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Os limites ao direito de defesa

Os limites impostos ao manejo do HC são criticados pela advogada.

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Atualizado em 26 de fevereiro de 2013 14:39

Já é difícil compreender e aceitar os limites impostos ao manejo do habeas corpus, deixando cidadãos órfãos da prestação jurisdicional e impedindo que pretensões absolutamente legítimas sejam conhecidas por nossos tribunais. É bom lembrar que somos um país de miseráveis e que a população carcerária é formada em sua maioria por pessoas que sequer tem condições de contratar um defensor. Daí porque, o habeas corpus sempre foi a medida mais democrática - porque não tem rigor formalístico e sequer precisa ser impetrado por advogado - de forma a permitir que todos tenham acesso à Justiça. A indignação externada, no entanto, vai além e retrata os limites impostos ao próprio direito de defesa.

Depois de anos, estupefata, descobri que há limite temporal para se arguir uma ilegalidade absoluta! Que mesmo o tempo sendo um fator absolutamente abstrato, porque os efeitos de uma ilegalidade nele se protraem indefinidamente, o mero formalismo não esculpido em nenhuma norma concreta impede que uma nulidade retumbante seja reconhecida.

Com todo respeito aos que pensam em contrário, sempre acreditei (e acreditarei) que não é possível restringir a possibilidade de perquirir a violação ao direito de defesa e do devido processo legal por que determinados anos se passaram da ocorrência da ilegalidade.

Apenas para dividir o caso concreto: um cidadão se viu processado pelo crime de apropriação indébita previdenciária e durante a ação penal foi constituído advogado dativo para defendê-lo, o qual não foi intimado pessoalmente do julgamento do Recurso em Sentido Estrito interposto pelo MPF contra decisão que extinguiu a sua punibilidade pela anistia. Embora o denunciado tenha posteriormente constituído defensor, nenhum daqueles que atuou no processo, discutiu a matéria, tampouco, recorreram do acórdão do recurso de apelação que, salvo melhor juízo, continha inúmeras nulidades, deixando a condenação transitar em julgado e expedir-se mandado de prisão.

Onze anos depois, diante da jurisprudência pacífica dos Tribunais Superiores no sentido de que há nulidade absoluta pelo cerceamento de defesa imposto ao acusado quando não há intimação pessoal do defensor dativo, procurada, impetrei habeas corpus perante o Superior Tribunal de Justiça. A egrégia Procuradoria Geral da República em seu parecer embora tenha opinado pela denegação da ordem, reafirmou que a hipótese era causa de nulidade absoluta. Da mesma forma, a i. Relatora do habeas corpus concordou com a existência de nulidade. No entanto, os 11 anos que intermediaram o julgamento nulo e a impetração do habeas corpus em 2010 foram a causa de afastamento da ilegalidade arguida. A pretexto de uma invocada PRECLUSÃO TEMPORAL, a nulidade absoluta não foi reconhecida.

A irresignação que compartilho, por óbvio, vem da crença que uma injustiça não pode se perpetuar aos olhos do Judiciário, simplesmente porque ninguém antes, durante ou depois enxergou ou discutiu determinada ilegalidade. Se uma causa é considerada nulidade absoluta é porque aquele determinado fato jamais poderia ter acontecido e, se assim é, enquanto os efeitos processuais da condenação subsistirem, esta pode e deve ser reconhecida, ainda que de ofício. Em razão disto, a arguição ao desrespeito às garantias constitucionais não pode encontrar limites temporais, não se podendo prestigiar o excesso de formalismo em detrimento da prestação jurisdicional quando se tem reflexo no jus libertatis do cidadão.

Com todo respeito, a preclusão temporal no processo penal deve ser expungida como fundamento para deixar de se conhecer e reconhecer uma ilegalidade absoluta permitindo que os direitos e garantias sejam eternizados.

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*Carla Domenico é sócia do Carla Domenico Escritório de Advogados.

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