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Sem medo de ter medo

A Inglaterra então já projetava exemplos de segurança pública com cidadania. Algo que a politicalha patrona da inveja e das gestões medíocres, e sabe-se hoje, pra lá de corruptas, não deixaram que isso acontecesse no Rio de Janeiro. Nem no Maranhão.

terça-feira, 8 de janeiro de 2019

Atualizado em 9 de outubro de 2019 18:12

Bristol, no sudeste da Inglaterra, é uma cidade histórica, atraente e não é de hoje, sobretudo por sua universidade.

 

Na área da medicina, por exemplo, há um complexo de hospitais atuantes em pesquisas e serviços em todas as especializações.

 

Uns poucos brasileiros que concluíram residência no Hospital das Clínicas, em São Paulo, foram para a universidade de Bristol como bolsistas por dois anos.

 

Um dos jovens médicos, chamado Euler, comprou um carro.

 

Ainda se iniciando no hábito de dirigir pelo lado direito, sim, o volante dos ingleses não fica no lado esquerdo como no Brasil e demais do mundo, um dia vendo à frente a faixa de pedestres pisou forte no freio quase alcançando-a.

 

Como se saísse do nada, um policial altão, forte, farda elegante, o aborda. Fale a verdade, foi logo avisando. O senhor não sabe que tem que guardar alguma distância da faixa de pedestres?

 

O nosso brasileiro, médico ortopedista, que se especializava em traumatologia, sabia muito bem do perigo que rondou aquela freada.

 

Não se intimidou, aliás, nem teve porque se intimidar. O tom do policial foi ameno. Gentil. Educado.

 

O doutor Euler então explicou que havia chegado do Brasil há pouco tempo com bolsa de estudos da Bristol University. Sabia do risco e da falta em que incorrera. Que passaria a manter maior distância das faixas de pedestres.

 

O policial gentilmente agradeceu dando-se por satisfeito com as explicações do médico motorista. Não lhe pedira documento algum. Apenas a verdade na palavra. Despediu-se com votos de boas-vindas e de feliz estada na Inglaterra.

 

Algum tempo depois, outro brasileiro, este chamado Caetano, cantou em versos na canção London, London, a sua surpreendente admiração com a gentileza do policial num domingo em que ele, apenas um exilado compositor brasileiro, seguia vagando, dando umas voltas a pé, sem direção.

 

Ele, o poeta, está solitário em Londres e Londres é amável assim - cruza as ruas sem medo, todo mundo deixa o caminho livre. Não conhece ninguém ali para lhe dizer olá. Enquanto seus olhos procuram discos voadores no céu, e as pessoas passam apressadas com tanta paz, um grupo aborda um policial e ele parece até muito satisfeito em poder atendê-las.

 

A Inglaterra então já projetava exemplos de segurança pública com cidadania. Algo que a politicalha patrona da inveja e das gestões medíocres, e sabe-se hoje, pra lá de corruptas, não deixaram que isso acontecesse no Rio de Janeiro. Nem no Maranhão.

 

Sim, muito, muito depois das ondas tsunamis de medo que foram se apossando e ainda se apossam das mentes pouco sadias no mundo, houve aquela melecada do policial na estação do metrô num subúrbio de Londres, que encagaçado de medo, achando que o jovem barbudo de mochila no ombro fosse um terrorista das arábias, abateu-o covardemente com um tiro de pistola.

 

E era um brasileiro chamado Jean Charles, cuja história já foi contada até no cinema.

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*Edson Vidigal é advogado, e foi presidente do STJ e do Conselho da Justiça Federal.

 

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