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Notas sobre o contraditório no projeto do novo CPC

"Em síntese feita pela doutrina, o contraditório quer dizer que há, para as partes, no processo judicial ou administrativo, direito a dialogar com quem vá decidir, com o objetivo de efetivamente influir na construção do processo mental de tomada da decisão", afirma o autor.

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Atualizado em 14 de agosto de 2013 11:20

A comissão especial composta na Câmara Federal para debater o projeto do Novo CPC acaba de aprova-lo e remetê-lo para votação no plenário da Câmara dos Deputados. Após sua aprovação nesse novo quórum, voltará ao Senado, para nova discussão e votação, na medida em que há profundas alterações feitas pelos deputados Federais no projeto originário do Senado.

Um dos pontos que merece nossa observação e reflexão é o que trata da sensível ampliação do contraditório.

O art. 5º da CF, ao tratar dos direitos e garantias fundamentais dispõe, no inciso LV, expressamente que: "aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes".

É, portanto, o contraditório garantia de índole constitucional, constituindo-se em vetor indicativo da conduta a ser observada tanto pelo legislador quanto pelo juiz ou por quem tenha poderes decisórios, no plano administrativo, público ou privado.

Em síntese feita pela doutrina, o contraditório quer dizer que há, para as partes, no processo judicial ou administrativo, direito a dialogar com quem vá decidir, com o objetivo de efetivamente influir na construção do processo mental de tomada da decisão. Esse diálogo compreende também o dever de informação e o correspondente direito de reação, tanto no que diz respeito ao pedido inicial quanto no que se refere aos atos do procedimento que ocorram em seguida.

Como muito recentemente afirmei em outro espaço, o processo civil não deve admitir mecanismos com potencialidade de surpreender a parte e a garantia do contraditório é a barreira que permite às partes se proteger contra qualquer surpresa. Por outro lado, o contraditório é a garantia de que haverá, entre juiz e partes, efetiva cooperação para que o processo alcance seus próprios objetivos, dentre os quais o da efetividade da jurisdição. Embora não se possa afirmar que a cooperação integra o contraditório, pode-se dizer, sem medo de errar, que se trata de princípios "coirmãos".

O projeto do novo CPC contém amplo conjunto de regras que dão maior concreção ao contraditório.

A primeira delas é a que está prevista no art. 9º, segundo o qual Não se proferirá decisão contra uma das partes sem que seja esta previamente ouvida. É a garantia da audiência prévia, diante de qualquer movimento capaz de resultar em decisão que contrarie os interesses da parte.

Há exceções, fruto da ponderação de princípios, previstas no parágrafo único. Essas exceções se referem às hipóteses de tutela antecipada de urgência e da evidência.

Dispositivo verdadeiramente inovador é o contido no art. 10 do projeto. Trata-se de proposta de regra que assimila o que parte da doutrina e setores da jurisprudência preconizam já há algum tempo. Prevê essa regra que nenhum órgão jurisdicional poderá decidir com base em fundamento de que não se tenha dado às partes conhecimento (direito à informação) e oportunidade de manifestação, mesmo que de matéria de ordem pública se trate.

Por essa regra proposta no projeto do novo CPC, mesmo em matérias de que o juiz pode conhecer de ofício, a decisão somente poderá ocorrer posteriormente à informação para as partes e à abertura de prazo para eventual manifestação. Isso é uma boa novidade, porque até pouco tempo atrás se considerava inexistir qualquer necessidade de o juiz oportunizar o contraditório quando de decisão relativa a matéria de ordem pública.

Há muitas críticas a esse dispositivo, fundamentalmente no sentido de que a necessidade de contraditório prévio a decisão a respeito de matéria de que possa o juiz conhecer de ofício causará maior demora no procedimento, com prejuízo para a razoável duração do processo. Não concordo com essa afirmação. Se o processo é moroso, isso certamente não se deve a alguns dias a mais, destinados ao exercício pleno de garantia constitucional. Há outras causas estruturais e culturais (a burocracia, por exemplo; os "tempos mortos", de que fala a doutrina).

São muitos, portanto, a meu ver, os benefícios. Deixando de haver decisões não antecedidas de contraditório, haverá, ao menos em tese, possibilidade de redução do volume de recursos interpostos desse tipo de decisão, em que se alega, fundamentalmente, violação ao contraditório.

A redução de recursos por meios legítimos e que não se afastem das garantias constitucionais é desejada por todos que esperam, com isso, maior organização e dinamicidade da atividade jurisdicional.

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* Luiz Rodrigues Wambier é advogado do escritório Wambier & Arruda Alvim Wambier Advocacia e Consultoria Jurídica.




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