ganha 500 e outro não ganha nem 50 por consulta), novamente vem a pergunta: qual o sonho de um médico? Acho que a resposta é, antes de tudo, "respeito", que todos merecem, especialmente aqueles que cuidam de vidas. Os que estipulam regras aviltantes e injustas não estão imunes de adoecer um dia, quando saberão o valor de um médico que, com dignidade e remuneração adequada, poderá tratar dele com mais atenção e cuidado.

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* Renata Vilhena Silva é sócia-fundadora do escritório Vilhena Silva Sociedade de Advogados, especializada em Direito à Saúde, e autora das publicações "Planos de Saúde: Questões atuais no Tribunal de Justiça de São Paulo" e "Direito à Saúde: Questões atuais no Tribunal de Justiça".

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