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Está em vigência o adicional de periculosidade por radiações ionizantes?

Após 15 anos de existência do contestado adicional, a Portaria 496/02 revogou a Portaria 3.393/87, colocando fim ao malsinado adicional de periculosidade por radiações ionizantes.

sexta-feira, 24 de novembro de 2017

Atualizado em 23 de novembro de 2017 13:15

Anteriormente à lei 12.740/12, a vigência do adicional de periculosidade por radiações ionizantes já era amplamente refutada. Desde a primeira promulgação de tal adicional, por meio da Portaria 3.393/87, era discutido se o Ministério do Trabalho teria competência para instituir agente perigoso por meio de portaria, vez que o art. 7º da CF, inciso XXIII, prescreve que somente lei poderia instituir novo agente perigoso, in verbis:

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

...

XXIII - adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei;

Após 15 anos de existência do contestado adicional, a Portaria 496/02 revogou a Portaria 3.393/87, colocando fim ao malsinado adicional de periculosidade por radiações ionizantes, inclusive reconhecendo que: (1) as radiações ionizantes caracterizam-se como insalubres, (2) a periculosidade por radiações ionizantes não encontra amparo legal no art. 193 da CLT e (3) o ato administrativo que promulgou o adicional de periculosidade por radiações ionizantes foi ilegal, in verbis:

Considerando que as atividades que expõem os trabalhadores a radiações ionizantes, nos termos da Portaria 4, de 11 de abril de 1994, da Secretaria de Segurança e Saúde no Trabalho, caracterizam-se como insalubres;

Considerando que a caracterização dessas atividades como perigosas, nos termos da Portaria 3.393, de dezembro de 1987, não encontra amparo no art. 193, caput, da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei 5.452, de 1º maio de 1943;

Considerando incumbir à Administração Pública a revisão dos atos administrativos ilegais ou inconvenientes, ...

Estranhamente, apenas 4 meses depois da revogação do adicional, caracteristicamente no início de um mandato presidencial populista, por meio de outra portaria do Ministério do Trabalho, foi novamente instituído o adicional de periculosidade por radiações ionizantes. Parece óbvio que o governo recém empossado foi vítima de enorme lobismo para revigorar tal adicional; no entanto, sem subtrair os méritos da mudança legislativa, poderia ter sido utilizado o instrumento correto para instituir novo agente perigoso, a lei.

Assim, a Portaria 518/03 do Ministério do Trabalho, ressuscitou o finado adicional de periculosidade por radiações ionizantes. Infelizmente a exposição de motivos da Portaria está totalmente baralhada. Ora se o adicional de periculosidade pressupõe o perigo de morte (acidente) e, o adicional de insalubridade, o risco à saúde (da exposição ao agente nocivo), jamais a criação do adicional de periculosidade por radiações ionizantes poderia ter como motivação o fato de que o agente é potencialmente prejudicial à saúde do trabalhador. Na segunda exposição de motivos melhor sorte não coube ao MTE. Admitir que o atual estado da tecnologia não permite evitar ou eliminar o risco (o correto seria perigo, pois se está tratando do adicional de periculosidade) em potencial de tais atividades, é admitir a total incompetência em manter e operar usinas nucleares no país. Abaixo transcrevemos a exposição de motivos contidos na 518/03 do Ministério do Trabalho:

CONSIDERANDO que qualquer exposição do trabalhador a radiações ionizantes ou substâncias radioativas é potencialmente prejudicial à sua saúde;

CONSIDERANDO, ainda, que o presente estado da tecnologia nuclear não permite evitar ou eliminar o risco em potencial oriundo de tais atividades;

Quase 10 anos depois, a lei 12.740/12, cuja finalidade foi instituir novo agente perigoso (roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial), ao dar nova redação ao art. 193 da CLT, nem ao menos fez menção ao agente radiações ionizantes, reconhecendo somente como agentes perigosos (1) os inflamáveis, (2) os explosivos e (3) energia elétrica.

Assim, de forma inequívoca e taxativa a lei dispôs que o adicional de periculosidade está limitado àqueles trabalhadores que exercem atividades ou operações perigosas com: I - inflamáveis, explosivos ou energia elétrica; e, II - roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial, estando definitivamente revogado o agente radiações ionizantes.

Além do que, se a lei posterior cuidou inteiramente da matéria de que tratava a anterior, nos termos do § 1º, do art. 2º, da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro, é cediço que a Portaria que dispunha sobre o pagamento do adicional de periculosidade aos trabalhadores expostos às radiações ionizantes foi revogada.

Como consequência empresas que ainda remuneram os trabalhadores com o adicional de periculosidade por radiações ionizantes podem imediatamente cessar tal pagamento, pela falta de amparo legal e, em consonância com o art. 5º, inciso II da CF, in verbis:

Art. 5º ...

...

II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;

Finalmente, por amor ao argumento, se o entendimento for diverso, inclusive em razão do disposto no art. 200, caput, e inciso VI, da CLT, nas Portarias 3.393/87 e 518/03 do Ministério do Trabalho, e na Orientação Jurisprudencial 345 do TST, está instaurada a existência de conflito de normas entre o art. 193, caput, incisos I e II e o art. 200 da CLT.

__________

*Antonio Carlos Vendrame é engenheiro de segurança do trabalho, perito judicial, professor com experiência nas áreas de segurança, saúde e meio ambiente e diretor da Vendrame Consultores.

Vendrame Consultores Associados Ltda

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