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Onerosidade excessiva em tempo de coronavírus no Brasil e a frustração do propósito contratual no direito inglês

Apesar de alguns requisitos parecerem diminuir drasticamente a abrangência de aplicabilidade das normas examinadas, a doutrina e a jurisprudência vem flexibilizando alguns deles. Isso tem ocorrido, particularmente, com a extrema vantagem e a imprevisibilidade, permitindo-se, virtualmente, a equivalência da onerosidade excessiva do CC com a do CDC.

quarta-feira, 15 de abril de 2020

Atualizado às 14:08

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1. Introducao

Em razão da pandemia do coronavírus, passou-se a discutir as consequenciais jurídicas que ela acarretaria aos contratos. Neste artigo, pretende-se fazer análise de algumas normas que poderão ser invocadas judicialmente para a resolução ou a revisão contratual. Têm-se em vista, primordialmente, os contratos entre empresários, os quais se supõem paritários.

Inicia-se o exame pelos arts. 478 e 479 do Código Civil "(CC), que preveem o que ficou conhecida como Teoria da Onerosidade Excessiva ou Teoria da Imprevisão. Essa norma dispõe sobre a possibilidade de resolução e revisão contratual. O legislador exigiu, além de acontecimento imprevisível, a extrema vantagem ao credor.

A doutrina e a jurisprudência, contudo, vêm dando flexibilidade ao requisito da extrema vantagem, desconsiderando-se seu sentido e alcance. Dessa forma, o que teria âmbito de aplicação restrita acaba, nessa visão, ampliando-se.

Entretanto, os arts. 478 e 479 do CC permitem a resolução do contrato ou a sua revisão com aquiescência do credor. A revisão nos termos da norma a torna pouca atrativa.

Por conta disso, é provável, então, que o onerado venha a se valer do art. 317 do CC. Essa norma, apesar de permitir apenas a revisão, não prevê como requisito a aquiescência do credor - já que caberá ao juiz decidir pela redução equitativa -, tampouco prevê o requisito da extrema vantagem.

Em que pese a imprevisibilidade do acontecimento ser requisito expresso do art. 317 do CC, tem-se argumentado sua desnecessidade, com base na Teoria da Quebra da Base do Negócio, que estaria incorporada ao nosso sistema jurídico a partir das cláusulas gerais da boa-fé e da função social do contrato. Assim, bastaria, para a incidência da norma, a verificação do desequilíbrio contratual que onerasse excessivamente a parte.

Como corolário dessa teoria e da cláusula geral da função social do contrato, admite-se em nosso sistema a doutrina da frustração do fim do contrato, que tem inspiração inglesa. Busca-se, nesse ponto, comparar a abrangência do instituto na Inglaterra, inclusive no contexto do coronavírus.

Em seguida, breve comentário será feito a respeito do art. 393 do CC, que trata do caso fortuito e da força maior como causas de exclusão de responsabilidade da parte inadimplente por perdas e danos.

Conclui-se, ante as inúmeras flexibilizações dos requisitos exigidos em lei para a resolução e a revisão contratual, que a abrangência de aplicabilidade das normas examinadas se ampliou pela via interpretativa. Ainda que criticável, os operadores do direito devem considerar, na prática jurídica, o entendimento geralmente aceito. No direito inglês, observa-se que a frustração do fim ou propósito do contrato é restrita. É provável, todavia, que o instituto seja usado com maior flexibilidade no Brasil.

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*Lucas Faillace Castelo Branco é advogado. Sócio de Castelo e Dourado. Mestre em Direito pela King's College London. LLM em Direito Empresarial pela FGV-Rio. Especialista em Direito Tributario pelo IBET. Aluno Especial do Mestrado em Contabilidade da UFBA. Membro do Instituto dos Advogados da Bahia.  

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