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A contabilidade para as pequenas e médias empresas

Dizer que as demonstrações contábeis são obrigatórias às empresas do Simples é caminhar na contramão do próprio Simples, que prevê a elas um método desburocratizado.

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Atualizado em 7 de novembro de 2013 09:48

A LC 123/06 diz que as microempresas e empresas de pequeno porte devem ter obrigatoriamente o livro-caixa. O mesmo ocorre com as empresas do lucro presumido de IRPJ/CSLL, já que o regulamento do imposto de renda diz que essas empresas podem adotar forma simplificada para fins fiscais, mantendo apenas o livro-caixa. Isso é justificado pelo fato de microempresas, empresas de pequeno porte e também empresas do lucro presumido não estarem autorizadas a deduzir despesas à apuração do lucro tributável, afinal, pela forma simplificada em que se enquadram, o imposto é apurado por um percentual incidente sobre a receita bruta, nada mais.

Entretanto, há quem sustente que essas regras valem apenas para a fiscalização de tributos, não para a empresa em si mesma. Essa corrente se baseia no art. 1.179 do CC, segundo o qual "o empresário e a sociedade empresária são obrigados a seguir um sistema de contabilidade, mecanizado ou não, com base na escrituração uniforme de seus livros, em correspondência com a documentação respectiva, e a levantar anualmente o balanço patrimonial e o de resultado econômico". É nesta regra do CC que se baseiam os entendimentos do Conselho Federal de Contabilidade (deve ser dito que os entendimentos do CFC não são normas obrigatórias, apenas entendimentos, nada mais).

Sou da opinião de as regras do art. 1.079 do CC e do CFC devem ser analisadas com algumas reservas em relação a microempresas e empresas de pequeno porte. Isto porque, pelo fato de as demonstrações contábeis/financeiras dessas empresas não serem úteis aos Fiscos Federal, estadual e municipal para a apuração de tributos (apenas o livro-caixa, de onde serão extraídas as informações necessárias à apuração da receita bruta tributável que será informada na declaração da pessoa jurídica do Simples), não há muita razão para as empresas manterem esses registros se o custo de sua elaboração não se justificar. E mais ainda, as microempresas e empresas de pequeno porte não se relacionam com o mercado da mesma forma que outras grandes empresas, por exemplo, aquelas que tem capital social em bolsa de valores e/ou que são acompanhadas por entidades governamentais, como a CVM e outros órgãos reguladores.

Afinal, pergunto-lhe: se a microempresa e/ou empresa de pequeno porte não tem capital em bolsa de valores, qual a razão de abrir detalhadamente as demonstrações contábeis se não existem investidores em potencial? Se os Fiscos não necessitam ter consigo as demonstrações contábeis detalhadas, porque a empresa incorrida em gastos para elaborá-las?

Dizer que as demonstrações são obrigatórias às empresas do Simples é caminhar na contramão do próprio Simples, que prevê a elas um método simples e desburocratizado.

Contudo, não se pode deixar de negar que a existência dessas demonstrações pode ser relevante para outros fins. A elaboração de uma contabilidade detalhada traz alguns benefícios, como, por exemplo, a demonstração mais certa dos custos e despesas da empresa, eventuais gargalos, averiguação de excesso e/ou falta de gastos em folha de pagamento ou outras áreas, etc. Outro exemplo é a possibilidade de a empresa ter mais facilidade na obtenção de empréstimos bancários, afinal, demonstrando detalhadamente à instituição financeira a sua saúde financeira, é mais provável que o empréstimo quisto seja concedido. Mas, veja, tudo isso são benefícios que a empresa do Simples pode ter se elaborar balanços e demonstrações contábeis, mas não quer dizer que constituam obrigações que devam ser necessariamente observadas.

A norma do art. 1.179 do CC deve ser interpretada com base nos fins jurídicos perseguidos: microempresas e empresas de pequeno porte devem ter tratamento diferenciado. Tanto é assim que o § 2º do mesmo art. 1.079 do CC dispensa o pequeno empresário da obrigação de manter demonstrações contábeis. Ou seja, prevalecem as regras do art. 26 da LC 123/06, segundo o qual as microempresas e empresas de pequeno porte devem apenas manter, por obrigação, o livro-caixa. Nesses termos, a manutenção de outras demonstrações contábeis é uma faculdade do empresário, não obrigação.

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* Adolpho Bergamini é sócio da área Tributária do escritório Bergamini Advogados Associados.

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