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ADIn 2588: acabou mesmo a discussão para "coligadas" fora de "paraíso fiscal"?

Alexandre Siciliano Borges e Livia De Carli Germano

No início deste mês o STF finalizou o julgamento da ADIn , que questionava a incidência de IR e CSLL sobre lucros auferidos por empresas coligadas e controladas no exterior.

segunda-feira, 17 de junho de 2013

Atualizado em 14 de junho de 2013 13:53

No início deste mês o STF finalizou o julgamento da ADIn 2588, que questionava a incidência de IR e CSLL sobre lucros auferidos por empresas coligadas e controladas no exterior. Mas, em vez de por fim ao debate, a decisão, além de trazer novamente à tona o tema dos efeitos dos tratados internacionais em matéria fiscal, pode fomentar a discussão sobre os conceitos de "coligada" e "paraíso fiscal".

A ata de julgamento da ADIn 2588 registra que o artigo 74 da MP 2.158-35/01 - o qual obriga as pessoas jurídicas a oferecerem à tributação, no Brasil, os lucros das suas coligadas e controladas situadas no exterior - "não se aplica às empresas "coligadas" localizadas em países sem tributação favorecida (não "paraísos fiscais"), e que o referido dispositivo se aplica às empresas "controladas" localizadas em países de tributação favorecida ou desprovidos de controles societários e fiscais adequados ("paraísos fiscais", assim definidos em lei)."

Ocorre que os termos utilizados no julgamento da ADIn não têm uma definição legal única e comportam interpretações diversas.

O termo "coligada" é definido na lei das S/A e no Código Civil. Em 2003, quando a ministra Ellen Gracie proferiu o seu voto na ADIn segregando o tratamento de coligadas e controladas, as definições eram praticamente idênticas e faziam referência à sociedade de cujo capital outra sociedade participa com 10% ou mais sem controlá-la. Todavia, a lei 11.941/09 alterou o conceito de coligada da lei das S/A, que passou a ser sociedade na qual a investidora tenha influência significativa, sendo presumida essa influência quando a participação é de mais de 20% mas sem controle.

Segundo o artigo 46 da lei 11.941/09, o novo conceito de coligada somente deve ser utilizado para os propósitos previstos na lei das S/A, sendo que para os propósitos previstos em leis especiais deve ser considerada a definição do Código Civil. A conclusão lógica seria de que a MP 2.158-35/01 é lei especial e que portanto o conceito de coligada a ser utilizado para tal fim é o do Código Civil, no entanto, caso o acórdão da ADIn 2588 não trate especificamente desse "detalhe", a concretização de um mínimo de segurança jurídica pode ficar prejudicada.

Quanto à definição de "paraísos fiscais", a ata de julgamento da ADI 2588 parece indicar que o termo coincide com a atual definição de PTF - "Pais com Tributação Favorecida" constante do artigo 24 da lei 9.430/96. Contudo, o conceito de PTF também sofreu alterações legislativas nos últimos anos e atualmente não necessariamente equivale a "paraíso fiscal".

Na redação original do artigo 24 da lei 9.430/96, PTF definia o "país que não tribute a renda ou que a tribute a alíquota máxima inferior a 20%". O tratamento surgiu no contexto da legislação sobre preços de transferência (artigos 18 a 22 da lei 9.430/96). A partir daí a denominação seria utilizada como sinônimo de "paraíso fiscal" e a Receita Federal passou a editar as chamadas listas de paraísos fiscais (por exemplo, nas INs SRF 164/99 e 33/01).

Em 2002, a MP 22 determinou que as regras sobre preços de transferência seriam aplicáveis também a operações realizadas com "país ou dependência cuja legislação interna oponha sigilo relativo à composição societária de pessoas jurídicas ou à sua titularidade". A Receita Federal editou, então, a IN SRF 188/02, que continha a relação de países ou dependências com tributação favorecida ou que oponham sigilo relativo à composição societária de pessoas jurídicas.

Todavia, a definição legal de PTF constante do artigo 24 da lei 9.430/96 permaneceu, até então, inalterada. Inaugurou-se aí a divergência de critérios para a definição de "paraísos fiscais" já que, para algumas legislações - como a aplicável aos chamados "Investimentos 2.689" (investimentos estrangeiros realizados segundo as normas do Conselho Monetário Nacional) - devia ser considerado apenas o "país que não tribute a renda ou que a tribute a alíquota máxima inferior a 20%", já para fins da legislação sobre preços de transferência, além desse critério, era aplicável também o do sigilo.

Na prática, a Receita Federal parece se comportar como se tais critérios fossem sinônimos, o que não ocorre necessariamente.

Vale lembrar que em 2008 a lei 11.727/08 alargou o conceito de PTF constante do art. 24 da lei 9.430/96, incluindo também o critério de "aquele cuja legislação não permita o acesso a informações relativas à composição societária de pessoas jurídicas, à sua titularidade ou à identificação do beneficiário efetivo de rendimentos atribuídos a não residentes". Com base nisso, a Receita Federal editou a IN RFB 1.037/10, que revogou a IN SRF 188/02 e passou a relacionar tais jurisdições no artigo 1º.

Ocorre que algumas legislações - como a relativa aos Investimentos 2.689 - permanecem fazendo referência, exclusivamente, a "país que não tribute a renda ou que a tribute a alíquota máxima inferior a 20%". Ou seja, para tais normas, o conceito de "paraíso fiscal" permanece diferente do PTF constante do art. 24 da lei 9.430/96.

Espera-se, portanto, que o acórdão do STF trate especificamente dessas questões, sob pena de trazer mais questionamentos que respostas a essa discussão sobre "lucros do exterior" que já dura mais de 12 anos.

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* Alexandre Siciliano Borges e Livia De Carli Germano são respectivamente sócio e associada de Lobo & de Rizzo Advogados.

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