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A desoneração das exportações indiretas como medida de justiça fiscal

Os produtores rurais e agroindustriais, diferente dos demais empresários, recolhem a contribuição do INSS sobre o faturamento de suas empresas e não sobre a folha de pagamentos dos seus funcionários, por exigência da legislação de regência (Leis nº 8.870/94 e 10.256/01).

quinta-feira, 9 de março de 2006

Atualizado em 8 de março de 2006 12:20


A desoneração das exportações indiretas como medida de justiça fiscal



O drama atual vivido pelos produtores rurais e agroindústrias


André Ricardo Passos de Souza*


Os produtores rurais e agroindustriais, diferente dos demais empresários, recolhem a contribuição do INSS sobre o faturamento de suas empresas e não sobre a folha de pagamentos dos seus funcionários, por exigência da legislação de regência (Leis nº 8.870/94 e 10.256/01).


Entretanto, desde a edição da Emenda Constitucional nº. 33, de dezembro de 2001, que veio a tornar imune da cobrança de contribuições sociais, dentre as quais as destinadas ao INSS, as receitas decorrentes da exportação, não se pode mais exigir dos produtores rurais e agroindustriais a aludida contribuição ao INSS incidente sobre receitas de exportação.


Ocorre que, desde a edição da Instrução Normativa/SRP nº. 3, de 14 de julho de 2005, as autoridades previdenciárias vêm tentando exigir dos produtores rurais (pessoas físicas e jurídicas) e agroindústrias o pagamento da contribuição ao INSS sobre as receitas decorrentes das vendas de seus produtos às empresas comerciais exportadoras e às trading companies.


Tal exigência decorre do fato de a referida norma fazer uma espúria distinção entre exportações diretas e indiretas, em flagrante afronta à Constituição Federal de 1988 e ao conjunto das normas que regem o comércio exterior e a tributação destas operações no Brasil. Explicamos.


A Constituição Federal de 1988, em seu art. 149, parágrafo 2º (norma introduzida pela citada Emenda Constitucional nº. 33, promulgada em dezembro de 2001), estatui que "as contribuições sociais (dentre as quais se inclui a contribuição ao INSS, conforme salientamos) e de intervenção no domínio econômico...não incidirão sobre as receitas decorrentes de exportação".


Dentro deste contexto, as vendas efetuadas às empresas comerciais exportadoras e trading companies com finalidade específica de exportação, comumente denominadas como "exportações indiretas", sempre foram tratadas pela legislação que rege o comércio exterior de forma idêntica às "exportações diretas" e, portanto, sempre usufruíram dos benefícios fiscais concedidos à exportação de produtos nacionais.


De fato, desde a edição do Decreto-lei nº. 1.248/72, os produtores que efetuam vendas a empresas comerciais exportadoras têm assegurados todos os "benefícios fiscais concedidos por lei para incentivo à exportação" (art. 3º, caput).


O legislador infraconstitucional utiliza, desde então, a técnica da equiparação entre as exportações diretas e indiretas para fins de aplicação dos benefícios fiscais à exportação.


Assim é que, por exemplo, a Lei Complementar nº. 87/96 (Lei Kandir) que regula a cobrança do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS estatui, em seu artigo 3º, inciso II, que o imposto não incide sobre operações e prestações que destinem ao exterior mercadorias, inclusive produtos primários e produtos industrializados semi-elaborados, ou serviços; e no inciso I, do parágrafo primeiro deste mesmo artigo, equiparou às operações de que trata o inciso II (exportações diretas) a saída de mercadoria realizada com o fim específico de exportação para o exterior destinada a empresa comercial exportadora, inclusive tradings ou outro estabelecimento da mesma empresa (exportações indiretas).


Nas legislações do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI e das contribuições ao PIS e COFINS, estão postos mecanismos idênticos de desoneração das exportações via tradings. Tudo em obediência à sistemática que ficou consagrada desde a edição do Decreto-lei nº. 1.248/72 e que foi integralmente recepcionada pela Constituição Federal de 1988.


