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É justo pagar com a saúde por um plano de saúde?

Muitos dos que abriram mão dos planos, por não conseguir mais sustentar as mensalidades, têm recorrido aos serviços públicos, onerando ainda mais a capacidade do Sistema, que sofre com a falta de verbas.

sexta-feira, 24 de agosto de 2018

Atualizado em 23 de setembro de 2019 17:10

Se a ANS, Agência Nacional de Saúde Suplementar, não é capaz de frear os aumentos abusivos e regular o mercado - sua missão essencial, em tese -, o Ministério da Saúde teria o dever de tomar pra si a luta contra os desmandos dos planos e proteger o consumidor. O contínuo descaso das autoridades leva a crer que não têm noção do que lhes compete ou ignoram o assunto por levar vantagem. Já sabemos que as operadoras financiaram as campanhas eleitorais, mas o brasileiro não pode mais ser sacrificado.

No que diz respeito à saúde, a expressão "pagar um preço alto" pode ter dois sentidos: o de dispender muito dinheiro, com a contratação de um plano privado ou o de estar descoberto e ficar à mercê da sorte e do SUS (Sistema Único de Saúde), que embora preste um bom serviço em algumas áreas, vive uma grande crise pela falta de injeção de recursos governamentais.

Muitos dos que abriram mão dos planos, por não conseguir mais sustentar as mensalidades, têm recorrido aos serviços públicos, onerando ainda mais a capacidade do Sistema, que sofre com a falta de verbas. Em 2016, a Pec do Teto limitou os gastos com a saúde durante os próximos 20 anos. Melhor nem pensar nas consequências de duas décadas de míngua, numa área que só se desenvolve tecnologicamente e necessita de investimentos e recursos constantes.

Órgãos independentes, como o IDEC, Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor e o Tribunal de Contas da União, do próprio governo, apontam irregularidades, como distorções de entendimentos, abusividade e falta de transparência nas ações da ANS. A Agência parece trabalhar às avessas, favorecendo os donos das operadoras, e não para atender aos interesses da população.

Um relatório de auditoria do TCU, instaurada em 2014, com acordão 679 de 29/3/18, deixou clara a existência de problemas na inserção de dados sobre reajustes de planos coletivos, que são utilizados para o reajuste dos planos individuais no sistema da ANS. Além disso, o reajuste anual máximo autorizado por ela em relação aos planos de saúde individuais e familiares não está previsto em nenhum ato normativo e não se encontra disponível no seu site oficial, sendo considerada a média do setor não regulado dos planos coletivos, para imputar cálculos ao setor regulado dos individuais.

Diante das distorções, um juiz do Tribunal de Justiça de São Paulo deu parecer favorável, em 30 de maio deste ano, à AÇÃO CIVIL PÚBLICA (65), número 5010777-40.2018.4.03.6100 / 22a Vara Cível Federal de São Paulo, impetrada pelo IDEC, determinando que os aumentos das mensalidades acompanhem a variação salarial e o IPCA, Índice de Preços ao Consumidor.

Segundo estudo da Faculdade de Medicina da USP, conduzido pelo pesquisador e professor Mario Scheffer, só em São Paulo, são julgadas quase 120 ações (mais de 28% delas se referem a reajustes) contra as operadoras por dia, com 92,4% de decisões favoráveis ao consumidor. Isto representa um crescimento de 386% entre 2011 e o primeiro semestre de 2018.

Se a variação salarial tem sido ínfima, num país que quase não gera empregos, como pode o reajuste da mensalidade de um plano de saúde chegar à 90%?

Talvez possamos entender essa lógica absurda se observarmos o gráfico mundial de investimentos governamentais em saúde pública. Enquanto a Suécia e o Canadá investem 19% e 18,7%, respectivamente, do seu orçamento total, o Brasil investe 6,7%. (que representa só 7,7% do total de recursos do governo - índice equivalente ao de alguns países pobres da África). A discrepância mostra a pobreza de espírito de quem está no poder e como enriquecem os que lucram com a saúde ou doença alheia.

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*Renata Vilhena Silva é advogada do escritório Vilhena Silva Advogados.

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