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Encerramento da empresa e prejuízo fiscal: Compensação integral?

Supremo confirmou que a compensação integral de prejuízos fiscais deve ser limitada a 30% do lucro líquido ajustado em cada período de apuração

sexta-feira, 14 de agosto de 2020

Atualizado às 12:02

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Nos termos da legislação em vigor, a compensação de prejuízos fiscais e de bases negativas da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) é limitada ao percentual de 30% (trinta por cento) do lucro líquido ajustado em cada período de apuração. Essa regra não impõe qualquer condição de manutenção de lucratividade em anos anteriores.

A constitucionalidade da limitação de 30% foi confirmada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no ano de 2019, com Repercussão Geral (RE 591.340), para as empresas ativas e em plena atividade.

Dada a abrangência desse entendimento que inviabiliza, a todos os contribuintes, a compensação integral de prejuízos fiscais, ganha relevância o projeto de lei (PL) 3.140/20, de autoria do deputado Federal Luis Miranda, proposto no mês retrasado, com o objetivo de socorrer as empresas afetadas em 2020 pela covid-19.

Como expressamente dito, em sua justificativa, o PL objetiva gerar capital de giro às Sociedades e resguardar a sua sobrevivência, evitando demissões.

Nos termos em que é proposto, o texto permite a compensação integral dos prejuízos apurados no ano de 2020, de forma retroativa e tomando por base, objetivamente, os resultados fiscais apurados nos exercícios de 2018 e 2019, mediante a retificação das respectivas obrigações acessórias e a reabertura da apuração desse períodos, demandando esforço do Fisco Federal para validação do procedimento.

Na hipótese de recomposição das bases fiscais (mediante a compensação dos prejuízos fiscais) é esperado a apuração de indébitos, passíveis de restituição em espécie e cuja liquidação é prevista para um prazo de até 60 dias, contados da retificação da escrituração fiscal, atingindo, inclusive, empresas optantes pelo Lucro Presumido, através da autorizada mudança de opção do regime de apuração.

Com relação à repercussão geral do tema no tocante à trava de 30%, o STF esclareceu textualmente que não estava a julgar a hipótese de extinção da pessoa jurídica, em qualquer uma de suas modalidades (incorporação, fusão ou cisão).

Sobre este caso específico, vale registrar que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou o tema de forma desfavorável aos contribuintes (Resp 180.592, Diário Oficial de 5/8/20), em apertada maioria verificada em uma de suas turmas de julgamento (3x2), o que permite concluir que a matéria ainda não está pacificada no âmbito do próprio STJ e que, independentemente de sua posição final, possivelmente será objeto de apreciação final pelo Supremo Tribunal Federal.

No tocante ao julgamento, o voto vencedor apoiou-se na premissa adotada pelo STF de que a compensação de prejuízo fiscal se traduz em benefício fiscal, o qual deve ser interpretado restritivamente, com base no Código Tributário Nacional (CTN), podendo ser disciplinado pelo legislador tal qual feito pela lei 9.065/95, ao dispor sobre a trava de 30%. Para esta corrente, não havendo previsão em contrário na lei para a hipótese específica de encerramento da pessoa jurídica, não poderia o julgador deferir a pretendida compensação integral.

Em sentido contrário votou o relator, ministro Napoleão Nunes Maia Filho, em prol da segurança jurídica, já que, no caso julgado, a empresa seguiu entendimento prevalente à época no Conselho de Recursos Fiscais. Dentre outras razões, demonstrou a violação ao princípio da legalidade, já que, ao final, estar-se-ia tributando algo não representativo de acréscimo patrimonial ou renda, trazendo vulneração ao princípio da capacidade contributiva.

Como dito pelo voto vencido, não se trata de interpretação restritiva sabidamente vedada pelo CTN, mas de interpretação sistemática, para hipótese reconhecidamente específica, para a qual não há previsão legal.

Afinal, para a quantificação de algum direito ele previamente precisa existir; e se existe o direito à compensação plena do prejuízo fiscal, ainda que diluída no tempo, sob o pressuposto da continuação da atividade da empresa, uma vez desfeita essa premissa, com a sua dissolução, o direito legal à compensação plena deve ser resguardado, somente podendo ser exercitado, no caso particular, de forma integral, em razão da futura inexistência da pessoa jurídica e da impossibilidade de eventual sucessora efetivar dito direito.

Deste modo, para os casos de empresas ativas, a compensação de prejuízos fiscais deve respeitar a trava de 30%, conforme disposto na lei 9.095/95, declarada constitucional pelo STF, salvo previsão legal diversa, a exemplo da pretensão veiculada no PL 3.140/20.

Já para a situação peculiar de encerramento da pessoa jurídica, a referida limitação pende de deliberação final do STJ e de apreciação específica pelo STF, parecendo-nos perfeitamente possível sem qualquer trava, à luz da Constituição Federal e do Código Tributário Nacional, respeitado qualquer interpretação ou posicionamento divergente.

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t*Samir Antônio Dahi é advogado tributário do Gaia Silva Gaede Advogados. Pós-graduado em Direito Tributário, Direito Civil, Processual Civil e Empresarial.

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