Inclusive o próprio INSS reconhecia o direito dos produtores rurais e agroindustriais à imunidade no pagamento das contribuições sobre as receitas de exportações quando estas fossem realizadas via comerciais exportadoras ou tradings, conforme se verifica da norma do art. 252 da Instrução Normativa INSS/DC nº. 100/03 que assim dispunha: "Não incidem as contribuições sociais de que trata este Capítulo sobre as receitas decorrentes de exportação de produtos rurais, cuja comercialização ocorra a partir de 12 de dezembro de 2001, por força do disposto no inciso I do § 2º, do art. 149, da Constituição Federal, alterado pela Emenda Constitucional nº 33, de 11 de dezembro de 2001", na medida em que não fazia qualquer distinção quanto exportações diretas ou indiretas.


Tal distinção só foi feita por aquele órgão a partir da edição das normas constantes dos parágrafos 1º e 2º do art. 245 da Instrução Normativa/SRP nº 3, de 14.7.2005, através das quais o INSS procurou restringir o alcance da norma imunizante às operações realizadas diretamente pela agroindústria com adquirente domiciliado no exterior, amesquinhando, em nossa opinião, ilegitimamente, o alcance da norma constitucional que recepcionou todo o plexo das normas que regiam o comércio exterior e seus incentivos fiscais no Brasil.


Esse entendimento tem encontrado guarida no Poder Judiciário que vem se posicionando em defesa do direito dos produtores rurais e agroindustriais à imunidade quanto ao pagamento das contribuições ao INSS decorrente das receitas de exportações realizadas via comerciais exportadoras e trading companies, através de algumas decisões em sede de liminar concedidas aos empresários agrícolas.


Dentre estas decisões, cabe destacar a decisão recentemente proferida pelo Exmo. Desembargador Federal André Nabarrete, da Quinta Turma do Tribunal Regional da Terceira Região de São Paulo, que deferiu nos autos do processo nº. 2005.03.00.096941-9, pleito da União da Agroindústria Canavieira do Estado de São Paulo - UNICA que tinha por objeto a obtenção de efeito suspensivo ativo (espécie de liminar) de forma a afastar a cobrança pelo INSS de contribuições previdenciárias sobre as receitas decorrentes de exportações realizadas por empresas comerciais exportadoras ou trading companies.


Ademais, cumpre ressaltar que a Associação Brasileira das Empresas Trading - ABECE ajuizou perante o Supremo Tribunal Federal, Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADI nº. 3572, visando a obtenção de liminar para suspender a eficácia dos parágrafos 1º e 2º do art. 245 da Instrução Normativa/SRP nº. 3/05 e, ao final, a declaração de inconstitucionalidade da norma questionada. A liminar pleiteada não foi deferida e a ação aguarda julgamento pelo Supremo Tribunal Federal.


Ocorre que enquanto o Supremo Tribunal Federal não se pronunciar definitivamente sobre a questão, os produtores rurais e agroindustriais que efetuem vendas às comerciais exportadoras ou trading companies estarão diante do seguinte impasse: ou passam a recolher a contribuição ao INSS sobre as receitas de exportações indiretas que se apresentam como parcela significativa das transações internacionais, aumentando o custo de seus produtos e ficando vulneráveis à concorrência internacional pela perda de competitividade no preço final de seus produtos, ou ajuízam medida judicial para salvaguardar seus direitos.


Desta forma, a manutenção da exigência do INSS sobre as exportações indiretas implica em espúria distinção entre os produtores rurais e agroindustriais que comercializam sua produção diretamente com empresas situadas no exterior e aqueles que comercializam seus produtos com trading companies e comerciais exportadoras estabelecidas no Brasil, violando o princípio da isonomia insculpido na Constituição Federal de 1988, razão pela qual o afastamento da norma restritiva editada pelo INSS é, além de medida de justiça, a forma de manter a competitividade dos produtos rurais e agroindustriais brasileiros.

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*Advogado do escritório Rayes, Sevilha e Buranello Advogados









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