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Dano moral contra o INSS: Uma realidade mais do que necessária

Da ocorrência desse fenômeno jurídico, o alcance previdenciário de sua razão de ser, os efeitos pedagógicos e a utilidade instrumental para o cenário cada vez mais caótico de um sistema notoriamente falido

sexta-feira, 13 de março de 2020

Atualizado às 10:06

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Para muitos, certamente o título acima deve causar espanto, susto ou, por que não dizer, estranheza, notadamente pelo fato de que a reparação civil por danos morais em nosso sistema jurídico se vê associada aos relacionamentos do Direito Civil, essencialmente.

Ocorre que de vez em vez, via decisões judiciais de Tribunais Regionais Federais, uma outra vertente da reparação civil moral ganha voz e vez, no âmago dos relacionamentos previdenciários do regime geral, em outras palavras, àqueles em que o conhecido INSS faz a gestão de benefícios.

Pois bem, aqui as razões desse modesto ponto para reflexão, vale dizer, da ocorrência desse fenômeno jurídico, o alcance previdenciário de sua razão de ser, os efeitos pedagógicos e a utilidade instrumental para o cenário cada vez mais caótico de um sistema notoriamente falido1.

Infelizmente, não há o que comemorar, filas e filas, sistema estagnado, processos sem análise, alto índice de servidores aposentados, licenciados, inexistência de concursos para a atividade-fim e ainda a excessiva procura pelo circunstancial momento de reformas e reformas do sistema previdenciário normativo.

Em outras palavras, um caos previdenciário institucional.

Associa-se a tal fato, um pacote normativo sazonal, de exclusão, confuso e dogmático cada vez mais presente, como se a criação de regras rígidas de acesso ou tributação de benefícios fossem o rumo do futuro, a bola de cristal, a solução de todos os males em um país de excluídos.2

Wagner Balera, com a costumeira maestria, asseverou em recente artigo sobre a criação da surpreendente taxação do seguro-desemprego através da medida provisória 905/193, para quem: "Será a primeira contribuição social antissocial".4

E os problemas estão longe de serem resolvidos, ou ao menos, seguramente enfrentados, já que a solução proposta, por ora, unicamente foi a exibição de um plano estatal de convocação de militares da reserva, em explícita inconstitucionalidade pela atipicidade da atividade-fim, dentre outros fatores.5

Assim, longe de ter solução o crítico cenário previdenciário do INSS aos trabalhadores da iniciativa privada, vale dizer, a amplíssima maioria e os mais necessitados do abrigo previdenciário estatal.

Aqui, o ponto central dessa reflexão, em outra palavras, a viabilidade, utilidade e evidência da plena possibilidade de danos morais contra o INSS, em um cenário vigente mais do que necessário.

Também a tutela jurisdicional, representativa do direito fundamental de acessibilidade à jurisdição, pode e tem representado importante caminho de reparação, compensação e correção de rotas, se estendo à seara previdenciária, com expressa contribuição da jurisprudência e de outras fontes acadêmicas.

Situações diversas, como atraso na resposta, ausência de resposta, equívocos na interpretação, extravio de documentos, maus-tratos, inacessibilidade do sistema, dentre outros, justificam o manejo do emergente e evidente "dano moral previdenciário".

Recentemente, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região entendeu que a autarquia previdenciária deveria ser condenada pelo dano moral em virtude de uma suspensão indevida do benefício, deixando o beneficiário a mercê da sorte, desprovido de renda, doente, sem possibilidades de trabalho e com explícita necessidade alimentar.

Aqui, um breve comentário desse recente e amplamente divulgado julgado:

No mais, o relator, desembargador federal Daniel Paes Ribeiro, ao analisar a hipótese, explicou que nos autos foram anexados documentos que comprovam os fundamentos do autor e os prejuízos sofridos por ele diante da suspensão do benefício de natureza alimentar, e, desse modo, devem ser reparados os danos morais pleiteados...Em seguida, o Colegiado deu provimento à apelação do autor e afastou a prejudicial da prescrição, e, no exame, julgou procedente o pedido do requerente, condenando o INSS a reparar o dano moral causado em decorrência da indevida suspensão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço.6

Essa e outras decisões por todo o país têm espelhado um potente caminho de correção de rota, com vistas a compensação, reparação e a educação do sistema, a fim de que o peso da jurisdição possa sensibilizar a gestão para que a prestação do serviço ocorra na altura de seus destinatários, os reais idealizadores do próprio poder.

Assim, o Judiciário está expressando destacada importância social, a fim de que os interesses da classe trabalhadora filiada ao sistema, de forma compulsória ou não, tenham a respeitabilidade que se espera de seus interesses, de forma rápida, eficiente e justa.

Afinal, a busca por melhorias, ajustes, aperfeiçoamento e evolução do sistema previdenciário não pode estar dissociado do desejo de contemplação da justiça social a ser cada vez mais justa e igualitária.

Ivan Kertzman, registra neste sentido que:

Uma reforma previdenciária de boa qualidade técnica não deve partir da análise de quanto devemos economizar com as mudanças, mas sim do que devemos alterar para garantir uma previdência social mais justa e igualitária.7

Essa a meta, uma eficiente política previdenciária, sem distância do que a sociedade idealizou no horizonte firmado de outubro de 1988, cuja programação precisa ser perseguida, com possibilidade de ajustes e correção pelo dano moral previdenciário, o que tem ocorrido pelo Judiciário em tempos de extrema necessidade, até que se altere a triste realidade do presente dia-a-dia.

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1 Clique aqui

2 O que comemorar na desastrosa política previdenciária de um país de excluídos?

7 Estudos Aprofundados sobre a Reforma da Previdência/coordenadores Frederico Amado, Ivan Kertzman - Salvador: Editora JusPodivm, 2020, pg.21.

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*Sérgio Henrique Salvador é mestre em Direito (FDSM). Pós-Graduado pela EPD/SP e PUC/SP. Professor do Instituto Elpídio Donizetti (IED), UNIFENAS e UNISAL. Escritor pelas Editoras Conceito, Foco, LTr e Revista dos Tribunais. Conselheiro da OAB/MG (23ª Subseção). Membro da Rede Internacional de Excelência Jurídica.

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