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A regulamentação do adicional de periculosidade devido ao motoboy

De se notar que aludida regulamentação trouxe efetivos parâmetros necessários ao correto enquadramento das denominadas "atividades perigosas em motocicleta", em consonância com o novo parágrafo quarto do art. 193 da CLT, introduzido pela lei 12.997/14.

domingo, 2 de novembro de 2014

Atualizado em 31 de outubro de 2014 10:43

O Ministério do Trabalho e Emprego, no último dia 13/10/14, por meio de sua portaria 1.565, publicada no DOU, em 14/10/14, acrescentou o anexo 5 à NR 16, a qual trata das "atividades e operações perigosas".

De se notar que aludida regulamentação trouxe efetivos parâmetros necessários ao correto enquadramento das denominadas "atividades perigosas em motocicleta", em consonância com o novo parágrafo quarto do art. 193 da CLT, introduzido pela lei 12.997/14.

É certo que se tem notícia de que muitos sustentaram, à época, ser imediatamente devido o adicional de periculosidade aos trabalhadores em motocicleta. Para esse entendimento, desde o dia 18/6/14, quando houve a promulgação da citada lei 12.997/14, os trabalhadores que atuavam no exercício da função de motoboy, mototransporte, mototaxista, motofrete, dentre outras, já fariam jus ao correspondente adicional.

No entanto, parece caminhar melhor a posição daqueles que defendem que os efeitos pecuniários passaram a ser devidos somente a partir de 14/10/14, data de inclusão da respectiva atividade nos quadros aprovados pelo Ministro do Trabalho e Emprego (CLT, art. 196 c/c NR-16, do MTE).

Ultrapassada tal questão, registra-se que as atividades laborais desempenhadas com o uso de motocicleta - ou "motoneta", conforme portaria ministerial - exigem, para fins de seu enquadramento como atividades perigosas, que haja o deslocamento dos trabalhadores em vias públicas. Logo, o exercício de atividades profissionais em motocicleta ou motoneta em locais privados na se enquadra como perigoso.

Ademais disso, também não foi considerado perigoso o trajeto percorrido pelo trabalhador em motocicleta entre sua residência e o local de trabalho e vice-versa. Isto é, se o empregado apenas fizer uso da motocicleta para ir e voltar de seu local de trabalho não terá direito ao adicional de periculosidade.

Igual raciocínio aplica-se também à hipótese em que, mesmo que utilize da motocicleta ou motoneta durante o horário de seu expediente, tal uso se dê de forma eventual, assim considerado o fortuito, ou que, sendo habitual, ocorra por tempo extremamente reduzido.

Uma outra situação negativa ao direito do recebimento do adicional em questão, e que foi expressamente contemplada pelo anexo 5 da NR 16 da portaria 3.214/78 do MTE, diz respeito às atividades em veículos que não necessitem de emplacamento ou que não exijam carteira nacional de habilitação para sua condução. Este parece ser o caso, por exemplo, do chamado "cicloboy" ou "bike courier", trabalhador que se utiliza de bicicleta no exercício de suas atividades profissionais e que ganhou recente destaque por força do contínuo aumento das "ciclofaixas" na Cidade de São Paulo.

Entrementes, importante salientar que a portaria MTE 1.565, de 13 de outubro de 2014, também alterou os itens 16.1 e 16.3 da NR 16. E, neste último item, passou a dispor, expressamente, ser de "responsabilidade do empregador a caracterização ou a descaracterização da periculosidade, mediante laudo técnico elaborado por Médico do Trabalho ou Engenheiro de Segurança do Trabalho, nos termos do artigo 195 da CLT".

Assim, há quem tenha passado a entender que, agora, para fins de pagamento do adicional, necessária se faz a prévia caracterização da periculosidade por meio de laudo técnico, a cargo de Médico do Trabalho ou Engenheiro do Trabalho, por representarem profissionais devidamente qualificados na forma do art. 195 da CLT.

Isso porque, e no caso específico das atividades em motocicleta ou motoneta, a norma ministerial afastou a exigência de pagamento do adicional de periculosidade nas hipóteses em que tais atividades sejam realizadas eventualmente ou por tempo extremamente reduzido.

Ocorre, porém, que a questão é bastante polêmica, notadamente quando se considera possível o pagamento do adicional de periculosidade por mera liberalidade da empresa, ou por força de norma coletiva de trabalho, situação esta que torna incontroversa a existência de trabalho em condições perigosas. Ainda que assim não fosse, sustenta-se, aqui, ser desnecessário o laudo técnico, na medida em que basta a comprovação de que o empregado, no exercício de suas atividades, trabalhe efetivamente conduzindo uma motocicleta.

De resto, e em caso de eventuais discussões judiciais a serem enfrentadas e decididas pela Justiça do Trabalho, frise-se que a atual regulamentação não tem efeitos retroativos. Em outras palavras, os trabalhadores inseridos na norma regulamentar não terão direito ao percebimento do adicional de periculosidade pelo labor prestado antes do advento do atual normatização. Isso, pois, por fundamento no art. 6º da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro, que traz a previsão do princípio da irretroatividade.

Deste modo, a lei não deve alcançar situações anteriores a sua vigência, sendo que, entrando em vigor, terá efeito imediato e geral, respeitados o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada (CF, art. 5º, XXXVI). O respeito ao princípio da irretroatividade decorre da necessidade de se obter segurança jurídica, impedindo-se que lei posterior venha a reger fatos ocorridos antes de sua plena aplicabilidade.

Por fim, o adicional de periculosidade será devido no importe de 30% incidente sobre o salário base, sem os acréscimos resultantes de gratificações, prêmios ou participações nos lucros da empresa, consoante predispõe a disciplina do parágrafo primeiro do art. 193 do texto celetista.
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*Ricardo Souza Calcini é assessor de desembargador, especialista em Direito Processual Civil pela Escola Paulista da Magistratura do TJ/SP e especialista em Direito Social pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.

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