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Inconstitucionalidade do IBS quanto à ausência de possibilidade de concessão de benefícios fiscais

A ausência de possibilidade de concessão de benefícios fiscais no possível IBS, fruto da PEC 45/19, é inconstitucional, extremamente lesiva ao Pacto Federativo, à sociedade brasileira, ao desenvolvimento nacional, à redução das desigualdades regionais, à promoção de uma sociedade justa, à oferta de emprego e tantos outros fundamentos, objetivos fundamentais, princípios e regras da CF.

quarta-feira, 25 de setembro de 2019

Atualizado às 11:28

A CF logo no seu Título I "Princípios Fundamentais", especificamente no art. 3º determina ser um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil garantir o desenvolvimento nacional (inciso II) e reduzir as desigualdades sociais e regionais (inciso III). É de se saber que, em uma República Federativa, os objetivos acima elencados são intrinsecamente relacionados à proteção do Pacto Federativo, este também explicitamente protegido como cláusula pétrea através do art. 60, §4º, I da CF/88.

Neste sentido, podemos observar que qualquer ação estatal deverá ter como objetivos fundamentais o desenvolvimento nacional e a redução das desigualdades sociais, isto é, em sua finalidade intrínseca, como finalidade máxima, a concretização do estabelecido constitucionalmente como o desígnio da República Federativa.

Paralelamente ao acima relacionado, bem como com a intenção de promover os objetivos insculpidos no art. 3° da CF/88, há no arcabouço jurídico tributário a possibilidade de atribuição de função extrafiscal aos tributos, seja através da tributação (instituição e majoração de tributos), ou mesmo através da ausência da tributação (concessão de benefícios fiscais, remissão e isenção).

Verifica-se que a adoção da extrafiscalidade dos tributos detém o nítido caráter de estimular ou desestimular determinada conduta praticada pelo contribuinte, com a finalidade de atender determinado objetivo econômico-social indicado pela legislação constitucional ou infraconstitucional.

Isto posto, observa-se que o Estado faz o uso da extrafiscalidade dos tributos para diversas situações, cabendo aqui destacar a título de exemplo uma finalidade social e outra econômica. No primeiro caso, é expressamente autorizada pela Constituição Federal a extrafiscalidade do IPTU. Neste caso específico elencado pelo art. 182, §4°, incisos I, II e III, da CF/88, o Município resta autorizado a, nos casos de solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, promover três ações específicas com vias à promoção da adequada utilização do solo urbano, sendo elas sucessivamente: parcelamento do solo ou edificação compulsórios, IPTU progressivo no tempo e a desapropriação. Esse comando constitucional garante, de uma única vez, a executividade do objetivo fundamental da República "garantir o desenvolvimento nacional", o princípio da função social da propriedade (art. 5º, XXIII, CF/88), os direitos sociais (art. 6º, CF/88), dentre outros.t

No segundo caso, da utilização da finalidade extrafiscal do tributo com viés econômico, podemos citar a criação e manutenção da Zona Franca de Manaus (ZFM). Isto porque a criação da ZFM como área de livre comercio, exportação, importação e incentivos fiscais tem por objetivo fulcral o desenvolvimento social, econômico, bem como a geração de renda, empregos formais, atração de indústrias, além da povoação da região. É notório que no caso da ZFM a extrafiscalidade busca garantir os fundamentos da dignidade da pessoa humana, valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (art. 1º, III e IV, CF/88), bem como os objetivos de garantir o desenvolvimento nacional, redução das desigualdades sociais e regionais e promover o bem de todos (art. 3º, II, III e IV, CF/88).

Assim, em ambos os casos acima apresentados, vemos que o Estado se utiliza da prerrogativa da extrafiscalidade dos tributos para estimular ou desestimular determinada conduta, com a finalidade máxima de atender fundamentos do Estado Democrático de Direito, e/ou objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, e/ou direitos individuais e/ou sociais. É neste sentido que se apreende ser a extrafiscalidade mecanismo de fulcral importância para o atendimento dos mais diversos comandos constitucionais.

Diante do cenário acima exposto é inconcebível, inconstitucional, intolerável que qualquer legislação tenha o ímpeto de restringir a extrafiscalidade de determinados tributos que são utilizados para garantir, em última instância, a justiça social. Por mais ininteligível que possa parecer, a PEC 45/19, de autoria do deputado Federal Baleia Rossi, que tramita na Câmara dos Deputados, mais conhecida como umas das PECs de reforma tributária, através da inclusão do art. 152-A, §1°, IV, na CF/88, busca instituir o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), o qual não poderá, sob hipótese alguma, ser objeto de concessão de benefícios fiscais, senão vejamos:

Não será objeto de concessão de isenções, incentivos ou benefícios tributários ou financeiros, inclusive de redução de base de cálculo ou de crédito presumido ou outorgado, ou sob qualquer outra forma que resulte, direta ou indiretamente, em carga tributária menor que a decorrente da aplicação das alíquotas nominais.

Desta forma, pretende a PEC 45/19 extinguir qualquer forma de benefício fiscal, isenção, anistia, redução de base de cálculo, redução de alíquotas, concessão de parcelamentos com descontos nas penalidades aplicadas; tornando o ente instituidor completamente engessado, sem a possibilidade de atribuição de caráter extrafiscal para a execução dos comandos constitucionais amplamente expostos acima, bem como promovendo inimaginável restrição ao pleno exercício da competência tributária, uma vez que não poderá o ente livre dispor acerca dos aspectos quantitativos do tributo.

Reputa-se, portanto, a latente inconstitucionalidade IBS quanto à fulminação da livre competência tributária, do Pacto Federativo (cláusula pétrea), ausência de possibilidade de concessão de benefícios fiscais, ferindo também o princípio da capacidade contributiva, isonomia material, sob pena inclusive de tornar inócuos os comandos constitucionais.

Para além da inconstitucionalidade patente em razão da impossibilidade do pleno exercício da competência tributária, e da laceração direta e indireta de dispositivos constitucionais, o prejuízo social da impossibilidade total da concessão de benefícios fiscais é imensurável. Isto porque não haverá qualquer incentivo ao desenvolvimento regional (com a redução das desigualdades entre regiões), à redução da desigualdades sociais e, em última análise, até mesmo da construção de uma sociedade livre justa e solidária, em razão da inviabilidade de oportunidade de desenvolvimento para locais longínquos do país, distantes não apenas fisicamente dos grandes centros empregatícios e tecnológicos, mas equidistantes no que tange à ação efetiva do Poder Público enquanto agente promovente da cidadania e dignidade da pessoa humana.

Diante de todo o exposto, a ausência de possibilidade de concessão de benefícios fiscais no possível IBS, fruto da PEC 45/19, é inconstitucional, extremamente lesiva ao Pacto Federativo, à sociedade brasileira, ao desenvolvimento nacional, à redução das desigualdades regionais, à promoção de uma sociedade justa, à oferta de emprego e tantos outros fundamentos, objetivos fundamentais, princípios e regras da CF. De qualquer ângulo que se analise, a inconstitucionalidade é patente. 

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*Igor Bastos de Almeida Dias é advogado tributarista da MoselloLima Advocacia.

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