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O Instituto do bloqueio efetivo da prenotação do imóvel

A prenotação nada mais é que a apresentação de um título para registro, ou seja, o protocolo do título que se deseja registrar ou averbar na matrícula do imóvel, conforme dispõe o art. 182 da lei de Registro Públicos.

quarta-feira, 6 de junho de 2018

Atualizado em 23 de setembro de 2019 17:16

O crime de estelionato previsto no art. 171 do Código Penal sempre foi um crime pouco estudado na doutrina brasileira, por mais que este seja um dos crimes mais banalizados no mundo jurídico.

Dentro do círculo que rodeia o direito notarial e registral, infelizmente, o estelionato é um crime presente em diversos atos e, por tal razão, cheguei à conclusão e instituição do Bloqueio Efetivo da Prenotação do Imóvel.

Decidi escrever o presente artigo em primeira pessoa porque busco a compreensão plena do leitor, de forma didática e clara, para que, em um futuro próximo, os cartórios de notas e de registro de imóveis possam usar diariamente esse instituto.

Por mais audacioso que seja da minha parte, criar um instituto para o ramo do direito notarial e registral é, hoje, fundamental para o crescimento e aperfeiçoamento dessa área que diariamente é explorada.

O principal objetivo do artigo é mostrar que os cartórios de notas podem auxiliar os cartórios de registro de imóveis e, o judiciário em geral, ao bloquear a prenotação do imóvel assim que um ato de transferência é lavrado, bloqueando de imediato, a possibilidade de vendas múltiplas do mesmo imóvel, ou seja, a prática do crime de estelionato.

Atualmente, para a lavratura de uma escritura de compra e venda, por exemplo, são necessárias diversas certidões para garantir a segurança do negócio jurídico, sendo a principal certidão a de ônus reais do imóvel fornecida pelo cartório de registro de imóveis competente, que, de acordo com o art. 1º, IV, do decreto 93.240/86, possui validade de 30 dias corridos.

Na certidão de ônus deve constar todos os atos registrados e transcritos na matrícula do imóvel, e ainda, a existência de prenotações contidas no cartório emissor da certidão.

A prenotação nada mais é que a apresentação de um título para registro, ou seja, o protocolo do título que se deseja registrar ou averbar na matrícula do imóvel, conforme dispõe o art. 182 da lei de Registro Públicos.

Não há qualquer restrição para o pedido e emissão de certidões de ônus reais, uma vez que a matrícula do imóvel é pública e o oficial registrador não pode se esquivar a fornecer quantas forem requeridas (art. 16, §1º e art. 17, caput da lei de Registros Públicos), independentemente do seu destino, ou requerente.

Por tal razão, em decorrência da emissão de diversas certidões, o crime de estelionato, por venda múltipla de imóveis, é facilitado. Ou seja, estando o estelionatário, munido de todas as certidões, válidas, e sem quaisquer ônus, consegue este lavrar diversas escrituras de transferência, em sentido amplo, e por conseguinte praticar com facilidade o crime de estelionato, agindo todos os adquirentes de boa-fé.

Diante dessa situação, criou-se o princípio da prenotação, ou seja, o adquirente que prenotar o título aquisitivo primeiro terá o direito ao registro, restando os demais apenas ação de reparação de danos contra o estelionatário.

Entendo que o princípio da prenotação é usado como um paliativo ineficaz pois garante à qualquer adquirente o direito ao registro.

Para melhor compreensão, exemplifica-se com os personagens clássicos do direito.

Mélvio possui um imóvel em Copacabana com todas as certidões válidas. Caio, primeiro comprador, afirma à Mélvio que tem interesse no imóvel e agenda a lavratura da compra e venda para o dia 02 de fevereiro no 1º Ofício de Notas. Tício, segundo comprador, conhece o imóvel e informa à Mélvio que tem interesse em comprar o bem, e agenda a lavratura da escritura no dia 03 de fevereiro no 2º Ofício de Notas.

Ambas as escrituras são lavradas de boa-fé pelos notários, e ambas com certidões válidas. Caio, primeiro comprador, não possui inicialmente condições de arcar com o registro da escritura de compra e venda e decide aguardar mais alguns dias para prenotar o título aquisitivo, na esperança que seu direito estava resguardado após a lavratura do ato notarial. Porém, Tício, segundo comprador, sai do cartório de notas e imediatamente prenota a sua escritura no cartório de registro de imóveis. Com base no princípio da prenotado, Tício terá o direito ao registro, e caberá à Caio apenas ação de reparação de danos contra Mélvio.

O exemplo acima narrado mostra, claramente, que o princípio da prenotação é ineficaz, pois o primeiro comprador, ou seja, o que primeiro lavrou a escritura de compra e venda, perde seu direito ao imóvel, por não praticar um ato meramente burocrático.

O Instituto do Bloqueio Efetivo da Prenotação traz a eficiência da lavratura da escritura, para o ordenamento jurídico. Esse Instituto tem por objetivo bloquear a prenotação do imóvel assim que a escritura for lavrada, efetivando uma comunicação, oriunda do cartório de notas que lavrar a escritura, com todos os demais cartórios de notas e de registros.

Sendo assim, no caso acima exemplificado, Tício não conseguiria lavrar sua escritura de compra e venda, pois constaria no sistema nacional de notários e registradores, a lavratura da escritura de Mélvio para Caio, impossibilitando a venda do mesmo imóvel de Mélvio para Tício, bloqueando a venda múltipla e consequentemente, a prática do crime de estelionato.

Da mesma maneira que os cartórios utilizam sistemas nacionais informatizados para conferência de selo eletrônico, a viabilidade do Instituto do Bloqueio Efetivo da Prenotação se faz presente.

Em suma, o Instituto do Bloqueio Efetivo da Prenotação equipara-se à um sistema de blockchain, em busca do bloqueio da confiança e do bloqueio da prática do crime de estelionato. Sendo assim, afirmo que a tecnologia está constantemente atrelada ao direito, e que o direito notarial e registral deve abrir suas portas para a era digital.
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*Amanda Moreira Monteiro é advogada do 4º RGI.

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