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Princípio da solidariedade no CDC

O instituto da responsabilidade civil, no Direito do Consumidor, guarda singular semelhança com o acidente no trabalho, no Direito Laboral. A responsabilidade objetiva, face ao risco da atividade, é conseqüência natural da predominância dos interesses sociais sobre os individuais. De empreendedor o Estado passa a regulador da atividade econômica, assumindo o encargo de maior interventor, nos campos legislativo, administrativo e judicial. Justo que isto ocorra, porquanto a produção em massa concentrou nas unidades produtivas os benefícios inquestionáveis de um mercado capitalista sem risco, mas só com vantagens.

sexta-feira, 1 de dezembro de 2006

Atualizado em 30 de novembro de 2006 14:48


Princípio da solidariedade no CDC

Antonio Pessoa Cardoso*

O instituto da responsabilidade civil, no Direito do Consumidor, guarda singular semelhança com o acidente no trabalho, no Direito Laboral.

A responsabilidade objetiva, face ao risco da atividade, é conseqüência natural da predominância dos interesses sociais sobre os individuais. De empreendedor o Estado passa a regulador da atividade econômica, assumindo o encargo de maior interventor, nos campos legislativo, administrativo e judicial. Justo que isto ocorra, porquanto a produção em massa concentrou nas unidades produtivas os benefícios inquestionáveis de um mercado capitalista sem risco, mas só com vantagens. A justiça distributiva, originada do Direito do Consumidor, não impediu a manobra exercida pelo empresário sobre o cidadão, através da violação técnica, marketing, publicidade, etc., da manifestação livre da vontade do hipossuficiente. É mitigado o princípio da autonomia da vontade, fruto da sociedade moderna, massificada e mecanizada que aponta novos caminhos para solucionar as conseqüências das atividades humanas.

O Estado Social, em contraposição ao Estado Liberal, intervém na atividade negocial para estabelecer a função social do contrato; assim é que, a Constituição não permite maiores prejuízos à sociedade em função do contrato e para isto assegura "ordem social e harmônica", art. 170; já o Código Civil (clique aqui) submete a liberdade de contratar aos limites da função social do contrato, art. 421.

O exercício de qualquer atividade em proveito próprio implica em riscos assumidos por muitos, mas danosos para poucos. Registre-se que o prejuízo resultante é repartido por toda a sociedade, enquanto os danos são concentrados. Inseriu-se então no Código Civil a responsabilidade sem culpa, (artigos 186, 927, parágrafo único, e 928 seguintes) prática antecipada pela jurisprudência, consagrada pela Constituição de 1988, artigos 5º, 21 e 37, endossada pelo CDC, Lei 9.078/90, (artigos 12 a 14 - clique aqui). Neste caso, indispensável somente a prova do nexo causal entre a conduta do agente e o prejuízo provocado ao consumidor. O risco agora se alicerça na composição do dano sem maiores indagações sobre a culpa ou dolo, necessária no caso de responsabilidade subjetiva que reclama longa e complicada prova dos fatos. Tudo isto é a simples adaptação da lei às novas realidades emergentes.

Mauro Cappeletti, célebre jurista italiano, esclarece que mais de 90% dos contratos celebrados não asseguram a real vontade das partes, face à popularização do contrato de adesão.

Atrelado ao risco da atividade situa-se o princípio da solidariedade, impeditivo da denunciação à lide e causador de maior facilidade de acesso à Justiça, direito natural de todo cidadão. É concedido ao consumidor, que sofreu algum dano, o direito de chamar, em juízo, o empregador, a empresa de transporte, o banco, a agência de turismo, enfim o fornecedor de serviços e produtos, sempre que houver danos originados da atividade empresarial. Desnecessária demonstração de culpa, pois sua apuração dar-se-á através de ação regressiva, vez que o princípio do risco da atividade juntamente com a solidariedade implicam na responsabilidade indivisível, art. 88 CDC. Justifica-se a ótica solidarista, porquanto, de outra forma, deixaria o cidadão confuso sobre quem deve ser chamado para responder pelo direito violado.

Arruda Alvim comenta que "cada responsável solidário responde pela totalidade dos danos, estando obrigado cada um individualmente a responder pela completa indenização". Induvidosamente, a lei quer dizer que a vítima poderá acionar um ou alguns dos agentes; evidente o interesse legal em facilitar a defesa dos direitos do mais fraco e claro que a ação de um, o culpado direto pelo dano, tem liame com o outro, culpado indireto pelo evento.

O princípio da solidariedade encontra-se estatuído, literal e genericamente, no parágrafo único, artigo 7º e parágrafo 2º, artigo 25 CDC; a lei consumerista especifica a solidariedade entre os fornecedores por defeito do serviço, art. 14; imputa individualmente a responsabilidade objetiva do fabricante, do construtor, do importador e do comerciante, pelo defeito no produto ou existência de vício, arts. 12 e 13. A solidariedade entre o fabricante e o comerciante está prevista no art. 18 CDC, no caso de vício do produto. Enfim, o Código Civil consagra o instituto no artigo 942.

Há responsabilidade solidária entre outros nos seguintes momentos:

Face ao ato do preposto; entende-se, neste caso, que o empregador prolonga sua atividade através do empregado.

O patrão assume responsabilidade por atos praticados pelo empregado que não dispõe de meios para indenizar pelos eventuais danos causados. É o caso, por exemplo, do patrão do motorista que causa lesão à terceiro, mesmo que, no acidente, esteja envolvida empresa de transporte coletivo, por exemplo.

Quando entre os agentes dos contratos de consórcio estejam a administradora e a empresa agenciadora.

No caso de furto de veículo estacionado em área de lojas, shoppings, etc. Neste sentido a súmula 230 do STJ.

Os bancos, apesar de não serem executores, respondem pela inclusão indevida do nome do consumidor no SPC.

O hospital é responsável por eventuais erros cometidos pelos médicos que lhe prestam serviços.

O mau serviço do hotel, incluído no pacote turístico, é assumido pela empresa de turismo.

Responde solidariamente o fabricante, o comerciante, o revendedor, o prestador do serviço, pelo vício na qualidade do produto.

Enfim, o Direito do Consumidor deve ser entendido como facilitador na distribuição das riquezas nacionais em nítido comportamento de solidariedade social.

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*Desembargador do TJ/BA






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